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OLIVEIRA, Ana Rosa de. Gilles Clément e o jardim planetário. Arquitextos, São Paulo, ano 01, n. 002.03, Vitruvius, jul. 2000 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/01.002/997>.

Conceber o mundo como um jardim parece uma meta ambiciosa, porém promissora. A idéia é do francês Gilles Clément, paisagista, agrônomo, viajante e escritor. Ele próprio afirma que seu conceito de "jardim planetário" é difícil de explicar. Então, para tornar abordável sua visão, ele criou uma história que transformou no livro Thomas et le voyager, esquisse du jardin planétaire, publicado em 1997 pela editora francesa Albin Michel. Através deste livro ele converteu simultaneamente dois pólos de sua própria personalidade em duas pessoas distintas: o artista e o cientista, o sedentário e o nômade.

Thomas, o protagonista do livro, é um pintor e o outro personagem é um viajante. "Juntos, decidimos que o mundo é um pequeno jardim", escreve o viajante a Thomas. As viagens, segundo Clément, permitem compreender. Neste compreender, ele afirma que há "um aceitar e um tornar próprio o vivido, além de permitir olhar o próprio mundo a partir de um outro ponto de vista".

O viajante do livro percorre os lugares mais remotos do planeta, de Fingal, na Tasmânia ao deserto de Atacama, no norte do Chile, e Wanganui, na Nova Zelândia, entre outros. Os seus relatos são enviados a Thomas, que, juntamente com as experiências acumuladas no jardim da sua própria casa, tenta elaborar uma pintura que dê forma ao jardim planetário.

Mas, apesar de que ao longo da história o jardim planetário se torna cada vez mais definido, ele é apenas uma "pintura literária". No entanto, é na figura de curador da exposição Le jardin planétaire (inaugurada em Paris em setembro, e que se estendeu até o fim de janeiro de 2000) que Gilles Clément pôde dar corporeidade à sua idéia do jardim planetário.

Com ela Clément transformou em jardim o Grande Halle do emblemático parque La Villette, propondo um passeio "lúdico e pedagógico" através de distintas épocas, culturas e continentes. Para isso, ele se serviu de referências à ciência, à história, à arte, à poesia e, principalmente, à utopia, buscando realizar uma história da coexistência amiga ou hostil entre natureza e cultura, desde as suas origens e em todos os continentes - uma história não exaustiva de homens e plantas.

O jardim planetário de Clément não tem cercas ou limites, mas afinidades ecológicas. Ele propõe um continente único, associado à idéia de uma terra onde as regiões não mais seriam separadas pela geografia e sim pelos biomas que se sucederiam. Os residentes deste continente único seriam cidadãos-jardineiros, agindo com as melhores intenções em relação ao planeta. O cidadão-jardineiro planetário atuaria localmente e teria consciência do planeta; pensaria globalmente. Ou seja, participaria dos paradigmas do ecologismo.

O ecologismo, para Clément, é o único projeto verdadeiro para o século XXI. A exposição tem, portanto, o desejo secreto de "transformar os visitantes do Grande Halle em ecologistas e de estimulá-los como cidadãos do terceiro milênio, para começarem a agir COM a natureza e não CONTRA ela". O ecologismo passa primeiro por uma constatação e a seguir por uma atitude. "Fazemos menos besteiras quando buscamos compreender para depois agir", admite. Esta idéia norteia o itinerário da exposição, que foi dividida em três áreas temáticas, ou etapas. Começando por "observar e compreender", percorremos o Jardim do Conhecimento, para melhor "agir" no Jardim da Experiência, mas sem esquecer de dar um tempo para sonhar no Entorno do jardineiro.

Na verdade, o jardim planetário de Gilles Clément é uma espécie de carta com imagens. De maneira análoga ao viajante do seu livro, Clément fornece subsídos aos visitantes, na esperança de que estes, como Thomas, elaborem o seu próprio jardim planetário.

Um jardim "cujo limite seria a biosfera: o limite da vida; onde o seu território compreenderia a abundância do que é vivo, da terra, do ar e da água e que teria como centro as potencialidades insubmissas da vida e suas invenções; os sonhos do homem e suas utopias. Um e o outro a cada dia construindo juntos a imprevisível trajetória da evolução".

Gilles Clément defende o trabalho do técnico e do jardineiro como a única oportunidade para a sobrevivência daquele homem que estabelece uma relação sentimental e econômica com a Terra. Não se trata porém de uma chamada para "salvar o planeta", comumente tão ingênuas. Ele sabe que é nossa espécie o único que podemos aspirar a preservar e não sem muitas dificuldades; o planeta Terra independentemente do homem, se autorregula, se autoprotege, em suma funciona bem, numa total indiferença com relação a nossa sorte.

notas

1
Artigo originalmente publicado no Jornal da Paisagem (www.jornal da paisagem.com.br).

sobre Gilles Clément

Gilles Clément é engenheiro agrônomo com especialização em paisagismo pela Escola Superior da Paisagem de Versalhes. Ele começou seu trabalho fazendo projetos para grandes áreas verdes mas cedo optou pelo jardim privado.

O jardim, segundo ele, sintetiza constantes universais que superam as circunstâncias, as modas e, inclusive, a época. Seus materiais o incitam a falar de uma função biológica, de uma função vital. Tudo isso participa de um movimento de energias. Daí saiu a idéia do jardim em movimento, no qual o paisagista trabalha prestando uma pequena ajuda à natureza, selecionando e semeando centenas de espécies misturadas.

O seu jardim é o resultado do comportamento destas espécies, com seus florescimentos, frutificações, brotações ou mortes sucessivas. No fundo ele quer entatizar os processos naturais sem encerrá-los em uma forma pré-determinada. Para ele isso não é grave, seu propósito não é esse. Ele quer que a natureza participe da sua invenção. A ação do paisagista na concepção de Clément poderia estar associada à de uma enzima, um catalizador; ele potencializaria processos. Um trabalho instigante, que fica no limite entre a atividade artística e o deixar a natureza predominar.

Dessa maneira, Clément se opõe a representar os elementos da paisagem como elementos arquitetônicos, ou seja, privando-os da sua natureza dinâmica. Para ele, o paisagista tem uma oportunidade única de trabalhar com um material do qual desconhece a dimensão final. "Ao criar uma forma provida de uma incerteza, tem-se a possibilidade de transcrever um sonho. Criam-se imagens do que virá a acontecer dentro de um tempo determinado. Mas é possível que nunca chegue a ser da maneira pensada, porque na paisagem todas as certezas são descartadas".

Ele confessa também que os belos jardins o aborrecem: " são muito explícitos para que possamos descobrir o que quer que seja, com suas misturas de cores, seus maciços sob forma de estrelas… que horror". Em contraposição, nos deparamos com uma natureza que "produz emoções, medo, bem estar...". Recém-ganhador do Grand Prix du Paysage, do Ministério do Meio Ambiente da França, referiu-se ao prêmio declarando que "a paisagem é feita pelas vacas, toupeiras, agricultores, industriais e governos regionais do meio ambiente. Seria mais útil dar este prêmio aos agricultores, por exemplo, que têm boas idéias para o manejo." E exibindo a toupeira de pelúcia que trazia nos braços, concluiu: "o prêmio é meu e da toupeira, nós o ganhamos juntos".

Mas para bem ou mal, o jardim está na moda, ele costuma afirmar. Em uma época pouco alegre, Clément considera, no entanto, que o jardim engaja o indivíduo a uma visão feliz de futuro. Planta-se para já e para o amanhã: unem-se assim todas as escalas de tempo.

referências bibliográficas

CLÉMENT, Gilles. Les Libres Jardins de Gilles Clement. Coll. Les Grands Jardiniers. Editions du Chêne, 1997.

CLÉMENT, Gilles. Le Jardin Planétaire. Exposition Parc de la Villette, Paris, Editions Albin Michel, 1999 (à paraître).

CLÉMENT, Gilles. Les portes. Paris, Editions Sens et Tonka, 1998.

CLÉMENT, Gilles. Le Jardin planétaire. En collaboration avec Claude Eveno. Paris, Edition de l'Aube, 1997 (colloque de Châteauvallon).

CLÉMENT, Gilles. Les Libres Jardins de Gilles Clément. Paris, Editions du Chêne, 1997.

CLÉMENT, Gilles. Traité succinct de l'art volontaire. Paris, Editions Sens et Tonka, 1997.

CLÉMENT, Gilles. Une école buissonnière. Exposition Espace Electra, Paris, Editions F.Hazan, 1997.

CLÉMENT, Gilles. Thomas et le Voyageur, Esquisse du jardin planétaire. Paris, Editions Albin Michel, 1997.

CLÉMENT, Gilles. Le Jardin romantique de Georges Sand. En collaboration avec Christiane Sand. Paris, Editions Albin Michel, 1995.

CLÉMENT, Gilles. Contributions à l'étude du Jardin planétaire. En collaboration avec Michel Blazy. Valence, Editions Erba, 1995.

CLÉMENT, Gilles. Eloge de la Friche. Avec huit pointes sèches de François Béalu. Paris, Editions Lacourière et Frélaut, 1994.

CLÉMENT, Gilles. Le Jardin en mouvement de la Vallée au parc André-Citroën. Paris, Editions Sens et Tonka, 1994.

CLÉMENT, Gilles. La Vallée. Avec la collaboration de Hubert Tonka, Jean-Maris Sens et Jean-Paul Pigeat. Paris, Editions Pandora, 1991.

CLÉMENT, Gilles. Le Jardin en Mouvement. Paris, Editions Pandora, 1991.

sobre o autor

Ana Rosa de Oliveira é endenheira florestal e doutora em Arquitetura pela Universidade de Valladolid. É co-autora do livro Ecotecture-Ecological Architecture (Loft, Barcelona, 1999). Na França trabalhou com os paisagistas Daniel Laroche (Montpellier) e Guéric Pére (Lion). No Brasil, no Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais. Atualmente é professora e pesquisadora do PROPAR - Programa de Pós Graduação e Pesquisa em Arquitetura, UFRGS e bolsista recém-dr, CNPq.

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