Entrevista com Guido Zucconi
Adalberto da Silva Retto Júnior
Adalberto da Silva Retto Júnior: Donatella Calabi em História urbana na Itália (2002) afirma que “A História da cidade (na Itália) nasceu da História da Arquitetura, mais do que da história social, institucional, ou econômica (como é freqüente em outros países europeus)”. Tafuri, sem deixar de incluir Marcello Piacentini, enfatiza que “No momento em que a história da arquitetura nasce na Itália moderna, encontra um forte apoio na figura de Gustavo Giovannoni, depois de Vicenzo Fasolo e de outros personagens deste gênero.” E reforça que “Tratava-se da tese do arquiteto integral”, com o mesmo fundo ideológico de Walter Gropius, cujo slogan era, “da colher à cidade”. Dessa forma, pode-se pensar na formação de intelectuais “orgânicos”- para usar uma expressão de Antonio Gramsci. Gostaria de saber, quais são as personagens-chave, na Itália, que desenharam um percurso alternativo que individualiza a cidade como sujeito de estudo?
Guido Zucconi: Acho muito apropriada a referência a Giovannoni, através da interpretação proposta por Tafuri em 1967. O meu livro sobre Giovannoni de 1997 partia daquele juízo brilhante de trinta anos antes: o título escolhido naquela ocasião Do capitel à cidade, correspondia à tradução giovanoniana da colher à cidade: uma tradução sob o signo da arte e da história.
Porém, devemos estar atentos, pois Tafuri ia ainda além, envolvendo o conjunto dos arquitetos, intelectuais italianos incapazes, segundo ele, de emancipar-se do mito giovanoniano do “projetista integral” e do “arquiteto que faz tudo”: tivemos uma prova disso com a recentíssima reforma das ordens didáticas (o assim chamado “3+2”) que “driblou“ a demanda de especialidades. Em todos os cursos por assim dizer “especialistas” foi de fato proposto a mesma figura do projetista onisciente, variadamente aromatizado (existe o arquiteto ao sabor de “restauro”, o arquiteto ao sabor do “urbanismo”).
Esta hegemonia do arquiteto condicionou também setores limítrofes, como da história urbana: isto também por causa da fraqueza de algumas disciplinas – como a geografia – que em outros países tiveram e têm ainda hoje um papel decisivo. Porém, na França e na Espanha, dois países vizinhos da Itália, são os geógrafos – não os arquitetos – que fornecem uma longa e nobilíssima tradição de estudos monográficos.
Em meu ensaio apresentado no Brasil, eu enfatizei um outro fator de “desbalanceamento” na mesma direção: o peso adquirido na Itália da assim chamada “literatura artística” (monografias sobre praças e monumentos, guias, coleções fotográfica) que, entre o fim do século XIX e o início do século XX, havia concentrado sobre bases arquitetônicas uma grande massa de material cartográfico, iconográfico, monográfico. Na origem de uma tradição de estudos sobre a cidade, existem aqueles mesmos lugares que mais tarde reaparecem representados do mesmo modo: basta analisar as fontes para perceber esta surpreendente continuidade.