Em 1959, houve no Brasil um Congresso Internacional de Críticos de Arte (1).
Brasília estava em plena construção, inauguração prevista para o ano seguinte. O Alvorada e o Hotel Brasília Palace já estavam prontos, e JK fez uma coisa genial: despachou os membros do Congresso para o canteiro de obras que era então Brasília! Estavam presentes figuras importantes, como Saarinen, Maldonado e Otl Aicher (da Escola de Ulm), Charlotte Perriand, Jean Prouvé, e Bruno Zevi, entre outros – e eu, com pouco mais de vinte anos…
Zevi implicava solenemente com a arquitetura de Oscar, e quando visitou a obra da Câmara dos Deputados (ou do Senado, não me lembro), deu um sonoro berro que ficou ecoando um tempão dentro do recinto, como demonstração sonora de que ali estava tudo errado, nada daria certo naquela aventura.
Passam-se quase trinta anos, governo José Aparecido de Oliveira em Brasília. Haveria em Roma um evento “Roma-Brasília”, cuja origem confesso desconhecer. E fomos a Roma, dois professores da UnB e eu, na época assessora da Secretaria de Obras, pilotada por Carlos Magalhães.
Qual não foi minha surpresa ao ouvir, do mesmo Bruno Zevi de 1959, uma fala violenta contra Brasília. Os professores não se manifestaram, mas eu não consegui deixar passar em branco. Subi ao palco e pedi licença para dizer uma palavra: “O senhor não sabe, mas eu também estava presente naquele Congresso de 1959... Desde então, as crianças cresceram, as árvores cresceram, e quem mora em Brasília, gosta de Brasília. Vou recorrer a um patrício seu para lhe responder, Galileo Galilei – E pur si muove...”
Ele foi muito elegante, ao sair me localizou na plateia para me cumprimentar.
Anos 1980
Quando José Aparecido de Oliveira assumiu o Governo do Distrito Federal, nos anos 1980, e convocou a presença de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, vigorava na Faculdade de Arquitetura da UnB o movimento pós-moderno. Logo que assumi o posto de assessora do Secretário de Obras, Carlos Magalhães da Silveira, fui convidada a falar na UnB. Meus companheiros na Secretaria perguntaram: “E você vai?!” Respondi que sim.
Só que, no decorrer do encontro, fui percebendo que não era propriamente eu quem estava ali, servia apenas como uma espécie de “para-raios” recebendo todas as invejas e mais descargas negativas em relação a Brasília.
Fechei o encontro com um comentário: “Meu sonho era ter a voz da Gal Costa. E eu não tenho a voz da Gal. Mas eu não quebro o disco da Gal, eu ouço o disco da Gal...” No dia seguinte, fui recebida na Secretaria com deliciosos chocolates!
nota
NE – Sobre o congresso, ver: LOBO, Maria da Silveira; SEGRE, Roberto (Orgs.). Congresso internacional extraordinário de críticos de arte. Cidade nova: síntese das artes. Rio de Janeiro, Docomomo Rio. FAU UFRJ, 2009.
sobre a autora
Maria Elisa Costa é arquiteta (FNA UB, 1958). Foi arquiteta da Divisão de Urbanismo do Departamento de Urbanismo e Arquitetura da Novacap (1959-1964), arquiteta no escritório de B.H. Zehrfuss (Paris, 1964-1968), assessora do Secretário de Viação e Obras do Governo do Distrito Federal (1986-1987), presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan (2003-2004). É diretora da Associação Casa de Lucio Costa.