É lamentável que não tenha feito escola, talvez porque seu pensamento e sua prática fossem pouco compreendidos nos anos 1990, quando começou a se ampliar o debate ambiental entre nós.
Designer formada pela Faap em 1975, Elvira desenhou móveis para conjunto habitacional, junto com os moradores. Fez muitas esculturas de madeira, utilizando sobras de marcenaria. Mas seu trabalho mais importante foi a construção de brinquedos com restos de materiais da cidade.
Ela passou a desenhar brinquedos públicos com esses materiais, privilegiando a participação dos usuários, unindo, então, o olhar social e o ambiental. Seus brinquedos públicos utilizavam eucaliptos tratados, que ela armava em jogos diagonais. Eram pintados com faixas horizontais vermelhas, amarelas e azuis e, em alguns casos, eram finalizados como carrancas ou figuras totêmicas, que ela pesquisou na cultura popular brasileira.
Elvira investigou a sério as potencialidades do corpo, as características do brincar e propôs o que chamou de “esculturas lúdicas” em que os corpos são desafiados, os movimentos estão longe de ser mecânicos como nos balanços e escorregas tradicionais, em que tudo se passa à moda fordista, gestos repetitivos e mecânicos.
No começo dos anos 1990, durante o governo de Luísa Erundina na prefeitura de São Paulo, a designer teve acesso a vários depósitos de materiais de órgãos municipais e passou a trabalhar com hastes de ferro de iluminação pública. Essas hastes contracenavam com os eucaliptos, possibilitando desenhos com estruturas mais delgadas e ascendentes.
Há muito que dizer sobre esta designer extraordinária que morreu em 2001, aos 56 anos. Quem quiser conhecer melhor seu trabalho pode ler seu esplêndido livro, Arte lúdica, lançado pela Edusp em 1997, com fotos e desenhos lindíssimos, além de suas reflexões muito bem fundamentadas.
Tive tremenda sorte de conseguir expor seu trabalho em 2006. Samuel Moreira, companheiro de Elvira, a meu pedido, refez dois de seus brinquedos, apresentados em exposição em Berlim. Foi emocionante ver aquelas esculturas lúdicas sendo utilizadas por adultos e crianças, inclusive o prefeito de Berlim.
notas
NE1 – terceiro texto da série “Terça-feira das mulheres”, publicado pela autora em sua página Facebook.
NE2 – Sobre os brinquedos de Elvira de Almeida, ver: MELLO, Ana Luzia Ribeiro. O brinquedo do parque: um conceito lúdico como arte do reaproveitamento. Orientadora Clice de T. Sanjar Mazzilli. Dissertação de mestrado. São Paulo, IA Unesp, 2008.
sobre a autora
Ethel Leon é jornalista, pesquisadora, professora na área de história do design brasileiro e autora dos livros Memórias do design brasileiro, IAC – Primeira Escola de Design do Brasil, Michel Arnoult, design e utopia – móveis em série para todos e Design brasileiro – quem fez, quem faz.