Roberto Segre: Nos anos setenta, transcorrida a primeira década do Governo Revolucionário, a experiência cubana despertou grande interesse internacional. Foram convidados prestigiosos especialistas estrangeiros para dar cursos e conferências em Havana: os franceses Courajoud, Borja Huidobro e o prestigiado norte-americano Kevin Lynch. Qual foi sua relação com eles e como influenciaram em seu desenvolvimento?
Mario Coyula: Lynch não foi convidado pela Faculdade e sim pelo Instituto de Planejamento Físico. Mas sentí imediatamente muita afinidade com ele. Era um homem simples, muito humano. Ia direto ao essencial, sem adornos nem complicações desnecessárias. Junto com Jane Jacobs, foram os dois primeiros que nos Estados Unidos questionaram o urbanismo de urbanistas. Tratei de ficar o máximo possível perto dele, e ler todos os seus escritos disponíveis. Recordo que em uma visita a nossa Escola o projeto que mais gostou foi o de Graduação de dois estudantes meus sobre a Avenida 51 em Marianao, um dos primeiros em abordar o paisagismo urbano na Escola, depois de outro em que tínhamos proposto a pedestrealização da Rua Obispo. A ironia é que o tribunal da Escola que julgou o trabalho de Graduação sobre a Avenida 51 só lhe tinha dado a aprovação rasante de três pontos…
Pouco antes de morrer, Lynch respondeu a uns estudantes que lhe pediam recomendações para fazer as coisas bem. E resumiu em quatro pontos: manter tudo o mais simples possível, fazer todas as conexões possíveis –no tempo, no espaço–; criar suportes para o que as pessoas querem fazer… e semear muitas arvores! Se pensar bem, não necessita mais.
Visitei Corajoud e Borja em seu Atelier d’Architecture et d’Urbanisme (AUA) em Paris, aproveitando minha ida a um congresso em Versalles em 1971. Tinha noticias de seus trabalhos e lhes pedi um curso de verão sobre metodologia de desenho e desenho urbano. Vieram esse mesmo ano, junto com Michel Allegret. As pessoas ficaram encantadas com as espetaculares perspectivas de Grenoble-Echirolles desenhadas pelo peruano Enrique (agora Henri) Ciriani, que não veio ao curso, e o entusiasmo de Michel. Comparado com eles, alguns viram Lynch um pouco apagado; e definitivamente desiludiu aos que assistiram esperando receitas.
Olhando para trás, foi um duelo formoso, ainda que nunca competiram na mesma sala nem ao mesmo tempo. Para mim, Lynch era como o velho mestre em artes marciais que já não necessita da força física; Borja e Michel os jovens talentosos e (quem sabe em demasia) apaixonados. Quando Lynch morreu escrevi um texto em sua homenagem. Recebi do MIT uma notificação e um convite de Gary Hack para suas honras fúnebres, que ainda guardo. Nunca voltei a ver a Michel Corajoud, que em 2003 obteve um importante prêmio nacional de urbanismo na França.
Esses cursos de verão foram promovidos pelo então reitor da Universidade de Havana, José Chomí Miyar. Ainda vale dizer que os professores vinham sem cobrar honorários. Outro dos que pude convidar nessa época foi Duccio Turín, especialista em industrialização e normalização e professor da Architectural Association de Londres, um filósofo da construção que contrastava com tantos Neanderthais locais. No pouco tempo que ficou aqui me deu sua visão do país: "vocês têm microplanos, extraplanos, planos especiais… mas o que não têm é um Plano!". Poucos anos depois soube que faleceu num acidente automobilístico. Todas foram influências importantes para mim.