João Carlos Henriques e Eduardo Pierrotti Rossetti: E o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB) que está sendo desenvolvido? Ele é uma oportunidade para recuperar questões, retomar aspectos básicos do projeto original, recolocar essa discussão e consolidar a cidade de acordo com sua concepção?
Alfredo Gastal: Sim. Acredito que o Plano proposto pelo GDF e que atualmente está sendo desenvolvido pela empresa que ganhou a licitação tem grandes chances de propor a recuperação de questões fundamentais para a cidade. Desde o seu início o IPHAN o acompanha de muito perto e, periodicamente, mantém reuniões com a equipe de acompanhamento da SEDUMA e com a empresa. O início, como quase sempre acontece em casos similares, foi uma pouco difícil, mas após um ou dois meses, o diálogo foi afinado. O “x” da questão na Capital – insisto – da República Federativa do Brasil é a metropolitanização da área tombada. Isso é absolutamente inadmissível ou, se o for, Brasília perderá o seu sentido como patrimônio nacional.
Não acho que uma cidade moderna – mesmo dos anos 60 – possa ou deva ser engessada e Lúcio jamais pretendeu que sua cidade ficasse em tal situação. Ele foi muito claro a respeito disso. Uma das coisas que me consola a respeito da má arquitetura que surgiu no Plano Piloto é que esses prédios todos podem ser demolidos quando estiverem mais velhos e que poderão ser re-projetados, desde que obedeçam à volumetria estabelecida no Plano Piloto e protegida pela Portaria 314 (4). Entendo que este é o objetivo e a função do PPCUB. Embora limitado ao Plano Piloto, sua análise deverá estender-se mais além deste e considerar as ameaças que advém do crescimento desordenado e insustentável do DF e do seu entorno, tanto econômica, social como ambientalmente.
O dinamismo da cidade, hoje inserida involuntária e temerariamente no meio do processo de metropolitanização do Distrito Federal, demanda uma exegese, acompanhada de uma vulgata, da Portaria 314, provavelmente atualizada as circunstâncias atuais. Não para protegê-la apenas da tão temida especulação imobiliária, pois esta, às vezes, tem o condão de gerar impulsos arquitetônicos (5) de muito boa qualidade associados a ganhos econômicos (6). Essas poderiam ser medidas realistas para o planejamento mais explícito, e de certa forma até mais rígido, sem impedir, entretanto, o desenvolvimento da cidade dentro dos parâmetros do tombamento nem a criatividade dos arquitetos ou dos setores produtivos. Hoje a tendência é aceitar, passivamente, alguns até com euforia, que Brasília se torne o centro da grande metrópole regional do Centro Oeste. Errado, Redondamente errado: Brasília é a capital da república queiram ou não, até que algum Presidente da República e o Congresso Nacional a desconstituam de tal posição; é também tombada, e por isso não poderá ser um centro metropolitano, é o centro cívico do país. Pode até parecer meio fascista, mas garanto que não: ela é o marco histórico do Brasil moderno.
notas
4
Portaria nº. 314, de 8 de Outubro de 1992 que trata da proteção do Conjunto Urbanístico de Brasília, tombado nos termos da decisão do Conselho Consultivo da SPHAN.
5
As Torres do Parque do arquiteto colombiano Rogelio Salmona, construídas, nos anos entre 1964 - 70 próximas à Praça de Toros, em Bogotá.
6
Recuperação de áreas de pouco valor econômico, decadentes, pouco desenvolvidas, etc. Arquitetura também pode ser símbolo de prosperidade, de força e retomada do espaço urbano.