José Paulo Mateus: Neste projeto há uma grande preocupação de ligação a um léxico próprio, ou procura a especificidade deste exercício com as perspectivas que pode abrir?
João Luis Carrilho da Graça: Eu tenho sempre uma relação muito natural com isso. Ao fim de alguns projetos no início da minha carreira, comecei a reparar que havia algumas formas recorrentes. E isso ao contrário de me parecer interessante e positivo, porque podia ter a ver com a possibilidade de ter adquirido um estilo próprio, incomodava-me extraordinariamente. Parecia-me estranho que as mesmas formas conseguissem resolver coisas tão diferentes, por vezes afastadas milhares de quilômetros e com programas quase opostos. Eu não procuro, de certeza artificialmente, uma qualquer forma de coerência. Se a coerência existir é uma coisa que tem de ser interna, um reflexo e não um objetivo que se construa. Eu até quase diria que tenho mais vontade de fugir a essas evidências do que a construí-las. O mais interessante é não procurar mesmo qualquer sinal de vinculação a um determinado tipo de vocabulário.
JPM: O discurso da beleza e da capacidade que a arquitetura tem de regenerar a vida das pessoas, não parece muito valorizado por alguns arquitetos da primeira linha…
JLCG: Eu acho que até é um dos aspectos fundamentais. Não tem é que ser encarado duma maneira que se relaciona só com o conforto e com aspectos que nós podemos chamar pequeno-burgueses da vida, mas com aspectos mais fundamentais. O mundo é extremamente desconfortável e a arquitetura é desconfortável num sentido mesmo lato e ontológico. Nós estamos sempre em desacordo com as condições de vida do universo. Há sempre uma certa luta entre aspectos que contribuem para a harmonia e os que a destroem permanentemente. Eu acho que a arquitetura tem necessariamente de pertencer ao universo dos que reconstroem permanentemente o mundo no sentido de o humanizar. Eu acredito que o papel da arte, e da arquitetura que está nela incluída, é precisamente esse: o de humanizar o mundo, de conseguir reequilibrá-lo e torná-lo mais humano, sem caricaturizar.
JPM: Não é feita só em função disso mas não pode deixar de passar por isso…
JLCG: Se encararmos a arquitetura de uma maneira mais genérica eu acho que aquilo que acaba de dizer e se for entendido num sentido lato, é exatamente a razão de ser e o objetivo do nosso trabalho. É aí que está a nossa dimensão profissional.