O conceito de cidades criativas surge impulsionado pelas discussões acerca de uma nova economia: a economia criativa. Esta, por um lado, bebe nas fontes da economia do conhecimento, caracterizada pela centralidade da informação na geração de competitividade regional; na atuação global de setores econômicos, mercados e finanças, possibilitada pelas novas tecnologias; na organização em redes (1).
No início da década de 90, a Austrália propõe o conceito de indústrias criativas e passa a influenciar outros países, principalmente os de língua inglesa, pelo seu potencial socioeconômico. Desta forma, o Reino Unido passa a ser o maior defensor da aplicação do conceito. Na Inglaterra, em 1997, com a ascensão do New Labor, o recém-eleito Tony Blair determinou que as indústrias criativas constituiriam um pilar de crescimento econômico, tendo em vista a decadência da competitividade mundial do setor manufatureiro britânico.
No Brasil, o conceito de indústrias criativas ainda está em discussão. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD questiona a ênfase em propriedade intelectual adotada pelo governo britânico e propõe um debate acerca de uma versão mais adequada aos países em desenvolvimento, incluindo folclore, turismo cultural, patrimônio e capacitação (2). Em ambos os contextos, de países desenvolvidos e em desenvolvimento, promove-se a discussão acerca do potencial da economia criativa para fomentar o desenvolvimento social e econômico de regiões urbanas, favorecendo assim o surgimento de “cidades criativas”.
O conceito de cidades criativas está se difundindo nos últimos anos devido a uma convergência de fatores, como a procura por um paradigma socioeconômico adequado ao contexto pós-industrial; a intensa globalização e a valorização das identidades e culturas locais; a disseminação das tecnologias de informação e comunicações; as estatísticas urbanas reveladoras e a preocupação crescente com a sustentabilidade urbana (3).
Conforme estudo desenvolvido pelo Banco Mundial, regiões que aspiram a se tornar criativas devem atentar a quatro aspectos: infra-estrutura de comunicações e serviços sociais; áreas de convívio social e cultural, a exemplo de parques, restaurantes e centros comerciais; tolerância pela diversidade, resultando em liberdade de pensamento e expressão e estabilidade macroeconômica (4).
Enquanto a maioria dos autores que se dedicam ao tema não apresentem uma definição clara de cidade criativa, destaca-se a definição cunhada pela Canadian Policy Research Networks:
“Cidades criativas são locais de experimentação e inovação, onde novas idéias florescem e pessoas de todas as áreas se unem para fazer de suas comunidades lugares melhores para viver, trabalhar e se divertir. Baseiam-se em tipos diferentes de conhecimento, pensam holisticamente e agem sabendo da interdependência econômica, social, ambiental e cultural; usam a participação pública para lidar com temas complexos, [...] e problemas urbanos perenes de habitação, inclusão, preservação e desenvolvimento” (5).
O objetivo de políticas de revitalização urbana, econômica e social tem sido fortemente embasados em cultura e criatividade. São os exemplos dados pela Austrália (Sydney, Melbourne), Espanha (Barcelona, Valencia, Bilbao), Inglaterra (Londres, Birmingham) e Buenos Aires, que investiu na recuperação da região de Puerto Madero, implementou o Observatório das Indústrias Culturais e se candidatou ao título de Cidade de Design, concedido-lhe pela Unesco em 2005.
A bibliografia sobre Cidades Criativas é escassa, porém, alguns nomes se embrenham neste despertar ainda nebuloso. Pode-se citar internacionalmente um nome importante neste tema, Charles Landry, com suas publicações, principalmente o livro The Creative City em 2000. No Brasil, o empenho em divulgar tal tema é representado no nome de Ana Carla Fonseca Reis. Ela iniciou a difusão deste assunto no Brasil a partir do livro Marketing cultural e financiamento da cultura em 2002. Posteriormente, lançou outras publicações, como o livro vencedor do prêmio Jabuti de 2007 Economia da cultura e desenvolvimento sustentável e o finalista de 2013, Cidades criativas. Concebeu, e/ou editou os livros digitais Economia criativa como estratégia de desenvolvimento (2008, trilingue), Creative City Perspectives (2009, bilíngue) e Cidades criativas, soluções inventivas – o papel da Copa, das Olimpíadas e dos museus internacionais (2010).
Todo o esforço na divulgação da economia criativa fez com que, em 2013, Ana Carla ganhasse o prêmio Claudia na categoria Negócios e em 2014 fosse citada pelo jornal espanhol El Pais como as dez pessoas que mais se destacaram no cenário brasileiro. Desta forma, nesta entrevista, Ana Carla fornecerá subsídios para o entendimento das transformações urbanas que estão ocorrendo nas cidades, com a utilização da cultura como ferramenta de desenvolvimento urbano.
notas
1
CASTELLS, Manuel La Ciudad de la nueva economía. La Factoria, Junio-Septiembre 2000, n.12. Disponível em <http://www.lafactoriaweb.com/articulos/castells12.htm> Acessado em 21/12/09.
2
UNDP SOUTH COOPERATION PROGRAMME Creative Industries Summit Report. Rwanda, 2006.
3
REIS, Ana Carla Fonseca Reis Relato dos Curadores. Anais do Seminário Internacional Porto Alegre Cidade Criativa.Porto Alegre, 2009 [CD].
4
WORLD BANK Urban development needs creativity: How creative industries affect urban areas. Development Outreach, 2003.
5
CANADIAN POLICY RESEARCH NETWORKS (CPRN), Creative Cities Structured Policy Dialogue Backgrounder. Org. by Neil Bradford, 2004. Disponível em <www.cprn.com/doc.cfm?doc=1081&l=en> Acessado em 06/06/07.