José Paulo Mateus: Como começou o projeto? Já conhecia pessoalmente os donos da casa?
João Luis Carrilho da Graça: Eu conhecia a Isabel e o Julião de três ou quatro ocasiões mais ou menos públicas. Quando fui convidado para intervir na casa, a missão que eu tinha era fazer apenas a piscina e a casa do cão. E eu achei imensa graça. Fui lá e pareceu-me que era interessante fazer a piscina numa cota alta, ao lado da casa, essencialmente porque tem uma melhor insolação e depois porque me incomodava na casa o divórcio completo que tinha com os espaços exteriores do jardim. A casa tinha uma série de pisos, muito mal relacionados com os espaços exteriores e acabava por funcionar quase como um edifício de apartamentos. A posição da piscina estrategicamente localizada junto da casa – embora não se tenha realizado o projeto inicial – e as possibilidades de ligação que ela depois sugeria, foram um bocado o ponto de partida de uma espécie de reconstrução da casa.
JPM: Como era a piscina inicial?
JLCG: O conceito à partida era o mesmo – um paralelepípedo de aço cortén que contém a água. Depois havia uma série de situações, aparentemente de detalhe, mas que eram bastante diferentes: um jogo muito intencional e delicado com a estrutura, o tipo de pedras e a pormenorização. Havia ainda um balneário ao lado que tinha luz zenital, um chuveiro enorme, etc. Foi de fato um dos espaços que gostei de desenhar porque possuía um desenho muito intencional, muito forte. A idéia era criar uma espécie de palco um pouco elevado em que os corpos tinham uma presença quase como num espaço teatral. Depois, quando se pediu orçamentos aos empreiteiros, o preço era excessivo e houve que optar por técnicas mais práticas e o balneário desapareceu.
JPM: Como surgiu essa idéia de caixa?
JLCG: Quando fui lá da primeira vez, o jardim era mais uma espécie de floresta. Tinha um ar romântico e havia um ambiente fortíssimo com árvores frondosas e com uma sensação incrível de abandono. Quando pensamos na piscina com aquele formato, era quase como se fosse como um daqueles túmulos que se encontram romanticamente abandonados no meio da floresta que são duas pedras, ou qualquer outro objeto arquitetônico um bocado deslocado. Depois, uma discussão muito interessante que tivemos foi relativamente à cor interior da piscina. Tinha uma maquete em que tinha pintado cor de laranja e a reação do Julião foi imediata e direta "para mim uma piscina é como as do David Hockney, azul azul, com um ar de preferência normal".
JPM: Não sei se é muito atraente tomar banho numa água cor de laranja…
JLCG: Não faço idéia, mas naquele contexto parecia-me particularmente atraente. Mas quando penso numa coisa destas é uma mera hipótese, não se trata de um fato incontornável, e a reação do Julião tornou-se decisiva.
JPM: Dá a sensação que não havia um programa definido. A própria vontade de alterar a casa foi aparecendo aos poucos.
JLCG: As coisas foram estudadas um bocado fragmentariamente, partindo de pequenas intervenções que foram ajudando a relacionar a casa com o exterior e depois a reconstruí-la interiormente para criar uma certa unidade.
Os espaços cá de baixo, que no contexto da casa estavam relativamente secundarizados, estavam a precisar de intervenção profunda. Pensou-se então na criação de um grande espaço conjunto, para onde passaram a sala de refeições, o quarto dos amigos e a cozinha, o que fez com que a relação da casa com o exterior ganhasse uma importância particular.
Parece que materialmente pouco se fez mas realmente deu-se uma profundíssima metamorfose de todo aquele espaço da casa que mudou mesmo radicalmente.
JPM: Há aspectos de uma certa estranheza. Por exemplo num dos poucos sinais exteriores, o pequeno portão negro e o espaço de entrada para a cozinha.
JLCG: Eu gosto bastante do pequeno portão porque quando se abre, subitamente surge a entrada na cozinha que parece funcionar independente da casa e tem um ar de quase desmontar aquele volume. Depois existe o espaço entre a casa e a cerca: uma espécie de caixa de madeira. É como se fosse um pátio mas que não é um vazio dentro de uma massa – como normalmente são os pátios – é um vazio dentro de um vazio, que não houve interesse em fechar. O que se tenta criar é uma sensação de interioridade através do material que é sempre a madeira, mas só com os elementos indispensáveis.