Heinrich Wolfflin define por “forma fechada aquele tipo de representação que, valendo-se de recursos mais ou menos tectônicos, apresenta a imagem como uma realidade limitada em sim mesma, que, em todos os pontos, se volta para si mesma. O estilo de forma aberta, ao contrário, extrapola a si mesmo em todos os sentidos e pretende parecer ilimitado, ainda que subsista uma limitação velada, assegurando justamente o seu caráter fechado, no sentido estético” (1).
Na arquitetura não existe uma verdade reflexo de uma estrutura eterna e fechada do real, mas sim uma mensagem construída cada vez que o arquiteto é chamado a dar uma resposta. Em cada intervenção é necessário um diálogo entre o pré-existente, o presente e o desejo de futuro. O olhar fixo no presente empobrece, o arquiteto corre o risco de estar preso a um jogo de repetição, um eterno retorno.
Cada lugar exige um novo posicionamento, um olhar não impositivo. O ato do arquiteto implica em criar sobre o futuro, atuar, arriscar. Mantendo apenas o que nos foi dado nada mudará, mas se impusermos formas prontas e genéricas, não haverá renovação. Neste sentido, a tradição deve representar sempre um desafio à inovação e não alguma coisa a ser respeitada.
Para cada contexto deve haver a busca de novas soluções e não a aplicação de tipologias prontas. Captar o que é necessário fazer em cada momento e em determinado lugar sem uma prévia matriz de definição. Não se faz arquitetura sem considerar as diferenças nos meios de produção, na tecnologia, nos materiais, na mão de obra e principalmente na observação do que está latente em cada lugar.
Arquitetos necessitam de bons ouvidos, devem fugir da surdez ótica. Um projeto envolve sempre uma dimensão arqueológica que diz respeito à maneira como uma obra se insere num determinado lugar concreto.
Projetar implica em revelar, e, por isso, é uma forma de conhecimento que não se baseia numa trama estática de verdades, mas num processo constituído de forma aberta.
A forma aberta diz respeito ao público, ao coletivo, a uma política de desenvolvimento sustentável da cidade, onde a questão dos bens públicos, incluindo aqui o meio ambiente, não signifique à privatização do poder político, muito menos a substituição da lógica política pela lógica empresarial ou a degradação do interesse social em prol do interesse privado.
Deve existir o diálogo entre a cidade, as práticas sociais e o meio ambiente; não se trata aqui de pura relação com a natureza, trata-se principalmente da coerência na utilização dos recursos naturais e dos recursos humanos, entendendo o território em termos produtivos mais vinculados à noção de capital social. Aqui mais uma vez, existe a necessidade de individualizar cada intervenção, adaptá-las a cada condição e contexto, a cada condição climática, com o intuito de buscar um design eficiente e ao mesmo tempo moderado no uso de materiais, energia e espaços.
Agir no mundo de forma aberta pressupõe levar em conta os direitos da maioria. Os bairros fechados e as favelas são sintomas de uma sociedade que não adimite diferenças. Shopping centers, edifícios que tentam sintetizar as cidades em suas funções, cidades cosntruídas para o funcionamento de veículos individuais; caracterizam um estilo de vida que resulta em alto consumo de superfície, energia e água. Esse modo de vida deve ser revisado.
A forma aberta não é simplesmente uma relação custo-benefício, mas uma forma de interferir no mundo para que esse possa ser mais equilibrado e mais justo. É oposta à robotização do gesto arquitetônico, robotizar é repetir, agir repetindo o gesto anterior infinitamente, arquitetura não é repetição, é gesto novo a cada projeto, projetar é eleger, preferir, selecionar, um jogo de “prende e solta” como diria um professor, batalha que se inicia em cada novo cliente, terreno, projeto.
A forma aberta é generosa. Um projeto generoso é aquele que se deixa adequar, que pode ser adaptado à mudança de uso, que se transforma com a mudança do sol, dos ventos ou do caminhar dos homens.
notas
1
WOLFFIN, Heinrich. Conceitos fundamentais da história da arte. São Paulo, Martins Fontes, 1989.
sobre o autor
Ellen Assad é arquiteta e urbanista, formada pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), pós-graduanda em Estratégias de Comunicação e Gestão da Imagem, professora substituta curso de Comunicação Social (UFES).
Ellen Assad, São Paulo SP Brasil