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architexts ISSN 1809-6298


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NEVES, André Lemoine. A arquitetura religiosa barroca em Pernambuco – séculos XVII a XIX. Arquitextos, São Paulo, ano 05, n. 060.08, Vitruvius, maio 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.060/465>.

O estudo do Barroco no Brasil, como a maioria dos temas e assuntos em nosso país, é um mundo a ser descoberto. Ao contrário do que se supunha, a quantidade de trabalhos desenvolvidos neste campo ainda está muito aquém da qualidade das obras e do esforço empreendido por aqueles que se aventuraram neste campo.

Há que se considerar que a grande maioria dos trabalhos relativos ao assunto se prende ao “barroco mineiro”, o que gera lacunas importantes no estudo do surgimento e desenvolvimento do estilo em outras regiões do país, levando a uma visão parcial e por demais restrita sobre um estilo, por si só imerso em pluralidade e contradições.

No intuito de contribuir minimamente para o estudo da arquitetura barroca desenvolvida em Pernambuco, desenvolveu-se, com o apoio da Faculdade de Ciências Humanas Esuda e do seu Departamento de Arquitetura e Urbanismo, a Pesquisa intitulada Estudo sobre a Arquitetura Religiosa Barroca em Pernambuco que teve como objetivo principal estudar a Arquitetura Religiosa Barroca produzida em Pernambuco entre a segunda metade do século XVII e o início do século XIX. Além disso, a pesquisa pretendeu também elaborar um inventário dos exemplares pertencentes ao estilo Barroco, como forma de auxiliar o trabalho de análise, comparando a produção arquitetônica pernambucana com as demais produções existentes no Brasil, no intuito de estabelecer semelhanças e diferenças entre elas e a existência ou não de uma escola regional pernambucana e definindo as características específicas da produção pernambucana. O resultado das pesquisas, até o momento trouxe importantes informações que, espera-se, venha a ampliar o debate sobre o estilo que já foi chamado por Affonso Romano de Sant’anna de “a alma do Brasil”.

A metodologia utilizada baseou-se na pesquisa bibliográfica, que resultou no Guia bibliográfico para o estudo da Arquitetura Religiosa Barroca no Brasil, corroborando a hipótese da quase inexistência de obras específicas sobre o Barroco desenvolvido em Pernambuco – o que foi produzido resume-se a trechos da clássica obra de Germain Bazin – Arquitetura Religiosa Barroca no Brasil e de um artigo produzido por este autor na década de 1940 na Revista Arquivos. Os trabalhos sobre a história de igrejas e conventos pernambucanos não entram no mérito da análise estilística, limitando-se a repetir observações da obra do autor francês. De forma mais precisa e seguindo os passos/metodologia estabelecidos no Projeto de Pesquisa, pôde-se constatar que:

1. Autores como John Summerson e G. Bazin entendem que o Estilo Barroco surgiu pelas mãos de artistas como Michelangelo ainda na primeira metade do século XVI, outros como Werner Wersbach associam a estética barroca à Contra-reforma da Igreja Católica, salientando o apelo dramático da expressão artística como mais uma forma de impor temor aos fiéis, muitos dos quais “tentados” pela simplicidade dos ideais protestantes. A vigência do Estilo na Europa abrange os séculos XVI e XVII, quando foi substituído pelo Rococó e pelo Neoclassicismo que imperou no século XVIII. Destacam-se, entre outras, as Escolas Italiana, Francesa, Alemã e Ibérica.

2. O estilo Barroco foi introduzido em Portugal através de mestres italianos como Filippo Terzi em meados do século XVI. O Estilo não chegou ao Brasil de imediato – todo o século XVI foi marcado por obras que ainda guardavam um ranço românico-renascentista, erroneamente chamado de maneirismo. As primeiras manifestações que permitem um vislumbre do Barroco no Brasil se dão a partir do início do século XVII, segundo Germain Bazin e Percival Tirapeli, na Bahia e em São Paulo. O estilo vai aos poucos se afirmando nos centros principais (Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, São Vicente, etc.) e atingindo grande desenvolvimento, do Pará até o sul do Brasil, e chegando também Goiás e Mato Grosso. Circunstâncias subjetivas levaram à exacerbação do Barroco produzido em Minas Gerais, em detrimento do resto da produção nacional, o que muito tem prejudicado a análise do estilo no Brasil como um todo.

3. A arquitetura religiosa em Pernambuco inicia-se em 1535 com a construção da ermida, depois matriz, dos Santos Cosme e Damião em Igarassu. Ao longo do século XVI, são construídos, como ainda pode ser constatado em igrejas como a já citada dos Santos Cosme e Damião (1535), Nossa Senhora da Graça (Olinda, 1540), São Lourenço de Tejucupapo (1555), Nossa Senhora de Nazaré (Cabo de Santo Agostinho, 1580), etc.. A pesquisa levada a efeito até o momento pôde fazer uma interessante constatação: analisando as pinturas de Frans Post foi possível observar que, até a chegada dos holandeses a Pernambuco (1630), as igrejas permaneciam, pelo menos em seu aspecto exterior, com as mesmas características do século XVI – frontão triangular suportado por um entablamento clássico, este, por sua vez suportado por cunhais de pedra à guisa de colunas dóricas, com uma composição formada por óculo, duas janelas e uma porta, o que leva a crer, a princípio, que o Barroco não foi utilizado em Pernambuco até a época posterior à saída dos holandeses do nosso território (1654). A partir de 1654, com a retomada de Pernambuco pelos luso-brasileiros, iniciam-se as reconstruções e reformas das igrejas destruídas e saqueadas pelos holandeses e a construção de novos templos. Praticamente todas as igrejas construídas antes do período holandês foram remodeladas ao final do século XVII e ao longo do século XVIII, passando a ter uma aparência barroca. A maioria das igrejas construídas ex novo já foram construídas dentro da nova estética, mas há casos como os de Nossa Senhora do Desterro (Convento de Santa Teresa, Olinda), Nossa Senhora do Pilar (Recife) que, mesmo construídas no final do século XVII vão manter a feição quinhentista. É importante salientar que as igrejas levavam décadas para serem construídas, como foram os casos da Basílica de Nossa Senhora do Carmo (1687-1767) e da Concatedral de São Pedro dos Clérigos (1728-1782), incorporando modificações sucessivas de estilo, partindo de um Barroco mais “primitivo” e alcançando resultados mais rebuscados dentro do Barroco-Rococó. O Estilo, introduzido inicialmente em Olinda e no Recife, vai sendo, aos poucos levado para povoações e engenhos da Zona da Mata, não ultrapassando, porém os limites dessa região. Sua limitação temporal pode ser estabelecida como sendo a partir da década de 1680, início das reformas das igrejas olindenses motivadas, principalmente pela elevação da vila à cidade (1676) e terminando em meados da década de 1840 com o término de igrejas como Rosário dos Pretos de Goiana (data do frontispício: 1836) e de outras em engenhos e povoados, que não seguiam o “estilo oficial” – o Neoclassicismo.

A observação dos exemplares existentes levou à definição de duas fases no Barroco produzido em Pernambuco:

1. A primeira que vai, aproximadamente, da década de 1680 (início das grandes reformas das igrejas de Olinda): apresenta alguns exemplares com feições quinhentistas, apesar de o trabalho de cantaria já denotar elementos barrocos como é possível observar no nicho da igreja de Nossa Senhora do Desterro (Olinda) e na cantaria das portas da igreja do Divino Espírito Santo. Outros exemplares, como a Madre de Deus (Recife) e Nossa Senhora do Carmo (Goiana), apresentam frontão em volutas mais horizontalizadas, formando um conjunto pesado e sem grande movimento. As torres ora se apresentam com coroamento piramidal (Espírito Santo, São João Batista dos Militares) ou com bulbo “simples” (Madre de Deus, Nossa Senhora das Neves).

2. A segunda fase vai, aproximadamente do final da década de 1720 (1728 – início da construção da Concatedral de São Pedro dos Clérigos) até a década de 1840, aproximadamente (1836 – conclusão do frontispício da igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de Goiana): esta fase apresenta uma maior exuberância de formas nos frontispícios, torres e altares. O frontão é progressivamente substituído por um jogo de volutas cada vez mais altas, gerando frontispícios esguios (Carmo do Recife, Rosário dos Pretos do Recife São Pedro dos Clérigos) ou as formas características da arquitetura franciscana, com frontispícios movimentados. Pode ser chamada de fase barroco-rococó e é onde se encontra um maior número de exemplares e aqueles com maior qualidade de soluções compositivas – os trabalhos em cantaria do Recife (São Pedro dos Clérigos, Carmo, Rosário dos Pretos, Santo Antônio do convento Franciscano e a Matriz de Santo Antônio estão entre os melhores da região), a talha atinge seu auge na capela-mor do Carmo do Recife, em São Bento de Olinda e em São Pedro dos Clérigos e as torres atingem sua máxima altura, tendo seu exemplar mais rebuscado, no Carmo do Recife.

As características apresentadas de relance nas duas fases acima envolvem aspectos gerais do estilo, pretende-se ao final, completar as características encontradas, de modo criterioso e que venha a determinar o “Barroco pernambucano”, buscando, também relacionar a produção local com a produção do resto do país.

A constatação da falta de trabalhos específicos sobre o tema reforça mais uma vez a necessidade de permanência da Pesquisa até a sua conclusão e posterior divulgação da mesma, abrindo caminho para outras pesquisas similares.

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