“O sono é como uma outra casa que poderíamos ter e onde, deixando a nossa, iríamos dormir”.
Marcel Proust
A habitação, normalmente reconhecida como local de moradia (Ethos), significa permanência, uma referência de onde se vai e para onde se volta, um lugar vulgarmente visto como onde se pode exercer a liberdade individual de construir rotinas, hábitos. Então, ademais da abstração de um ambiente humanamente percebido, concebido e apropriado (1), a habitação, na condição de casa, carrega uma dimensão simbólica associada à ideia de refúgio e de posse, que remete ao homem a sensação de extensão de si próprio (2).
Entre a técnica e a estética, o tempo da natureza atua de forma preponderante na definição compositiva desses espaços, cuja variedade abrange iglus e tendas, como também na definição de jeitos de ser e de pensar do habitante, portanto habitar implica uma moralidade. Ele modela fisionomias de lugares e de gentes. Para além desse tempo de temperaturas visíveis na caracterização da paisagem e da pele (3), há aquele que advém da percepção do sentido de mudança. Esse tipo de tempo carrega um percurso cultural com capacidade de mostrar que a espacialidade da arquitetura absorve diversos arranjos motivados por inúmeras razões, entre elas, ousadia e ideologia (4), como mostram a Casa da Cascata, a Casa das Canoas, a Casa de Vidro e a Casa Guardiola (5). Para alguns, a ideia desses espaços vem antes deles mesmos, para outros, o próprio espaço inaugura sua ideia. De qualquer forma, ele “age sobre nós” (6).
Contudo, aprender a lidar com o tempo natural e o tempo histórico, que caracterizam a personalidade social (7), pode atenuar a complexidade do processo de compreensão sobre formas de habitação e de habitar, mas os interstícios entre desejo, necessidade e possibilidade guardam um mundo surpreendente de apropriações humanas do espaço, sugerindo outras compreensões do termo (8), assim como nos mostra Proust ao afirmar que “o sono é como uma outra casa que poderíamos ter, e onde, deixando a nossa, iríamos dormir”.
Quando o filósofo apresenta o sono como uma casa, diz-nos que podemos habitá-lo, que de alguma forma o estado de aparente desconexão entre corpo e espaço proposto pelo desligamento da consciência nos introduz uma outra experiência espacial: uma outra casa que poderíamos ter. A casa, essa expressão do abrigo primitivo sobre a qual (e a partir da qual) se inscrevem as marcas expressivas de nossa individualidade, se desmaterializa por essa construção proustiana em sua unidade mínima: a casa como espaço de acolhimento do sono, o sono como um outro habitar.
Este artigo foi construído rumo ao sentido desse entendimento. Tem-se como agenciamento a reflexão acerca de uma das necessidades básicas, fisiológicas e universais, do corpo humano, abordado de uma perspectiva rizomática, e portanto não-hierárquica, não universal e não-identitária (9).
“É preciso fazer o múltiplo, não acrescentando sempre uma dimensão superior, mas, ao contrário, da maneira simples, com força de sobriedade, no nível das dimensões de que se dispõe, sempre n-1 (é somente assim que o uno faz parte do múltiplo, estando sempre subtraído dele). Subtrair o único da multiplicidade a ser constituída; escrever a n-1. Um tal sistema poderia ser chamado de rizoma” (10).
Nesse sentido, não se trata aqui de fundar uma genealogia do abrigo como lugar do sono, muito menos determinar uma prevalência do ato de dormir como determinante do habitar. Livros e filmes foram tomados como referência para enquadrar essa argumentação, mas, sobretudo, vivências urbanas que nos permitem perceber, na própria dinâmica da cidade, conteúdos elucidativos para pensar a ideia de habitação, hábito e habitante, dando margem para aproximar turista, desabrigado, peregrino, estudante, defunto, feto e o próprio eu como habitantes, pelo fato de todos eles, de alguma maneira, dormirem em algum lugar.
Intersecções
Na perspectiva da ideia de dormir como uma das formas do habitar, conseguimos percorrer algumas linhas dessa construção:
a. Sonho: “Minha casa nasceu dos sonhos que tenho, uns já no sono, outros antes de pegar no sono” (11). Em A Origem (12), uma estudante de arquitetura é contratada como propositora de espaços que serão inseridos em sonhos compartilhados. No filme de Christopher Nolan, um ladrão, intencionando implantar uma memória na sua vítima, penetra o sonho e cria um palimpsesto em que há sonhos dentro de sonhos. O dormir, nessa condição, permite experimentar, dentro dos limites de certa lógica, espacialidades que suplantam nossas experiências espaciais materiais, mas que acessam um acervo sensório, experiencial. Numa das cenas do filme, chove num sonho, porque seu dono está com vontade de ir ao banheiro. O sonho ressignifica essa experiência sensória para proteger o sono profundo. A incapacidade de filtrar esses estímulos estabelece o lugar dos insones, em estado de vigília permanente. No filme de Nolan, morrer no sonho implica acordar. Borges, em seu Livro dos sonhos, coleta um sonho de H. Garro que traça uma linha tênue, porém significativa, entre sonhar e morrer.
“Essa gente crê nos sonhos. ‘No instante em que dormes’, explicaram-me, ‘conforme tenham sido teus atos durante o dia, irás ao céu ou ao inferno’. Se alguém argumentasse: ‘Nunca vi partir um homem adormecido; de acordo com minha experiência, permanecem deitados até que os despertem’, responderiam: ‘O afã de não acreditar em nada te leva a esquecer tuas próprias noites (quem não terá conhecido sonhos agradáveis e sonhos aterrorizantes?) e a confundir o sono com a morte. Cada um é testemunha de que há outra vida para o sonhador. Para os mortos é diferente o testemunho: eles permanecem, convertendo-se em pó’” (13).
b. Cemitério: “Descanse em Paz” – mensagem de conforto à dor do luto associada à religião. O cemitério, lugar do “sono eterno”, foi um dos elementos chave da sedentarização, estabelecendo rituais próprios e estimulando explicações místicas para a morte. Em boa parte dessas crenças – especialmente naquelas em que a perenidade se constitui como questão central – a morte significaria uma passagem, um estado de sono para que se acordasse em outra realidade. Desta questão decorre a importância dada ao cemitério como lugar deste repouso – o habitat da morte. Em Narradores de Javé (14), frente à ameaça da inundação de um núcleo habitado de tímidas proporções para a construção de uma barragem, a população entra em alvoroço pelo desalojamento e o vislumbre do fim de um arranjo espacial e afetivo. Em certo momento, um personagem exclama: “Os nossos mortos vão viver debaixo d’água? Não pode!”
Pesquisando sobre os espaços dos mortos, Renato Cymbalista (15) atenta para a relação entre estes e os vivos. Construir o cemitério ou definir as características estéticas dos túmulos são atos de escolha que se vinculam ao interesse por distinguir mortos e vivos.
“A concentração da interface entre vivos e mortos em um só local engendrou outras maneiras de diferenciação entre os vários grupos da sociedade, entrando em cena a arquitetura, mobilizada em todo o seu potencial no sentido de atribuir aos túmulos uma posição específica na sociedade” (16).
c. Corpo: A imagem do útero abrigando o feto remete à ideia de casa como invólucro (17). Em entrevista ao Portal Vitruvius publicada em 2008, Igor Guatelli levanta questões desconcertantes acerca do útero como lugar de abrigo, do habitar.
“Para morarmos, precisamos sempre de um abrigo? Que abrigo seria esse? Uma proteção, um ‘útero’? Repare, por que esses conceitos [casa, moradia] são femininos? Por serem tomados como femininos [problema do gênero e suas representações históricas] deveriam sempre sugerir proteção e provimento? Poderíamos habitar o inabitável? Aquilo que, em um primeiro momento, parece ser quase nada, ou hostil, mas que se torna habitável devido à nossa ação e ao desejo de habitar; que, de alguma maneira, ainda não estaria dado, não estaria pronto; a própria cidade, por exemplo. Ou mesmo, em sendo ‘útero’, que ‘útero’ seria esse? Talvez um ‘invólucro’? Uma cápsula para apenas o mínimo e, a partir daí, habitar o máximo, ou seja, a cidade” (18).
O ventre abobadado da gestação – a imagem do abrigar acolhedor – é subvertido por Peter Greenway em Barriga do Arquiteto (19), no qual o cineasta joga com imagens de ventres em apodrecimento, hostis, dolorosos. A obra de Boullé é apresentada no filme todo o tempo, com alusões ao seu Cenotáfio de Newton, obra da arquitetura ideal neoclássica, não construída e pensada como uma imensa abóbada vazia, duplamente vazia, já que o cenotáfio é, em si, um lugar mortuário vazio de corpo. Um útero oco.
As alusões ao útero na arquitetura se fazem presentes em tempos e lugares dos mais díspares. Na arquitetura dos templos hindus, a garbhagriha, uma espécie de câmara escura nos núcleos dos templos onde fica o altar, pode ser traduzida por “câmara em forma de útero”.
Habitamos também o nosso próprio corpo. Nem sempre, entretanto, somos por ele acolhidos. No filme A pele que habito (20), Vicente tem seu sexo e nome trocados, passando a ser chamado de Vera, que viveria numa pele especialmente construída para ela. A partir desse outro invólucro, ele escreve nas paredes brancas de seu quarto-prisão, tentando afirmar sua vivacidade/individualidade: “Respiro. Sei que respiro”.
d. Saco-cama: Para o peregrino que caminha vários quilômetros por vários dias carregando o considerado essencial, um saco-cama pode ser a sua casa.
e. Albergue: No mundo dos viajantes, encontram-se os albergues, onde se instalam dispostos a compartilhar quartos com estranhos atraídos pela compensação econômica, tendo que abdicar da privacidade, adaptar hábitos e expor sua intimidade, seu sono e seus sinais sonoros, assim como participar dos sinais dos outros.
f. Poltrona de avião: Muitos viajantes normalmente buscam se entreter durante o hiato entre o ponto de partida e o ponto de destino. Dormir está entre essas distrações, o que, em longos percursos, parece ser inevitável. Para favorecer o descanso, em alguns tipos de aviões comerciais, são disponibilizados travesseiros e mantas aos passageiros, os quais comumente se esforçam para adequar o habitual posicionamento do sono ao espaço disponível. Eles contam com o encosto inclinável da poltrona, que tem suas extremidades superiores levemente curvas para beneficiar o repouso da cabeça e o conforto do pescoço (21). Na falta desse artifício ergonômico, o viajante, não raro, se apropria de qualquer superfície que suporte o relaxamento de seu corpo para além do acolchoado do assento, seja a de uma janela de vidro ou a de um ombro de desconhecido.
g. Aeroporto: No filme O terminal (22), Viktor Navorski é detido no aeroporto de Nova York onde desembarca e tem seu visto cancelado devido ao golpe de estado em sua terra natal. Impedido de entrar na cidade americana e de deixá-la pela invalidez do documento, o personagem lá permanece por nove meses, adaptando seus hábitos e necessidades às dinâmicas de um espaço essencialmente voltado para aqueles que passam...
h. Escola: As estações marcam a história dos movimentos sociais, tais como a Primavera Francesa, de 1968, e Outono Árabe, de 2010. No filme O intenso agora (23), seu realizador João Salles narra revoluções culturais ocorridas em contextos de ditaduras. Entre elas, a de sua mãe, quando conheceu a China, e a da França, iniciada por estudantes e finalizada por sindicalistas. Em conversa com Daniel Cohn-Bendit, então estudante da Universidade Paris-Sorbonne e representante da Revolução de 1968, o filósofo Jean-Paul Sartre desqualifica o movimento dizendo que “queriam quebrar tudo sem saber o que botar no lugar”. O estudante responde que “a força do Movimento se apoia na espontaneidade, que permite a desordem. Dá corpo a uma experiência, [...] a uma alternativa, a algo que pode existir”. Para Salles, “a ideia de um movimento sem líderes era bonita”. Meses antes do lançamento do filme, ocorreu no Brasil a Primavera Secundarista, que consistiu na ocupação estudantil de mais de mil escolas brasileiras em protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição 241, relativa à reforma do ensino. Os ocupantes “fizeram novos usos e fluxos dos espaços das escolas, de seus equipamentos, de sua territorialidade. [...] Nada aparece como ‘já pronto’, ‘já feito’, ‘já decidido’, o que, em cada escola, exigiu a recalibragem de suas práticas internas e o reconhecimento das potencialidades dos espaços e suas reciprocidades, pelos próprios alunos”, os quais efetivaram a ação com a permanência ininterrupta de seus corpos em um lugar, portanto, através também de seus sonos (24).
i. Rua, cidade, país: Sem teto, morador de rua, desabrigado. Por várias razões, não se mora numa casa. Entre elas, situam-se a especulação imobiliária, os abalos sísmicos e as operações de guerra.
Essas últimas, juntamente com a fome, a miséria e a esperança, têm criado milhões de refugiados em busca de uma vida melhor. Muitos deles não têm para onde ir, mas têm que ir embora. Com seus corpos, deixam seus lugares, mas dormem em algum lugar (25).
No início de novembro de 2018, o Papa Francisco doou à arquidiocese do Rio de Janeiro uma estátua de Jesus dormindo num banco de praça. Um Jesus sem teto. Em meio ao debate político em que se propõe a criminalização dos movimentos sociais no Brasil, entre os quais estão os movimentos de luta pela moradia, o ato se reveste de uma inconteste importância simbólica. Dormir num banco de praça é a expressão máxima da vulnerabilidade social. É também ato considerado crime em boa parte dos Estados modernos. Nesse ato, Jesus, refugiado, seria também um “sem teto”.
George Orwell, na década de 1920, já apresentava os horrores a que estavam submetidos os desabrigados de Londres e Paris em Na pior em Paris e Londres. Na obra, além de mostrar a criminalização da mendicância e do “morar na rua”, Orwell nos apresenta as soluções encontradas por aqueles que não tinham outra opção, entre as quais as “camas caixão” ou a “corda de dormir”, ambas, envolvendo o dispêndio de alguns centavos, mostravam a dificuldade no arranjo de um “habitar/dormir”. O autor fecha a obra com a seguinte conclusão:
“Nunca mais vou pensar que todos os vagabundos são patifes bêbados, nem esperar que um mendigo se mostre agradecido quando eu lhe der uma esmola, nem ficar surpreso se homens desempregados carecem de energia, nem contribuir para o Exército da Salvação, nem empenhar minhas roupas, nem recusar um folheto de propaganda, nem me deleitar com uma refeição em um restaurante chique. Já é um começo” (26).
Inconclusões
“– A vida, senhor Visconde, é um pisca-pisca. A gente nasce, isto é, começa a piscar. Quem para de piscar chegou ao fim, morreu. Piscar é abrir e fechar os olhos – viver é isso. É um dorme e acorda, dorme e acorda, até que dorme e não acorda mais [...]. A vida das gentes neste mundo, senhor Sabugo, é isso. Um rosário de piscados. Cada pisco é um dia. Pisca e mama, pisca e brinca, pisca e estuda, pisca e ama, pisca e cria filhos, pisca e geme os reumatismos, e por fim pisca pela última vez e morre.
– E depois que morre? Perguntou o Visconde.
– Depois que morre, vira hipótese. É ou não é?” (27).
Um trailer, um barco, um tecido... Como nos mostra o tempo sociocultural, a habitação pode ter inúmeras formas além da arquitetônica. Apesar de tamanha flexibilidade, todas elas compartilham de aspectos significantes, tais como abrigo, privacidade, posse, liberdade. Mas se fizermos um exercício de síntese, assim como fez Le Corbusier com seus edifícios e aforismas (28), Coco Chanel com o vestuário feminino (29) e Chavela Vargas com a música mexicana (30), o que restaria ao habitar?
Pensar o que seria supérfluo para identificar o que seria essencial talvez seja um esforço falido diante de todas as conquistas da noção de relatividade e de seus desdobramentos nas mais diversas áreas do conhecimento. Entretanto, se nos detivermos a refletir sobre determinadas ações habituais que praticamos fora de casa, como aquelas vinculadas ao trabalho (31), ao lazer e à alimentação, logo a ele indissociaremos o ato de repousar.
Por outro lado, quando interseccionamos situações adversas – sonho, cemitério, corpo, pele, saco-cama, albergue, poltrona de avião, escola – libertamos o ato de dormir da habitação-casa e atentamos para o tempo do sono: aquilo que efetivamente define a permanência, garantindo a apropriação de um lugar, mesmo que temporariamente (32).
Diante dessa condição de independência e força do habitante, revisamos o sentido de necessidade humana e o suporte que damos a ela. Como função básica do corpo, precisamos dormir, mas do que precisamos para poder dormir? De saúde, conforto, cultura, crença e dignidade? Vários podem ser os fundamentos das respostas, além do hábito, como o do jeito de ninar o bebê e do posicionamento dos membros sobre a cama ou da condição do ambiente (temperatura, som, luz, mobiliário...).
Contudo, o sono é um tempo do inconsciente que remete à autonomia ao corpo. Podemos dormir menos ou mais, agora ou depois, mas não dormir não é uma escolha. Ao contrário dessa sua propriedade inexorável, o seu hábito é adaptável, desde quando saímos do útero até entrarmos no(s) cemitério(s), seja esse uma caixa, seja o vento. O sono, nesse sentido, torna-nos rizomáticos (33). Através dele, inevitavelmente apropriamos espaços, fazemos algo existir, criamos outras ordens, mesmo constrangidos pelas circunstâncias – dormimos numa cama, num chão, numa poltrona de avião, sob a luz do sol e da lua...
Essa autonomia, que pode denotar liberdade gestual, na verdade remete vulnerabilidade ao homem por consistir na suspensão de sua consciência. Durante o sono, estamos indefesos, expostos ao risco do perigo e do sofrimento, que pode ser uma violência humana, uma brutalidade animal ou intempérica – situação remota que criou o sentido de proteção e historicamente fortaleceu a ideia da necessidade do invólucro, de cobrir-se, envolver-se, refugiar-se. Alguns se refugiam em suas casas; outros, em ruas; e outros, em outros países. De uma maneira ou de outra, o corpo os acompanha e, com ele, seus sonos...
Nesse gerúndio inconsciente, nessa entrega involuntária do corpo ao espaço, agenciamos sentidos do habitar. Somos capazes de deixar nossas casas, mas incapazes de deixar de dormir. Dormindo, permanecemos, habitamos. E a capacidade de habitar outras habitações para além das casas dos arquitetos, da prefeitura e dos mutirões, talvez configure uma das maiores ousadias humanas.
notas
1
Ver: Mestrado - Área de Concentração: Dinâmicas do Espaço Habitado. Universidade Federal de Alagoas <https://bit.ly/2ISSdB9>.
2
BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo, Martins Fontes, 1993.
3
SALGADO, Sebastião. Terra. São Paulo, Companhia das Letras, 1997.
4
Segundo o professor titular Geraldo Magela, da Universidade Federal de Alagoas, recentemente aposentado, tal processo ousado e ideológico se fundamenta basicamente na evolução tecnológica, cujo espectro iria da caverna à estação orbital como paradigmas extremos de formas de habitação. Aproveitamos a referência para agradecê-lo, assim como aos professores João Areosa (Instituto Politécnico de Setúbal, Portugal) e Walter Lima (Ufal), pela gentileza em revisar este artigo.
5
As ações humanas no tempo e no espaço repercutem na materialidade da moradia, como também significam mudanças ideológicas na maneira de morar, por exemplo: abandono das esquadrias porta-janela/relação fronteiriça entre público e privado; surgimento do corredor separando recintos/noção de moral, desaparecimento do quarto de costura e introdução do espelho no dormitório, antes restrito ao suporte da barbearia e da decoração de halls/reconsideração social da mulher (essa última associação se baseia na conferência da professora Margarida Acciaiuoli, da Universidade Nova de Lisboa, acerca da história da mulher na história da habitação em Portugal, ocorrida no auditório da Biblioteca Nacional de Portugal em 08 de março de 2018).
6
ZEVI, Bruno. Saber ver a arquitetura. São Paulo, Martins Fontes, 1996.
7
Consciência humana de se posicionar frente à dinâmica de certo ambiente e modelá-lo com características inerentes à sua imagem. RYKWET, Joseph. A ideia de cidade: antropologia e forma urbana em Roma, Itália e no mundo antigo. São Paulo, Perspectiva, 2006, p. 241.
8
A palavra e sua designação são um produto cultural. Se seus significados mudam, muda-se também a maneira de entendê-la. DERRIDA, Jacques. Gramatologia. São Paulo, Perspectiva, 1973.
9
“Essa abordagem está relacionada com uma nova forma de pensar criada no âmbito da ‘revolução cultural’ dos anos 1960 do século 20. Trata-se do pensamento denominado rizomático, o qual constitui um novo Plano de Imanência, novos conceitos e nova lógica (da diferença e da multiplicidade). Trata-se de um acontecimento filosófico, uma criação, um devir-outro da existência, configurando, assim, um novo lugar onde o pensamento se orienta para pensar e tem no conceito de rizoma sua referência maior”. MAGNAVITA, Pasqualino Romano. Gestologia: breve ensaio sobre uma diferente teoria do gesto. In BRITTO, Fabiana Dutra; JACQUES, Paola Berenstein (Org.). Corpocidade: gestos urbanos. Salvador, Edufba, 2017, p. 208-209.
10
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs. Vol. I. São Paulo, Editora 34, 2004, p. 15.
11
Depoimento de João Gabriel dos Santos acerca da “Casa da Flor”, reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan em 2016, por ele construída entre o período de 1912 e 1985 no Rio de Janeiro, citado por Ariano Suassuna durante sua aula magna intitulada “Raízes populares da Cultura Brasileira”, proferida no Theatro Municipal de Paulínia, em 2009. Ariano Suassuna. Raízes Populares da Cultura Brasileira. Youtube <www.youtu.be/M3MSqbEr04>.
12
A Origem. Direção Christopher Nolan. Estados Unidos, Warner Bros, 2010. 1 DVD (148 min.), son., color.
13
BORGES, Jorge Luis. Livro dos sonhos. São Paulo, Difel, 1986, p. 173.
14
Narradores de Javé. Direção Eliane Caffé. Brasil, Videofilmes, 2003. 1 DVD (100 min.), son., color.
15
CYMBALISTA, Renato. Cidades dos vivos: arquitetura e atitudes perante a morte nos cemitérios do Estado de São Paulo. São Paulo, Annablume/Fapesp, 2002.
16
Idem, ibidem, p. 18.
17
HONAISER, Fernando. Arquitetura sensorial. Trabalho de Final de Graduação. Maceió, FAU UFAU, 2000.
18
EICHEMBERG, André Teruya. Igor Guatelli. Entrevista, São Paulo, ano 09, n. 035.01, Vitruvius, jul. 2008 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/09.035/3287>.
19
Barriga de arquiteto. Direção Peter Greenaway. Inglaterra/Itália, Metro Goldwyn Mayer, 1987. 1 DVD, 118 min., son., color.
20
A pele que habito. Direção Pedro Almodóvar. Espanha, Paris Filmes, 2011. 1 DVD, 117 min, son., color.
21
Segundo Alain de Botton, a poltrona de avião encantava o arquiteto Le Corbusier por combinar multiplicidade funcional e minimalismo formal, permitindo o usuário acessar a refeição, a revista a música, a tela e o sono, sem precisar sair do lugar. Alain de Botton. A arquitetura da felicidade. Rio de Janeiro, Rocco, 2007.
22
O terminal. Direção Steven Spielberg. Estados Unidos, DreamWorks SKG, 2004. 1 DVD, 128 min., son., color.
23
No intenso agora. Direção João Moreira Salles. Brasil, VideoFilmes, 2017. 1 DVD, 117 min., son., color.
24
Além dessa “ocupação-protesto”, as escolas têm sido comumente utilizadas como alojamento de desabrigados vítimas de calamidades públicas e comunidades acadêmicas em reuniões científicas. PALLAMIM, Vera. Performatividade e visibilidade. In BRITTO, Fabiana Dutra; JACQUES, Paola Berenstein (Org.). Op. cit., p. 8-9.
25
Human flow. Direção Weiwei. Alemanha, AC Films, 2017. 140 min., son., color.
26
ORWELL, George. Literatura e política jornalismo em tempo de guerra. Rio de Janeiro, Zahar, 2016, p. 245.
27
LOBATO, Monteiro (1936). Memórias de Emília. Apud MAGALHÃES, Ana Cláudia. Igrejas, conventos, cemıtérıos: o lugar dos mortos confıgurando a paısagem urbana e arquıtetônıca da cıdade colonıal Marechal Deodoro, Alagoas. Tese de doutorado. Maceió, FAU Ufal, 2018, p. 6.
28
SILVA, Ana Carolina da. A casa do Homem. A máquina de habitar na arquitetura de Le Corbusier. Dissertação de mestrado. Porto, FAUP, 2014.
29
Coco antes de Chanel. Direção Anne Fontaine. França, Warner Bros, 2009. 1 DVD, 105 min., son., color.
30
Chavela. Direção Kyi Daresha/ Catherine Gund. México/Espanha, Music Box Films, 2017. 1 DVD, 93 min., son., color.
31
O trabalho humano é capaz de criar fortes relações identitárias com o espaço, sobretudo, devido ao valor dado ao tempo de serviço nele executado. É o caso de jovens e crianças angolanas que, durante o século 20, foram trabalhar nas lavouras situadas na Ilha de São Tomé e Príncipe, e que, mesmo se considerando são-tomenses, têm sido socialmente marginalizados desde a independência política da Ilha (1974), por não terem ali nascido. Serviçais da memória à identidade. Direção Nilton Medeiros. São Tomé e Príncipe, 2017. 52 min., son., color.
32
O termo habitar agrega a dinâmica de morar, mas também o de nomadizar, qualificando experiências de “turistas, imigrantes, refugiados, exilados, trabalhadores estrangeiros e outros grupos e indivíduos móveis” que promovem a desterritorialização e trocas culturais. SILVANO, Filomena. Antropologia do espaço. Lisboa, Documenta, 2017, p. 109.
33
“O rizoma se refere a um mapa que deve ser produzido, construído, sempre desmontável, conectável, reversível, modificável, com múltiplas entradas e saídas, com suas linhas de fuga”. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Op. cit., p. 32-33.
sobre as autoras
Roseline Vanessa Santos Oliveira é professora doutora da FAU Ufal e de seu Programa de Pós-Graduação desde 2008. Realizou pós-doutorado junto à Universidade de Évora (2018) e compartilha a liderança do grupo de pesquisa Estudos da Paisagem com Maria Angélica da Silva, o qual adota a empiria e a iconografia histórica como principais referências de investigações acerca do patrimônio paisagístico, com ênfase em história urbanística e design social.
Juliana Michaello Macêdo Dias é professora doutora da FAU Ufal desde 2014 e do seu Programa de Pós-Graduação. Atua como líder do grupo de pesquisa Estudos Nordestaças, que desenvolve pesquisas sobre temas ligados ao patrimônio cultural, às identidades e territórios, à relação entre cinema e arquitetura e às abordagens teórico-metodológicas contemporâneas do campo da cultura.