Adalberto Retto Jr, Norma Constantino e Marta Enokibara: Relembrando suas palestras e aulas, o senhor insiste na experiência do espaço cotidiano para a compreensão da forma e da dinâmica urbana, relatando uma experiência empírica e, às vezes, corporal com a cidade. Qual o limite entre análise e projeto? Conte-nos sobre a pesquisa desenvolvida pelo senhor na cidade de Diamantina.
José Cláudio Gomes: Este é o nó cego das teorias do século passado. Análises e discursos analíticos primorosos que conduzem a propostas sinistras e aterradoras... É o caso dos pós-modernos, entre outros, Rossi, Portoghesi, Jencks, Krier, Moore, Graves, Venturi, etc. e etc., onde a miopia e grosseira falta de sensibilidade e delicadeza no trato da articulação análise/projeto leva-os a verdadeiras monstruosidades projetuais. No entanto... a teoria é insuperável...
Ora, a articulação análise-projeto nunca é linear e direta como supõem os epígonos da tipo-morfologia, cujos seguidores na academia sempre se encarregam de reduzir, instrumentalizar, empobrecer e apequenar a teoria. É que a análise deve se dar sempre por aproximações progressivas ao projeto. Na verdade, todo projeto já se acha inscrito nas entrelinhas da análise. Esta se inicia pela observação atenta e cuidadosa do “desenho” do espaço real (contexto), passa, a seguir, a revelar a “forma” até chegar à síntese da “estrutura” básica do ambiente onde se inserirá o projeto. Este é o momento analítico: revelar a estrutura histórica de uma situação existente.
Ai começa o projeto: revelar a futura estrutura de uma situação desejável. Entre o momento da análise e o momento do projeto, que é o movimento que vai do existente ao desejável, situa-se a gênese do projeto, instante mágico e raro, sempre delicado e problemático.
A, N e M: Sobre Diamantina?
JCG: O objetivo da pesquisa, em andamento, em Diamantina (MG) é investigar a arquitetura de uma cidade setecentista do ciclo do ouro em Minas gerais adotando como estudo de caso o antigo Arraial do Tejuco, atual cidade Diamantina (MG). Para tanto, algumas providências preliminares foram necessárias: um mergulho na história e cultura do século XVIII do ciclo do ouro e do diamante nas Minas gerais, concomitantemente com o corpo a corpo com o espaço real da cidade.
O caso do Tejuco foi escolhido devido à sua excepcionalidade histórica no quadro do ciclo do ouro em Minas Gerais mas, “metodologicamente” poderia ter sido qualquer outro núcleo urbano adotado para análise.
O objetivo do ensaio é verificar como se deu a constituição da forma urbana, o vocabulário, a gramática e a sintaxe num contexto de grande significado histórico e estético ainda milagrosamente preservado. Enfim, trata-se de desvendar “da arquitetura da cidade”: nem a arquitetura do edifício isolado nem a totalidade da problemática urbana dos “urbanistas”.
Considerando o fato do espaço urbano do antigo Tejuco ainda se encontrar bastante bem preservado fisicamente mas, principalmente, considerando a “qualidade” específica deste espaço urbano – mais para o Rococó que para o Barroco Clássico – escolheu-se o Arraial do Tejuco para análise.
Finalmente, o ensaio trata, especificamente, da arquitetura “da” cidade através de uma leitura direta e sem intermediários do espaço, como um “texto” urbano. Nem a história urbana, nem a arqueologia urbana. Arquitetura, simplesmente.