Breve histórico no contexto arquitetônico
A origem dos jardins verticais ou das fachadas cobertas de plantas não pode ser datada de forma precisa. Pode-se supor que eles apareceram quando as pessoas começaram a se estabelecer em habitações permanentes. No entanto, as espécies trepadeiras provavelmente não eram planejadas pelos moradores e se desenvolviam de forma espontânea, ao encontrar nas edificações um suporte. É possível que tais espécies vegetais tenham sido consideradas uma praga e muitas pessoas tenham tentado se livrar delas (1).
A forma mais primitiva de jardim vertical planejado pelo homem, que se tem notícia, data do século 3 a. C. na região do Mediterrâneo, com o cultivo de videiras em treliças apoiadas nas paredes (2). Na Idade Média, além das videiras, o uso de treliças com rosas nos jardins das mansões e castelos era muito valorizado, como mostra a figura abaixo, uma ilustração de 1465 (3).
Desde a introdução da videira na Europa Central pelos romanos durante o primeiro milênio depois de Cristo, o amadurecimento das uvas na época certa para a produção de um bom vinho foi problema constante, pois nem todas as videiras recebiam calor do sol suficiente. Aos poucos notou-se que, ao cultivá-las ao longo de muros de pedra ou alvenarias, as uvas amadureciam mais rapidamente e adquiriam um sabor mais adocicado se comparado aos outros locais de plantio, produzindo, inclusive, um vinho de melhor qualidade.
No início do século 20, como afirma Köhler (4), essa longa tradição do uso de revestimento vegetal em fachadas manteve-se presente em alguns países da Europa. Em cidades como Berlim e Munique, era comum que proprietários de edificações de aluguel utilizassem este revestimento em substituição aos acabamentos externos das alvenarias. Também era tradicional na Alemanha o plantio de vegetação em fachadas de moinhos, servindo como uma camada de isolamento adicional a fim de evitar o excessivo aquecimento do maquinário no interior da edificação.
Já o uso dos jardins verticais como elemento funcional e de composição arquitetônica surgiu com o movimento Art Noveau, no início do século 20, novamente nos países de língua alemã. Nesta época, o uso de pérgulas e outras estruturas semelhantes para apoio de plantas trepadeiras já era comum em jardins e parques de todo o mundo, mas foi somente na Alemanha, e de certa forma na França, que as fachadas verdes foram efetivamente incorporadas nas edificações (5). Ainda, outro movimento que incentivou seu uso como componente arquitetônico iniciou em 1920 na Inglaterra e Estados Unidos. Chamado cidade-jardim, visava promover a integração entre a casa e o jardim, com o uso de plantas trepadeiras autoaderentes nas paredes, ou apoiadas em pérgulas e treliças (6).
A partir de então, com o fortalecimento do movimento moderno, a integração da vegetação com a arquitetura aconteceu especialmente com o conceito de teto-jardim. O uso das trepadeiras aderentes em fachadas decaiu, pois a necessidade de podas e demais cuidados regulares desestimulavam seu uso (7).
No entanto, nesta mesma época no Brasil, o paisagista Roberto Burle Marx seria o primeiro a colocar em prática a técnica do jardim vertical, inspirando-se em espécies nativas que crescem no meio das rochas ou em caules de árvores, como as orquídeas, bromélias e epífitos. Segundo Leenhardt (8), “Vários foram os estratagemas inventados por Burle Marx para forçar o olho a levar em conta a verticalidade. Quando necessário, não hesitará em construir estruturas metálicas nas quais pendurará cascatas de bromélias”. Em sua própria casa, no Sítio Burle Marx, o artista usa este artifício para criar verdadeiras esculturas verdes em meio ao jardim predominantemente horizontal. Em 1988, na cidade de São Paulo, projetou o jardim do Banco Safra, combinando canteiros em diferentes níveis, aproveitando os muros divisórios do terreno e inserindo colunas verticais com plantas de várias espécies, incluindo as epífitas. Com estas intervenções, Burle Marx abriu caminho para o uso dos jardins verticais em contextos urbanos (9).
A partir dos anos 70, juntamente com os movimentos em defesa da ecologia e do meio ambiente, na Alemanha e em outros países da Europa, o uso da vegetação em coberturas e fachadas foi gradativamente retomada, ainda com grandes desafios técnicos a serem superados. Foi reconhecido que as fachadas verdes eram relativamente simples de se construir e, por isso, desenvolveu-se um programa de incentivo ao seu uso em Berlim (10). Durante o período de duração do programa, entre os anos de 1983 e 1997, cerca de 245 mil metros quadrados de fachadas verdes foram instaladas (11).
Patrick Blanc, especialista francês em botânica, destaca-se no paisagismo atual por suas criações de jardins verticais em edificações, revolucionando a integração entre arquitetura e paisagem. Em 2001, Patrick Blanc projetou seu primeiro jardim vertical, no contexto do projeto de interiores do Hotel Pershing Hall, em Paris. Em 2004, o arquiteto Jean Nouveal solicita a criação de um jardim vertical para o Museu Quai Branly, em Paris. A partir de então, a repercussão de suas criações se acentuou e hoje são encontradas em diversos países do mundo.
Projetos que utilizam jardineiras perimetrais ou terraços em vários pavimentos da edificação, com plantio de arbustos, árvores de pequeno porte ou vegetação pendente, também podem ser considerados uma forma de jardim vertical. Esta técnica também é uma tendência da arquitetura contemporânea, e recentemente ganhou destaque com o “Edifício Bosque Vertical”, construído em Milão e vencedor do International Highrise Award de 2014 – importante prêmio da arquitetura dedicada aos arranha-céus.
Já as cortinas verdes caracterizam-se pelo plantio e desenvolvimento de uma vegetação trepadeira, com auxílio de suportes, posicionada em frente e afastada das superfícies verticais da edificação, sejam elas fachadas opacas ou transparentes. Pode ser considerada um tipo específico de jardim vertical, que tem como particularidade sua posição estratégica “descolada” das fachadas, sendo que o aspecto funcional mais relevante da utilização das cortinas verdes está associado à sua capacidade de proporcionar sombra, atuando como dispositivo de controle solar em arquitetura.
O arquiteto chileno Enrique Browne é um dos precursores nesta técnica, projetando e executando edificações com fachadas envidraçadas protegidas do sol por cortinas verdes, ainda na década de 1990. Desde então, a técnica das cortinas verdes vem sendo explorada por arquitetos em muitos países, destacando-se como elemento contemporâneo, integrado ao paradigma de uma arquitetura mais sustentável, uma vez que cumpre uma importante função para o edifício e também proporciona marcante efeito visual.
O interesse do arquiteto pelo uso da vegetação evidencia-se desde o início de sua carreira, quando em seus primeiros projetos utilizava pérgolas com videiras e outras espécies para sombrear os espaços de transição entre as edificações ou entre os ambientes internos e externos. A partir da constatação que estes espaços proporcionavam grande conforto climático nas estações quentes, Enrique Browne levantou a hipótese de aplicar a vegetação para sombrear não somente superfícies horizontais, mas também fachadas verticais que sofrem intensa ação do sol, como é o caso da orientação solar Oeste. As “parrones” foram posicionadas de forma vertical, afastadas em frente às fachadas, proporcionando sombreamento também quando a altura solar é menor. Ainda, estudou a aplicação de espécies arbóreas em jardineiras, outra alternativa para reduzir a incidência solar nos espaços internos (12).
Assim, a introdução do jardim vertical nos espaços abertos e na arquitetura foi influenciada pela própria verticalidade da planta e da paisagem do entorno. O uso de suportes e estruturas artificiais como colunas, pérgolas ou grelhas para o desenvolvimento da vegetação, tornaram-se frequentes nos jardins atuais.
Atualmente, o uso da vegetação integrada com a fachada da edificação é considerada uma técnica coerente com os princípios de sustentabilidade e de eficiência energética, sendo que existe cada vez mais incentivo e movimentos em nível internacional que tratam deste assunto. Conforme avalia Falcón (13), o paisagismo vertical vem ganhando destaque, como solução estética e de qualificação ambiental, representando uma forma inovadora de aumentar exponencialmente a biomassa vegetal de uma cidade.
Grandes centros urbanos, tais como Londres na Inglaterra, Seattle nos Estados Unidos e Toronto no Canadá, implantaram nos últimos anos políticas de incentivo ao uso de telhados verdes, jardins verticais e demais aplicações da vegetação. Da mesma forma, campanhas nacionais no Japão e em Singapura incentivam pesquisas e aplicações dos jardins verticais como forma de redução no consumo energético para climatização (14).
Impacto ambiental da vegetação no microclima urbano
Nos centros urbanos, com grande concentração de edificações e superfícies pavimentadas, ocorre o fenômeno denominado “ilha de calor”, no qual a temperatura do ar é mais alta do que na paisagem natural circundante. Isto é agravado, entre outros fatores, pela pequena quantidade de vegetação e pela poluição do ar nas cidades e ocorre porque as superfícies pavimentadas absorvem, retém e refletem mais energia solar do que superfícies vegetadas. Esta elevação da temperatura em torno das edificações afeta o conforto térmico e, consequentemente, aumenta a necessidade de energia para o condicionamento artificial dos ambientes internos.
As contribuições positivas do uso da vegetação integrada ao ambiente construído já são de amplo conhecimento e discutidas por diversos autores. Para Mascaró e Mascaró (15), “a vegetação atua sobre os elementos climáticos em microclimas urbanos, contribuindo para o controle da radiação solar, temperatura e umidade do ar, ação dos ventos e da chuva e para amenizar a poluição do ar”. Além disso, a vegetação absorve gás carbônico para efetuar o processo de fotossíntese, liberando oxigênio e auxiliando na purificação do ar. Isto é um fator de grande importância para diminuir o “efeito estufa” nas cidades. Este, por sua vez, ocorre quando a radiação de onda longa, o calor que é reemitido pelos materiais de construção, fica preso na atmosfera poluída urbana (16). Johnston e Newton (17) complementam que a folhagem também contribui na medida em que possui capacidade de capturar partículas em suspensão, como poeira ou gases poluentes.
Porém, um dos efeitos mais evidentes do uso da vegetação está na redução da temperatura do ar através do processo de evapotranspiração, também chamado resfriamento evaporativo: a energia do sol é absorvida pela planta, resultando na perda de calor na atmosfera e na umidificação do ambiente. Além disso, o sombreamento causado pela vegetação diminui as temperaturas superficiais dos pavimentos e fachadas das edificações, uma vez que intercepta grande parte da radiação solar incidente (18).
Um espaço gramado pode absorver maior quantidade de radiação solar e, por sua vez, irradiar uma quantidade menor de calor que qualquer outra superfície construída, uma vez que grande parte da energia absorvida pelas folhas é utilizada para seu processo metabólico, enquanto em outros materiais toda a energia absorvida é transformada em calor (19).
Rivero (20) acrescenta que as folhas têm comportamento seletivo frente à radiação solar recebida, ou seja, absorvem, refletem e transmitem quantidades diferentes dependendo do comprimento de onda. Quase a totalidade do que absorvem, por exemplo, fica na faixa do espectro visível, necessário para as funções vitais da planta. Desta forma, apesar da quantidade de energia absorvida, a temperatura superficial da folha não é elevada, mantendo-se sempre abaixo da temperatura dos corpos inertes vizinhos.
Por outro lado, a densidade foliar da vegetação e, por conseguinte, sua capacidade de sombreamento, são também as variáveis de maior correlação com a iluminância natural sob ou através dela. Segundo Mascaró e Mascaró (21), a transmitância de luz natural decresce com o aumento da densidade foliar, sendo mínima junto a superfícies opacas como troncos e ramos e máxima sob vazios entre as folias. Assim, devem-se comparar as vantagens oferecidas pelo sombreamento da vegetação, em relação à redução de consumo com climatização, e sua repercussão na necessidade de iluminação artificial dos espaços da edificação durante o dia.
A presença da vegetação, em uma proporção compatível com as áreas construídas, é, portanto, uma importante estratégia para manutenção da qualidade ambiental das cidades, atuando como termorregulador microclimático, uma vez que ameniza os extremos de temperatura e promove a umidificação do ambiente. Na escala da edificação, conforme avalia Givoni (22) pode representar um modificador da ação dos ventos, favorecendo seu acesso ou resguardando a edificação, dependendo da situação climática de verão ou inverno. Conjuntamente, a exposição ao sol também pode ser alterada, beneficiando a condição de conforto interno e demandando menor consumo de energia para aquecimento no inverno e, principalmente, resfriamento no verão.
Particularidades dos jardins verticais
Os mesmos fenômenos e benefícios já explicitados ocorrem quando utilizamos a vegetação nas superfícies verticais, seja ela autoaderente ou trepadeira com necessidade de suporte. Em uma escala urbana, Peck et al (23) ressaltam que o efeito dos jardins verticais pode ser superior ao obtido com telhados verdes, principalmente no caso de edifícios com vários pavimentos. Isso porque a área de superfície vertical é geralmente superior e abrange todos os pavimentos e não somente a cobertura.
Já na escala da edificação, os jardins verticais podem contribuir de forma significativa para o conforto térmico e, consequentemente, para a redução no consumo de energia para climatização das edificações. Köhler (24) comenta que a redução na temperatura interna das edificações está relacionada tanto à área revestida por vegetação, quanto à espessura da camada vegetal.
Os diferentes tipos de jardim vertical atuam na melhoria do desempenho térmico das edificações pela combinação de diversos fatores. As fachadas verdes, com espécies trepadeiras auto aderentes às paredes, por exemplo, agem como um revestimento isolante, mantendo uma camada de ar permanente entre a folhagem e a alvenaria. Cria-se, portanto, uma pele envolvendo o edifício, capaz de reduzir a energia necessária, tanto para aquecer, como para resfriar os ambientes internos (25).
Os mesmos autores (26) sugerem que, para regiões climáticas nas quais o inverno é uma estação marcada por temperaturas baixas, é preferível se utilizar uma trepadeira caducifólia na fachada com maior incidência de raios solares, e uma espécie perene nas fachadas sem incidência. Assim, se permite um maior ganho térmico por meio da fachada ensolarada e se evita a perda de calor nas demais. Espécies perenes, além de criarem uma camada isolante de ar, também protegem a edificação do vento frio de inverno. Já as espécies caducifólias, permitem a passagem dos raios solares no inverno e barram parcialmente a ação do vento por meio de seus galhos.
Sobre as espécies decíduas, Cantuária (27) comenta sobre a propriedade de adaptação às variações climáticas a curto e longo prazo, já que, de acordo com o ângulo de incidência dos raios solares e a intensidade da temperatura da primavera, as folhas são reorganizadas, inclinadas ou até mesmo tem seu brotamento antecipado. Dessa forma, a sombra adequada à edificação é fornecida também no momento adequado.
Johnston e Newton (28) acrescentam que, ao contrário da crença popular, fachadas cobertas com vegetação são menos úmidas, outro fator que reduz a perda de calor por condutividade. Isto porque as folhas evitam a penetração de excesso de água até a parede, que permanece seca.
Wong et al (29) realizou um estudo em Cingapura para avaliar a influência térmica na edificação e entorno de oito diferentes sistemas de jardim vertical. De um modo geral, todos os sistemas apresentaram temperatura superficial menor que a parede sem vegetação utilizada como parâmetro de comparação. Os autores destacam que, além do benefício térmico, a menor flutuação de temperatura prolonga a vida útil da estrutura e diminui custos de manutenção. Já o efeito sobre a temperatura do ambiente foi percebido em menores proporções, considerando que a área efetivamente coberta pelos sistemas experimentais era pequena. Uma vez que grandes áreas verticais da cidade recebam a vegetação, o efeito poderá ser promissor.
Sobre os sistemas de jardim vertical intensivos, que utilizam módulos ou painéis especiais, alguns autores ressaltam que os benefícios para a regulagem térmica da edificação não são significativos, se comparados aos altos custos de implantação e manutenção. Garrido (30) comenta que a estrutura conceitual de um jardim vertical do tipo intensivo, ou parede viva, se assemelha a uma fachada ventilada, uma vez que a forma de fixação dos módulos gera uma camada de ar entre a parede. Por este motivo, suas vantagens são restritas ao verão e em locais de clima muito quente. O mesmo autor ressalta que, em casos muito específicos de locais com clima seco, podem-se obter benefícios com a umidificação do ar e, por conseguinte, com a diminuição da temperatura do entorno.
Desta forma, a aparente sustentabilidade no uso desses sistemas é contraditória, na medida em que seu custo-benefício para a edificação é pequeno. O aspecto estético, neste caso, supera as vantagens ambientais. No entanto, é consenso que qualquer forma de jardim vertical representa um modo de aumentar a oxigenação do ar do entorno e, portanto o bem estar humano.
Por outro lado, as cortinas verdes, com espécies trepadeiras que necessitam de suporte e, por isso, podem ser posicionadas com certo afastamento das paredes ou áreas envidraçadas, representam uma importante estratégia de sombreamento da edificação. O bloqueio da radiação solar direta irá reduzir a carga térmica da edificação no verão e possibilitar menores gastos com climatização. Além disso, a evaporação e transpiração das plantas realizam naturalmente a refrigeração do ar, antes que este penetre no interior da edificação. Ainda, dependendo da forma de instalação, promove a ventilação pelo “efeito chaminé”, ou seja, o ar com temperatura mais amena entra pela parte inferior da cortina verde e o ar quente é expelido pela parte superior (31).
Conforme comentam Hopkins e Goodwin (32), a quantidade de sombreamento a ser fornecido pode ser manipulada, dependendo das espécies selecionadas, do sistema utilizado para fixação e apoio da planta e da altura definida como área a ser coberta pela vegetação. As densidades podem ser pensadas desde uma camada muito leve com menos de 10% de cobertura, até um fechamento quase total, de 80% ou mais.
Nesta mesma linha de pensamento, um fator importante é planejar a utilização de algumas espécies caducifólias, especialmente em regiões de clima composto, para que no inverno a densidade da cortina verde seja menor, permitindo que o sol penetre no interior da edificação e aqueça os ambientes. No verão, ao contrário, a presença da folhagem será maior, evitando o superaquecimento do prédio e reduzindo gastos com a utilização de sistemas de ar-condicionado.
Outra contribuição para a estação fria está relacionada ao efeito do vento, uma vez que a trepadeira pode atuar como uma barreira, diminuindo sua ação sobre a fachada do edifício. Isto também pode significar uma redução no consumo energético para aquecimento no inverno (33) (34).
Por outro lado, conforme afirma De La Torre (35), quando se considera o uso da vegetação como um modificador do efeito do vento sobre edifícios, deve-se ter cuidado para não obstruir a ventilação no verão e não favorecer a circulação excessiva de ar no inverno. Ou seja, deve-se estar atento à escolha correta das espécies, para a densidade de sua folhagem, sua disposição e manutenção periódica. Desta forma, percebe-se que, no inverno, a cortina verde pode favorecer o conforto térmico e a redução no consumo por dois caminhos: com espécies caducifólias pela maior penetração dos raios solares; ou com espécies perenes pelo maior isolamento térmico e ação como barreira contra os ventos frios.
Kwok e Grondzik (36) complementam a atuação das cortinas verdes com uma constatação importante: a de que o uso da vegetação pode ser mais eficiente que o sombreamento realizado por elementos de proteção solar fixos, tendo em vista que os ângulos solares nem sempre estão correlacionados com a temperatura do ar e, por conseguinte, com a necessidade de refrigeração ou calefação.
Por exemplo: no hemisfério sul, os ângulos solares do equinócio de primavera (21 de setembro) são idênticos aos ângulos solares do equinócio de outono (21 de março). Contudo, no hemisfério sul, costuma ser muito mais quente no fim de março do que no fim de setembro, o que exige mais sombreamento em março que em setembro. As plantas decíduas reagem mais à temperatura que à posição solar. Suas folhas talvez não estejam presentes no início de setembro, permitindo que o sol aqueça a edificação, mas ainda estarão nas espécies no início de março, fazendo sombra (37).
Além disso, enquanto os materiais usualmente utilizados em proteções solares, como plásticos ou metais, absorvem mais calor aquecendo o ar circundante, a vegetação, ao contrário, resfria o ar pelo processo de evapotranspiração. Isto é mais uma evidência das vantagens no uso da vegetação como elemento de controle solar em edificações.
Todos estes estudos evidenciam que os aspectos positivos, os benefícios do uso da vegetação superam os possíveis pontos negativos, embora estes possam ser decisivos no momento do planejamento da edificação. Certamente ainda existe uma grande hesitação na área da arquitetura e construção civil em implementar mais sistemas verticais com vegetação. Isto se deve, entre outros aspectos, aos custos inicias envolvidos, à necessidade de conhecimento técnico adequado, de manutenção extra, possibilidade de gerar patologias ou atrair fauna indesejada.
Van Bohemen, Fraaij e Ottele (38) comentam que existe uma crença generalizada de que as plantas causam deterioração nos edifícios, que danificam o revestimento e suas raízes podem comprometer o sistema estrutural. Os mesmos autores sugerem, no entanto, que esses problemas são tratados de forma muito exagerada, salvo em situações de escolha inadequada do tipo de vegetação ou quando já existem patologias que são aceleradas pelo crescimento das plantas. É o caso da existência de rachaduras que acabam servindo de local para a vegetação se fixar ou crescer. Na maioria dos casos, o oposto é verdadeiro, a cobertura vegetal serve como proteção para os componentes da parede, prolongando sua vida útil.
Em uma análise financeira, desta forma, deve-se considerar no cálculo do custo/benefício outros aspectos que direta ou indiretamente afetam o ciclo de vida em longo prazo da edificação, como por exemplo, a possibilidade de redução no consumo de energia para climatização dos ambientes.
Ainda, considerando a diminuição de disponibilidade de luz natural para os espaços quando a camada de vegetação for muito densa, devem-se ponderar os ganhos na redução de consumo com climatização, com o aumento da necessidade de uso da iluminação artificial. Este balanço energético vai depender de variáveis relacionadas à localização e uso da edificação, bem como decisões sobre as espécies e suportes adotados. A vegetação pode, desta forma, ser “manipulada” para oferecer proteção mais intensiva contra a ação do sol ou, por outro lado, permitir maior passagem de luz natural.
Assim, obviamente diversas recomendações devem ser observadas para o sucesso na implementação de sistemas verticais com vegetação, sendo que Sheweka e Mohamed (39) recentemente resumiram alguns:
- A vegetação a ser introduzida na fachada deve ser cuidadosamente escolhida, considerando sua estrutura natural, adaptabilidade climática e também ao ambiente árduo da área urbana.
- A vegetação deve ser localizada de forma a receber quantidade necessária de sol, a maior parte do tempo possível.
- Para a manutenção das plantas introduzidas no plano vertical, deve ser previsto que elas necessitam de quantidade de água e nutrientes suficientes e também de cortes regulares para evitar riscos ou danos.
Considerações finais
Além do grande potencial ambiental e de regulação térmica, como foi visto, o uso da vegetação também influencia no bem-estar social e psicológico do homem, uma vez que o contato com a natureza pode ser um agente restaurador, revigorante para enfrentar o cotidiano intenso das cidades.
Givoni (40) explica que, nas áreas urbanas, a utilização da vegetação tem um efeito positivo no sentido estético e psicológico. O efeito estético, pelas propriedades ornamentais de cada espécie vegetativa, pela cor, textura, forma, altura, flores que modificam os ambientes visualmente, tornando espaços agradáveis dentro das zonas urbanas. No estado psicológico, traz ao usuário a sensação de bem estar, melhora o humor, melhora a relação social em praças, bosques, parques e onde há equipamentos de lazer e esporte. Enfim, a presença de áreas verdes nos centros urbanos é extremamente importante e positiva.
Recentemente, algumas pesquisas de opinião foram promovidas para melhor entender os fenômenos relacionados com o contato com a vegetação no comportamento dos humanos. White e Gatersleben (41), após observarem o crescente incentivo ao uso de coberturas e paredes verdes no Reino Unido, realizaram entrevistas online com o uso de fotografias de edificações com esses sistemas, em diferentes combinações. O objetivo foi avaliar o impacto estético e o nível de restauração, de bem-estar percebido pelos respondentes (se houvesse), quando se utilizam telhados ou fachadas verdes em edificações. Os resultados demonstraram que as edificações com os sistemas de vegetação integrados à cobertura ou paredes foram, em sua maioria, significativamente os preferidos, considerados esteticamente bonitos, restauradores, obtendo mais qualidades afetivas positivas do que as edificações sem vegetação.
Estudo semelhante for realizado no Brasil, por Valesan, Fedrizzi e Sattler (42), que procuraram identificar vantagens e desvantagens no uso das peles verdes com vegetação aderente em edificações de Porto Alegre, a partir da percepção dos moradores destes locais. Concluíram, com base nas entrevistas realizadas, que as principais vantagens da técnica são embelezamento da paisagem, a integração do ambiente urbano e da natureza, os efeitos positivos para o bem-estar do homem e a melhoria da temperatura interna das edificações. A principal desvantagem citada foi a necessidade de manutenção do revestimento vegetal.
Diante destes aspectos positivos, constatamos nas grandes cidades o adensamento populacional e predial, a proliferação de congestionamentos e outros fatores que contribuem para o caos urbano e deterioram a qualidade de vida da população. Neste sentido, é grande a possibilidade de que, nos dias atuais, o contato com a natureza seja ainda mais importante, uma vez que as pessoas vivem mais tempo nas cidades, confinadas em espaços de trabalho, com pouco ou nenhum contato com a vegetação.
Sendo assim, o emprego de componentes naturais em arquitetura, como os jardins verticais, representa uma importante alternativa para minimizar os impactos ao ambiente local, de integrar o meio construído ao meio natural e de aumentar exponencialmente a área vegetada nas cidades.
notas
NA – Este artigo é parte integrante da Tese de Doutorado da autora. SCHERER, Minéia Johann. Cortinas Verdes na arquitetura: desempenho no controle solar e na eficiência energética de edificações. Tese (Doutorado em Arquitetura). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.
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24
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26
Idem
27
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sobre a autora
Minéia Johann Scherer é Doutora em Arquitetura pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente é professora adjunta do Centro Universitário Franciscano, atuando especialmente nas áreas de Conforto Ambiental e Eficiência Energética.
Beatriz Maria Fedrizzi possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1985), mestrado em Paisagismo pela Swedish University Of Agricultural Sciences (1991) e doutorado em Paisagismo pela mesma Swedish University Of Agricultural Sciences (1997). Atualmente é professora assossiada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experiência na área de Interrelação Homem Ambiente, com ênfase em Psicologia Ambiental.