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drops ISSN 2175-6716

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A historiadora Giovanna Rosso Del Brenna comenta a participação do arquiteto nigeriano Demas Nwoko na 18ª Mostra Internazionale di Architettura da Biennale Architettura 2023.

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ROSSO DEL BRENNA, Giovanna. O laboratório do futuro. Demas Nwoko na 18ª Mostra Internazionale di Architettura da Biennale Architettura 2023. Drops, São Paulo, ano 24, n. 190.03, Vitruvius, jul. 2023 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/24.190/8865>.



Na véspera do dia em que ele receberá o Leão de Ouro para a carreira (ou neste caso para a vivência?), o príncipe Demas Nwoko, 88 anos, chega em cadeira de rodas ao pavilhão de James Stirling. Fazem-no sentar numa cadeira normal para tirar fotos, depois volta para a cadeira de rodas, toma um pequeno lanche, é entrevistado por jornalistas, e fica lá quieto e risonho, cercado e carinhosamente cuidado o tempo todo por colaboradores, amigos e familiares, num misto encantador de amor e respeito.

Do seu posto, perto do balcão de entrada, ele pode apreciar a vista dos visitantes que começam a chegar para conhecer sua história (desconhecida no mundo afora e até hoje pouco conhecida na própria África, comentou Lesley Lokko, curadora da Bienal deste ano).

Demas Nwoko nasce em 1935 a Idumuje Ugboko, no estado do Delta, Nigeria. Filho do Obi (rei), passa a infância no palácio da aldeia – um edifício de terra construído pelo avô no modelo praticado pelos Oba do Benin, ancestrais da família – e em seguida estuda arte no College of Arts, Science and Technology em Zaria, participando ativamente de um coletivo de jovens artistas que rejeitam uma cultura eurocêntrica em favor de uma arte ligada às tradições locais.

Em 1961 – no ano anterior a Nigeria ganhou a independência – ele está em Paris, aonde estuda arquitetura teatral e cenografia, mas já tem encaminhado seu projeto de ateliê numa colina em Ibadan, que se tornará em 1967 o Centro de Design da Nova Cultura.

O elemento central do conjunto – que compreende laboratórios, oficinas, espaços educativos até hoje in progress – é um anfiteatro, que abrigou varias produções teatrais, entre elas a ópera yoruba “O bebdor de vinho de palma”, do próprio Nwoko. Tudo acontece – e acontecerá em seguida – em nome da experimentação. Uso de luz natural, ventilação através de fendas deixadas abertas e materiais de construção do lugar: blocos compostos por una mistura de argila local – laterite –, com cimento e areia que ele chama de lacreto.

Com o mesmo material, que às vezes é acompanhado pela inserção bem-sucedida de vidros coloridos, Nwoko vai realizar em seguida, a Ibadan, a Capela e o Instituto da Ordem Dominicana (1970-1975) e, na aldeia natal, sua residência particular: uma villa em andamento “há 46 anos”, que cresce junto com a família dele ao redor de um sistema de pátios.

As obras de arquitetura inteiramente realizadas afinal são cinco – além das citadas temos o Centro Cultural Oba Akenzua em Benin City, 1972-1995 e o lindo Mosteiro Beneditino em Ewu, 1987-2005 – e três as “propostas” em andamento (a Galeria Nacional da capital, Abuja; a nova Capela de Ewu e o Centro de Design da Nova Cultura de Lagos).

Todas elas estreitamente entrelaçadas com uma vida inteira de experimentação artística, teatral, educacional através do design. E de fé indomável no futuro, rumo à uma “uma África integrada, próspera e pacífica, liderada pelos seus cidadãos e representando uma força dinâmica na arena global”.

Nossa Bienal de Arquitetura 2023 – dia 19 de maio – começou assim, e prosseguiu no pavilhão brasileiro. De Leão de Ouro em Leão de Ouro – descobrimos no dia seguinte –, mas de antemão e sem preconceitos.

Teremos que voltar com calma aos outros temas, que em muitos casos prometem ser contundentes, principalmente na seção Dangerous Liaisons do Arsenale (1).

Mas como deixar de contar logo estes primeiros encontros que contém e revivem os temas-chave do ano?

Se tivéssemos procurado as obras de Demas Nwoko há apenas alguns meses, teríamos encontrado com dificuldade em nossos sites; mas elas já estavam bem documentadas pela Al Jazeera.

De fato, a história da arquitetura que temos à nossa disposição – como a Lesley Lokko declarou em muitas ocasiões – não está errada. Está incompleta. E o “laboratório do futuro” lembra-nos disso a cada passo.

nota

1
O governo chinês inaugurou seu pavilhão sem a presença de seu embaixador e cancelou o jantar de gala, ofendido com a presença de uma instalação holandesa sobre os campos de "reeducação" do povo Uyghur.

sobre a autora

Giovanna Rosso del Brenna, italiana, é historiadora da arte. É docente da Università Cattolica del Sacro Cuore, em Milão, desde 2001, e da Università degli Studi di Genova, desde 2000. Foi professora adjunta da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) entre 1978 e 1990.

 

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