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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
O presente artigo visa abordar como Florianópolis teve suas características litorâneas alteradas com o passar dos anos. Tendo como base de estudo a construção dos aterros e da marina à beira mar, e o impacto dessas obras na cidade.

english
The present article aims to address how Florianópolis had its coastal characteristics changed over the years. Based on the study of the construction of landfills and the marina by the sea, and the impact of these works on the city.

español
Este artículo tiene como objetivo abordar cómo Florianópolis cambió sus características costeras a lo largo de los años. Basado en el estudio de la construcción de vertederos y el puerto deportivo junto al mar, y el impacto de estas obras en la ciudad.

how to quote

MARTINS, Ana Flávia; KREFF, Nathalee Aline; KLEINKAUFF, Nicolle de Almeida; JASPER, Yago Roberto. A ilha que esqueceu de ser ilha. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 257.07, Vitruvius, dez. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/22.257/8345>.


Perspectiva projeto Parque e Marina Beira Mar
Imagem divulgação [PMF]


Florianópolis é uma cidade localizada no Sul do Brasil e atual capital do Estado de Santa Catarina. Ao longo dos anos, a cidade passou por diversas transformações ― principalmente no século 20 ― quando a construção civil tornou-se um forte suporte econômico para a região, sendo possível a implementação da rede básica de energia, água e esgoto na ilha (1).

A partir da década de 1950 Florianópolis começou a desenvolver de forma mais intensa seu turismo, fazendo uso de propagandas através de jornais e rádios sobre as principais praias do Norte da ilha.

“A necessidade de ampliar a rede urbana de serviços e a construção de rodovias modernas em direção às praias, aparecia como uma necessidade urgente para dotar Florianópolis de condições turísticas. A forma de apropriação e uso do solo pela população, considerada desordenada porque os terrenos de marinha estariam sendo ocupados sem controle, deveria ser evitada a qualquer custo, pois do contrário, afirmava, ‘dificilmente poderemos contar com uma avenida beira-mar’. Ou seja, a feição urbana desejável para a cidade já era prevista, o futuro de Florianópolis já deveria ser pensado, para evitar que os ‘descendentes’ não pudessem culpar as atitudes tomadas naquela época como ‘imprevidentes’, as quais deixavam de ‘garantir o uso para toda a população das praias’” (2).

Ao impulsionar o turismo na capital começaram a se deparar com as consequências da urbanização tardia. Isso deve-se ao fato da cidade focar seus esforços no porto que logo após foi abandonado, assim, o governo decidiu investir no turismo, porém para isso a melhor escolha seria designar seus esforços na construção de infraestrutura.

A cidade que até então mantinha suas atividades marítimas, estava crescendo diante do governo da União Democrática Nacional ― UDN, o qual possuía muitos projetos interessantes para a modernização da cidade, porém eram poucos os que eram executados. Florianópolis mesmo estando em crescimento ainda não atingira as principais características de uma cidade moderna o que a deixava em desvantagem e criando um risco da perda de seu posto de capital para outras municípios do Vale do Itajaí, para isso não acontecer foram investidos em pequenas fábricas de tecidos e biscoitos para fomentar investimentos na área industrial (3).

Na década de 1960 o eixo Norte da cidade teve bastante desenvolvimento, recebendo diversos equipamentos urbanos que transformaram a região, como por exemplo a criação da Universidade Federal de Santa Catarina ― UFSC (1960) no bairro Trindade, e a Universidade do Estado de Santa Catarina ― Udesc (1965) no bairro Itacorubi, devido ao recebimento das duas universidades a região tornou-se uma cidade universitária, tendo principalmente moradores jovens almejando o ensino superior. Em 1968 houve a transferência da Eletrosul do Rio de Janeiro para Santa Catarina e ainda durante a década de 1960 houve também a modernização do sistema viário com a implantação da BR-101 e, a construção da avenida Rubens de Arruda Ramos, conhecida como avenida Beira-Mar Norte (4).

Vista aérea da Praia de Fora. A Casa de Chácara aparece na fração esquerda da imagem
Foto divulgação [Arquivo Histórico da Associação Antônio Edu Vieira / Colégio Catarinense]

 

Por se sentir defasada e enquadrada como uma cidade de porte pequeno e nada moderna, Florianópolis buscou se inspirar nas outras capitais, o que resultou na perda de parte de sua história e características naturais, buscando aparato em grandes obras com tecnologias para se equiparar às demais capitais, portanto com isso deixa de lado sua principal característica de ser uma cidade portuária e tenta se introduzir na modernização, a criação de grandes rodovias.

Projetos rodoviários eram sinônimos de evolução e futuro, e impulsionada por grandes obras a exemplo de Brasília e suas rodovias de grandes tráfegos, encontraram um obstáculo que foi a falta de espaço na ilha para a criação de vias. Então, buscando soluções, inspirou-se nas criações de aterros, como o do Flamengo, no Rio de Janeiro RJ, onde houve grande embasamento e estudos para a execução do projeto, virando referência no país.

Em Florianópolis o aterro não teve o mesmo sucesso que no RJ, pois a obra ficou à mercê das políticas públicas, e com as trocas de prefeitos os projetos para o aterro também mudaram criando uma inconsistência e um vazio para o projeto evoluir como necessário. Além disso, houve uma falta de estudos que respeitassem as características do local sem destruir ou transformar em algo pouco aproveitável (5).

Após os dois aterros realizados nas décadas de 1960 (Aterro Baía Sul) e 1970 (Aterro Baía Norte) a área perdeu sua conexão com o mar, ao executá-los já sabia-se da intenção de conectar à universidade federal. As vias instaladas na área tinham como objetivo desafogar o trânsito, que com o futuro crescimento da região da universidade só tendia a aumentar e novamente é possível perceber como os investimentos são baseados no pensamento rodoviarista que ainda é muito presente na cidade (6).

O aterro demonstra características positivas para o crescimento da cidade, sendo um local usado para conectar de forma mais rápida e prática os extremos da ilha. Porém, atualmente, percebe-se que em diversos momentos a avenida continua tendo muitos congestionamentos, provando-se insuficiente para a mentalidade rodoviarista da cidade, principalmente em épocas de alta temporada de turismo.

Avenida Beira Mar, década de 1970
Foto divulgação

Além disso, a forma como foi desenvolvido o aterro apresenta diversas problemáticas, pois o que antes era usado para banho de mar, pescaria, entre outros hoje é uma grande área poluída, onde apesar de haver projetos para a despoluição da água nenhum obteve sucesso ou mesmo dedicação suficiente para tal, o que confirma como a cultura de distanciamento com o mar é presente. E dessa forma, a Beira-Mar Norte é utilizada apenas para automóveis e qualquer atividade que não envolva o mar.

Essa cultura presente em Florianópolis pôs em risco seu bem mais precioso, a natureza. Com o aterro, o mar e a vida marinha foram inutilizados e negligenciados. A partir desse momento e com o crescimento da cidade, esgotos foram sendo jogados na água, desrespeitando a vida marinha, sequestrando o futuro de uma ilha, que com o tempo esqueceu que era ilha e passou a ser apenas uma cidade.

Atualmente a ilha encontra-se com infraestrutura defasada, continua com sua cultura de afastamento do mar, pensamento rodoviarista e tentativa de se destacar diante de tantas outras cidades, utilizando-se de estratégias conhecidas como o city marketing, que é a promoção de uma cidade com a intenção de estimular certas atividades que possam vir a surgir no local. Geralmente o city marketing vem com a intenção de alterar algumas percepções externas da cidade com o objetivo de trazer turistas, investimento empresarial ou também atrair a migração interna dos próprios moradores (7).

Até o momento pode-se citar como exemplo disso o fim da reforma da Ponte Hercílio Luz (cartão postal da cidade), que agora está liberada para a passagem de automóveis, mas que no projeto seria utilizada para eventos e transporte público apenas; a roda gigante temporária localizada na Avenida Beira-Mar, que não obteve o sucesso esperado; e a futura grande obra: A Marina Beira-Mar Norte.

De acordo com o escritório responsável pelo projeto do Parque Urbano e Marina Beira Mar:

“O projeto do Parque Urbano e Marina na Beira Mar, será o ponto inicial para uma transformação urbana considerando a relação da cidade com sua orla, a conexão com a porção continental e centro histórico na Baía Sul. O convívio entre usos mistos: público e privado com praças, marina, comércios, serviços, feiras, restaurantes, escola de vela, área de lazer e estacionamento possibilitam a apropriação democrática dos espaços pela população da cidade e visitantes – um projeto pensado para as pessoas” (8).

Porém, o que se percebe é o fato de que a marina vai ser construída no m² mais caro da cidade, numa área já bastante problemática quanto às questões de mobilidade e à paisagem urbana e ambiental.

Além disso, a baía possui um fluxo de renovação das águas ruim que causa problemas de balneabilidade já no atual momento: de acordo com o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina ― IMA SC, em dois dos três pontos analisados na Praia da Beira Mar Norte ― no relatório 39 do dia 27 de maio de 2021 ― a água foi considerada imprópria para banho (9). Atrelado a isso está o fato de que o local onde a marina estará localizada hoje é um espaço utilizado por pescadores artesanais, barcos pequenos e passeios de ecoturismo. Logo, todos esses exercícios serão perdidos para dar lugar ao grande estacionamento ― com a maioria das vagas privativas ― de lanchas e barcos de luxo. Outro fator a ser levado em consideração é a contaminação das águas por óleo e componentes químicos utilizados nas embarcações (nas pinturas antiincrustantes dos cascos, por exemplo). Os barcos atracados em marinas e outras embarcações paradas nos ancoradouros são considerados preocupantes em termos de poluição ambiental, visto que a maioria é pintada com sistema antigo e convencional, ou seja, tintas de livre associação à base de Ots propiciando um aumento significativo destes compostos nas águas destes ambientes (10).

Além da marina estar localizada em uma área com alta especulação imobiliária, que só tende a aumentar com a construção do parque. Ela é uma forma de Florianópolis se reconectar com o mar, porém não da maneira apropriada, pois será algo para um público alvo distante da realidade da maior parte da cidade.

Então, para não repetir os erros do passado como os que foram apresentados no decorrer deste artigo, deve-se analisar e entender o que é urgente e enfrentar suas problemáticas mais recorrentes. Por exemplo, investir em soluções de longo prazo para a mobilidade e desenvolver projetos que englobam toda sua população. Outra alternativa seria revisar bons projetos que a prefeitura tem para investir na ilha e que ainda não foram executados, como é o caso do anel viário com corredor de transporte coletivo, que criaria uma pista única para o transporte público, assim como foi feito em Curitiba.

Diante do exposto, percebe-se que o projeto da marina poderá desequilibrar ainda mais o ambiente marinho na beira mar, uma vez que sua construção contará com uma pequena área de aterro. Atualmente, na Beira Mar busca-se a requalificação das águas para uso de lazer, por isso deve-se lidar de forma eficiente contra sua poluição e tratá-la, a tornando própria para banho novamente. Além disso, há outras possibilidades de investimentos na área, como executar um parque com foco em projetos sociais para englobar principalmente a população carente que mora nas proximidades, sem aumentar a gentrificação já existente e tirando proveito de suas águas. Deste modo, Florianópolis voltaria a lembrar-se de respeitar sua conexão com o mar, buscando o equilíbrio entre seu crescimento e a natureza, sem invadi-lo.

notas

1
História de Florianópolis. Prefeitura Municipal de Florianópolis <https://bit.ly/3rNY8yO>.

2
LOHN, Reinaldo Lindolfo. Pontes para o futuro: relação de poder e cultura urbana de Florianópolis, 1950 a 1970. Tese de doutorado. Porto Alegre, PPGH UFRGS, 2002, cap. 5.

3
Idem, ibidem.

4
EMMENDOERFER, Luana. A área central de Florianópolis e o despertar turístico. Revista Memória em Rede, v. 2, n. 7, Pelotas, jul./dez. 2012.

5
AQUINO, Tomaz Pereira de. Janelas ao mar. Intervenções em locais de memória. Monografia de conclusão de graduação. Florianópolis, UFSC, 2019.

6
DAMIÃO, Carlos. Quando a Ilha de Santa Catarina avançou para o continente próximo. ND Mais, Florianópolis, 16 fev. 2019 <https://bit.ly/3pIl3c9>.

7
MACEDO, Luiza Ferreira de. City Marketing: uma estratégia para a cidade de Porto Alegre. Monografia de conclusão de especialização. Porto Alegre, EA UFRGS, 2012, p. 33 <https://bit.ly/3EEVAXD>.

8
Projeto do Parque Urbano e Marina de Florianópolis. ARK7 Arquitetos, Santa Catarina, 2021 <https://bit.ly/308YkNM>.

9
INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE DE SANTA CATARINA. Relatório n. 39. Santa Catarina, Governo do Estado de Santa Catarina, 3 dez. 2021 <https://bit.ly/3DDJQ6c>.

10
JUNIOR, Luis Alfredo dos Reis Virginio. Os efeitos causados por tintas anti-incrustantes a base de compostos organoestânicos ao meio ambiente. Monografia de conclusão de graduação. Rio de Janeiro, Uezo, 2011 <https://bit.ly/3oDlPrF>.

sobre os autores

preâmbulo

O presente artigo faz parte de Preâmbulo, chamada aberta proposta pelo IABsp e portal Vitruvius como ação para alavancar a discussão em torno da 13ª edição da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, prevista para 2022. As colaborações para as revistas Arquitextos, Entrevista, Minha Cidade, Arquiteturismo, Resenhas Online e para a seção Rabiscos devem abordar o tema geral da bienal – a “Reconstrução” – e seus cinco eixos temáticos: democracia, corpos, memória, informação e ecologia. O conjunto de colaborações formará a Biblioteca Preâmbulo, a ser disponibilizada no portal Vitruvius. A equipe responsável pelo Preâmbulo é formada por Sabrina Fontenelle, Mariana Wilderom, Danilo Hideki e Karina Silva (IABsp); Abilio Guerra, Jennifer Cabral e Rafael Migliatti (portal Vitruvius).

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