Pode-se dizer que coordenar o crescimento das cidades é um dos grandes desafios do século. Atualmente, mais de 80% dos brasileiros vivem em áreas urbanas e as projeções até 2050 indicam que essa porcentagem possa chegar aos 90%, ou seja, as aglomerações urbanas receberão mais 63 milhões de pessoas nos próximos 35 anos (1).
Segundo o IBGE, São Paulo possui 11 milhões de habitantes, sendo uma metrópole altamente espraiada e excludente. A grande contradição em seu âmago está associada ao fato das políticas públicas produzirem habitações sociais de maneira insuficiente e distantes, segregando as populações carentes e vetorizando ainda mais o espraiamento urbano, enquanto seu centro possui inúmeros imóveis vazios e que não cumprem sua função social, sendo que em SP há um déficit habitacional (2) de 670 mil domicílios.
Da constatação de que o Estado é falho em garantir o direito básico e universal de moradia, se contradizendo no que diz respeito ao Estatuto da Cidade ao mesmo tempo em que o mesmo é paternalista e protege brutalmente a propriedade privada, é que surge a proposta no centro da cidade de São Paulo, palco de um ciclo permanente de luta, ocupações, opressão, reintegrações de posse e baixa densidade populacional.
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Projeto "À Margem", implantação. Camila Ghendov e Vinicius Nakama, FAU PUC-Campinas
2º lugar
A proposta estabelece um perímetro urbano dentro do centro, tendo seus limites em centralidades importantes, como a estação da Luz ao norte, Praça da República à oeste, mosteiro de São Bento à leste e Praça da Sé ao sul, identificando na área 27 ocupações existentes, caracterizando dois tipos de apropriação: moradia e cultura.
O plano identifica mais 26 imóveis vazios dentro do território estabelecido e propõe ocupações que criam um eixo estruturador com usos de contracultura (3) ou híbridos com moradia, tendo uma postura bottom-up (4) independente do Estado num primeiro momento, visando criar uma rede de conexões baseado na multiplicidade e horizontalidade, sem hierarquia ou autoridade, fortalecendo o movimento de luta por moradia e abrindo de forma democrática esses espaços para toda a sociedade.
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Projeto "À margem", volumetria dos edifícios propostos. Camila Ghendov, Mariana Simões da Costa e Vinicius Nakama, FAU Mackenzie
1º lugar
Numa estimativa, para além dos imóveis atualmente ocupados, a proposta cria a possibilidade de morar para mais 1460 domicílios, podendo comportar aproximadamente 4380 habitantes. Tal plano não tem a pretensão de ser a solução para a questão da moradia, mas gerar condições urbanas fortes o suficiente para que haja, aos poucos, a mudança de paradigmas sobre a questão habitacional e principalmente do direito à cidade.
notas
1
UNIRIC. Centro Regional de Informações das Nações Unidas.
2
Dados da Secretária Municipal Desenvolvimento Urbano.
3
Contracultura: mentalidade que rejeita e questiona os valores e práticas da cultura dominante. É sabido que a cultura pode ser mercadoria de gentrificação de certas áreas e no centro de São Paulo, no decorrer dos anos, são inúmeras as tentativas de requalificar o centro culturalmente, como a Praça das Artes, Teatro Municipal, Sala São Paulo, que não são plenamente democráticos quanto seu uso e ocupação.
4
Bottom-up, Abordagem “ascendente” (oposta ao modelo top-down), de iniciativa baseada em aspirações, ideias e projetos das populações locais, que são levadas às hierarquias mais elevadas.
ficha técnica
classificação
1º lugar
projeto
À margem: a legitimidade da ilegalidade
aluno
Camila de Oliveira Ghendov, Mariana Simaes da Costa e Vinicius Kuboyama Nakama
escola
FAU Mackenzie
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Universidade Presbiteriana Mackenzie