Muitos temos acompanhado com indisfarçada ansiedade o lento processo de apuração das eleições norte-americanas.
Alguns torcendo para um dos lados, como se o destino da humanidade dependesse das urnas de Geórgia, Pensilvânia e Nevada. Outros, menos numerosos mas igualmente fervorosos, a lembrar que isso é uma ilusão porque, ao frigir dos ovos, os democratas são imperialistas mais intervencionistas que os republicanos.
Enquanto isso, em mais uma demonstração de que nossas instituições continuam funcionando, como sempre funcionaram, uma garota catarinense, depois de estuprada fisicamente pelo playboy de família de bem (e bens, claro) foi estuprada moralmente pelo advogado do canalha, sob o olhar complacente (ou cúmplice) do juiz igualmente canalha.
Enquanto isso, mais três plataformas da Petrobrás são vendidas por um valor menor do que custaram e o Senado aprova a tão desejada autonomia do Banco Central que, na prática, significa a total independência dos banqueiros em relação aos governos, isto é, à manifestação da vontade dos eleitores.
Enquanto isso, a mão do gato de Dória, que havia tentado garfar 30% dos recursos da Fapesp em plena pandemia, por meio do PL 529, disse que voltava atrás, mas continua retirando os mesmos 30%, agora no projeto de Lei Orçamentária para 2021. Em plena pandemia e vindo de um governo que se afirma (acredita quem quiser) defensor da ciência.
Enquanto isso, o Brasil vai às urnas para escolher seus prefeitos, as autoridades governamentais mais próximas das dificuldades e necessidades da população, e o que assistimos é o eterno repeteco dos “no meu governo eu vou fazer...”. Pouquíssimos são os que demonstram conhecer a situação concreta do município e menos ainda são os que dizem “como“ vão fazer o que dizem que vão fazer.
Com tantos “enquanto isso” a nos ameaçar por aqui, por que prestar atenção ao que acontece no império do norte? Há algumas respostas possíveis.
Primeiro, porque é (ainda) o império. A maior potencia econômica do planeta, ao menos pelas próximas duas ou três décadas e o maior poderio militar, capaz de explodir o planeta vinte vezes, falando apenas no potencial destrutivo do arsenal nuclear.
Segundo porque nos permite assistir, espantados e invejosos, aos âncoras das três maiores redes de televisão interromperem a fala do presidente para afirmar que ele está mentindo.
Há outras razões, mas acabou o espaço e termino por um critério, confesso, muito pessoal. Quando Bolsonaro e sua gangue de banqueiros, milicos e milícias torce por um time, eu não hesito um instante em torcer contra, independente de quem seja o outro.
sobre o autor
Carlos A. Ferreira Martins é professor titular do IAU USP São Carlos, nunca achou que quanto pior, melhor.