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research

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architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
A partir do estudo de quatro pequenas cidades da Bacia do rio Piranga, com características e demandas em comum, encontrou-se a alternativa de propor soluções para o seu desenvolvimento urbano a partir da formação de políticas e ações conjuntas.

english
From the study of four small towns in the Piranga River Basin, with common characteristics and demands, the alternative was found to propose solutions for their urban development based on the formation of policies and joint actions.

español
A partir del estudio de cuatro pequeños pueblos en la cuenca del río Piranga, con características y demandas comunes, se encontró la alternativa de proponer soluciones para su desarrollo urbano basadas en la formación de políticas y acciones conjuntas.


how to quote

CARNEIRO, Camilla Magalhães; STEPHAN, Ítalo Itamar Caixeiro. Planejamento urbano intermunicipal. Um estudo de caso na Bacia Hidrográfica do Rio Piranga, Minas Gerais. Arquitextos, São Paulo, ano 21, n. 251.03, Vitruvius, abr. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/21.251/8046>.

Este trabalho é resultado de uma pesquisa sobre pequenos municípios de Minas Gerais e suas dinâmicas espaciais, especialmente sobre planejamento e gestão de seus territórios. Esses municípios enfrentam muitas dificuldades, dentre elas a escassez de recursos técnicos e financeiros, o isolamento e o grau de importância que prejudicam seu desenvolvimento, assim como o acesso dos munícipes a serviços básicos.

Vista parcial da área central de Barra Longa MG
Foto dos autores, 2019

Apesar de cada município possuir uma realidade distinta, parte-se do princípio de que é possível pensar políticas de planejamento territorial que envolvam mais de um desses municípios. Dentre as alternativas destaca-se a de produzir soluções a partir da formação de políticas e ações que envolvam municípios com características e demandas em comum.

A pesquisa teve como objeto de estudo um conjunto de quatro municípios mineiros da Bacia Hidrográfica do Rio Piranga: Acaiaca, Barra Longa, Diogo de Vasconcelos e Rio Doce. Todos esses municípios possuem população inferior a 10.000 habitantes.

Vista parcial da área central de Diogo de Vasconcelos MG
Foto dos autores, 2019

Apesar do pequeno número de habitantes, essas quatro cidades se enquadram nos requisitos da obrigatoriedade do Plano Diretor (artigo 41 da Lei Federal nº 10.257/2001 – Estatuto da Cidade), porque são áreas de Especial Interesse Turístico e estão inseridas na área de influência de atividades com significativo impacto ambiental (são áreas próximas à região de Mariana MG, onde há atividades ligadas à mineração).

Por não disporem de recursos humanos e financeiros para elaboração e aplicação de políticas urbanas específicas, o desenvolvimento dessas cidades fica prejudicado. Além disso, essas cidades passam por um processo de descaracterização no que se refere à permeabilidade do solo, ao adensamento populacional descontrolado, à mobilidade e aos aspectos culturais e ambientais, problemas esses que comprometem a sustentabilidade.

Localização dos municípios no estado de Minas Gerais
Elaboração dos autores

Um outro problema detectado é que essas cidades adotam políticas genéricas, criadas nos moldes dos grandes centros, ou tentam adaptá-las. Políticas essas que não são de conhecimento da maioria da população, muitas vezes, nem mesmo da equipe gestora; são cumpridas em parte, sem alcançar resultados adequados.

Diante da problemática evidenciada, faz-se necessário buscar novas possibilidades para o desenvolvimento social, cultural e econômico dessas cidades. Uma alternativa pertinente seria o planejamento intermunicipal.

O objetivo deste trabalho foi identificar e analisar um conjunto de instrumentos de planejamento e de gestão urbanos com potencial de auxiliar nas políticas de desenvolvimento das pequenas cidades e de seus territórios municipais. Seguem as etapas desenvolvidas:

  • construção de referencial teórico sobre pequenas cidades, rede urbana, planejamento regional, planejamento e gestão em pequenas cidades;
  • elaboração de um breve levantamento histórico da região estudada;
  • caracterização dos municípios estudados por meio do levantamento da base documental: leis, estatutos e similares que envolvem aspectos de planejamento e de gestão urbana, dados disponíveis na internet, levantamento da legislação urbanística local de cada município estudado, além da legislação estadual referente a políticas de planejamento urbano e regional.

Interpretação do material obtido, de forma a identificar e a analisar um conjunto de instrumentos de planejamento e gestão urbanos com potencial de auxiliar nas políticas de desenvolvimento territorial das pequenas cidades.

Planejamento urbano em municípios pouco populosos

No Brasil, há milhares de pequenas cidades com inúmeras diferenças entre si. Segundo a estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE para 2018, 1.253 dos 5.570 municípios brasileiros possuem população inferior a 5.000 habitantes, o que equivale a 22,5% do total.

Esses municípios enfrentam muitos problemas de planejamento e de gestão, a maioria de difícil resolução devido aos poucos recursos humanos e financeiros disponíveis.

Cabe à administração desses centros adequar as políticas às demandas advindas com as atividades que modificam as cidades. É atribuição constitucional dos municípios exercer controle sobre o uso e a ocupação do solo e estabelecer condições para o desenvolvimento sustentável do seu território (1). Atribuições como essa foram reforçadas pela Constituição Federal, de 1988, que reconheceu o município como ente federativo.

A Constituição de Minas Gerais de 1989 consolidou o que fora proposto na Constituição Federal.

Constituição de Minas Gerais e sua relação com os municípios
Constituição de Minas Gerais (1989)

Essa descentralização proposta na Constituição depende de alguns fatores para gerar bons resultados: sobrevivência econômica; reforço da participação local; organização administrativa; reversão das práticas inadequadas dos projetos de planejamento que trabalham de forma globalizada. A preocupação com esses fatores ocorre porque os municípios com menos de 10.000 habitantes encontram dificuldades para cumprir esses requisitos. Esses locais enfrentam problemas como: falta de uma gestão planejada; dificuldade na prestação de serviços; falta de racionalidade técnica; falta de políticas de desenvolvimento; falta de instrumentos institucionais, financeiros e técnico-administrativos; problemas em relação à geração de renda; problemas na gestão dos recursos; inércia dos governos municipais; predomínio dos interesses das lideranças locais; população com pouco poder de reivindicação (2).

As estratégias de desenvolvimento local visam à diminuição da dependência do exterior e a se valer das potencialidades locais. É preciso tomar essas medidas considerando as especificidades de cada local, pois os arranjos são únicos e raramente se encontram os fatores combinados da mesma forma (3).

Nas pequenas cidades, algumas dessas carências estão ligadas, dentre outros fatores, à qualidade da administração, esta geralmente baseada em interesses pessoais. Comumente ocorre que a falta de conhecimento técnico leva à ausência de bons projetos para solucionar problemas. Essa forma de administração persiste em alguns locais, onde a capacitação tanto técnica quanto educacional é escassa e onde o município é o maior empregador.  Além disso, essas pequenas cidades, que não têm obrigatoriedade legal de elaboração de planos urbanísticos, sofrem as consequências da falta de planejamento.

Salgueiro et al. (4), em seus estudos sobre pequenas cidades, questionam a exigência de que o município deva, primeiramente, alcançar uma população de 20.000 habitantes para ser obrigado a elaborar um plano de desenvolvimento urbano. Para esses autores, esse momento pode ser considerado tarde demais ou mesmo nunca vir a acontecer. Assim, defendem que o processo de planejamento nas cidades tem de acontecer continuamente, junto com o seu crescimento, e não deve estar refém de interesses políticos ou ser restrito a alguns municípios.

Na busca de soluções para o desenvolvimento das pequenas cidades, Tânia Maria Fresca (5) ressalta a importância de se pensar dentro de uma escala mais ampla, sendo necessário entendê-las de acordo com sua inserção em determinada rede urbana ou região.  Nas pequenas cidades, essa complexidade de atividades fica diretamente ligada e, algumas vezes, subordinada às atividades de outros municípios. Afinal, essas cidades desempenham um papel secundário nas decisões inerentes ao funcionamento da rede urbana (6).

Ao levar em consideração toda a discussão aqui desenvolvida acerca do tema, entende-se que o planejamento intermunicipal é uma alternativa tanto para o desenvolvimento social quanto para o econômico das pequenas cidades brasileiras.

Planejamento urbano intermunicipal: uma alternativa para as pequenas cidades

Ao considerar as dificuldades que as pequenas cidades encontram para o seu desenvolvimento, buscam-se novas possibilidades para que esses lugares possam oferecer uma melhor qualidade de vida aos seus habitantes. Essas dificuldades, para Ana Balão e José Saragoça (7), estão relacionadas com a baixa densidade populacional, poucas atividades de base econômica, baixa capacidade de captação de investimentos, população pouco qualificada e fraco espírito empresarial.

A fim de superar essas dificuldades, é necessária a adoção de parcerias e associações entre os municípios, levando em consideração “as limitações estruturais, de recursos humanos e financeiros enfrentadas pela maioria dos municípios, especialmente os pequenos, com vistas à troca de experiências” (8).

A associação entre municípios de mesmo porte poderia até incentivar a adoção de instrumentos de ordenação urbana, como o plano diretor (9). Para os autores, isso poderia ocorrer à medida que os municípios estivessem articulados com seus vizinhos, de forma a pensar sobre seu planejamento baseado em vocações regionais. Tal articulação “não só potencializa a solução de problemas comuns e qualifica os resultados, como permite otimizar recursos no processo de elaboração do Plano Diretor e outras leis urbanísticas, ao possibilitar a contratação de serviços comuns como consultorias, elaboração de cadastros, estudos, mapeamento, dentre outros” (10). O que ocorre é a competição e não a cooperação na busca por recursos. Sugerem que é necessário investir em mecanismos que incentivem a ação cooperativa (11).

A Constituição Federal de 1988 mostrou a necessidade de se repensar sobre a questão regional e abriu margem para a participação mais direta dos governos municipais e estaduais na elaboração e na aplicação de políticas de âmbito regional. Novas configurações espaciais foram feitas, como os Planos de Bacias Hidrográficas e as Unidades de Conservação (12), sendo que os recursos naturais integram os ecossistemas além dos limites interpretados pelo homem (13).Assim, reforçou-se a ideia de que certos assuntos não se restringiam a um só município, não podendo esse ser refém de fronteiras delimitadas politicamente.

Uma alternativa identificada para ajudar no desenvolvimento de uma região é a adesão aos consórcios, os quais são considerados “uma tendência em municípios brasileiros”. Para os autores, os consórcios são capazes de levar benefícios para os municípios, em especial àqueles que dispõem de poucos recursos.

“Os consórcios intermunicipais estão previstos no Brasil desde a Constituição de 1937. Porém, sua sistematização e disseminação entre os gestores públicos começou a se consolidar apenas a partir da década de 1990, quando a descentralização das políticas públicas, resultada do desenho institucional que a Constituição de 1988 conferiu ao nosso federalismo, instituiu aos governos locais dilemas de coordenação e cooperação” (14).

Um fator que interfere nos resultados da implementação da descentralização é a maneira como o conjunto de instrumentos que a promovem são aplicados. Essa ideia foi imposta igualmente a todos os municípios brasileiros sem considerar o número de habitantes, economia, localização geográfica ou fatores sociais (15). Isso persiste uma vez que os municípios continuam sem apoio técnico e financeiro para promover um planejamento urbano eficaz.

Os consórcios podem funcionar como meio para articular um novo projeto de desenvolvimento regional, sendo também potenciais para a atenuação da exclusão social, à medida que proporcionam melhorias nas condições de trabalho e renda, inovação nas políticas públicas e na correta gestão do meio ambiente (16).

Há vantagens nos consórcios intermunicipais, pois essas parcerias “trazem consigo inovações na gestão que propiciam a execução de serviços e políticas públicas com maior eficiência, agilidade, transparência, assim como racionaliza e otimiza o uso dos recursos públicos” (17). Essas vantagens citadas são de grande interesse para as cidades pequenas, as quais dispõem de recursos limitados que, por consequência, limitam também o seu desenvolvimento.

Às vantagens dos consórcios, principalmente para as pequenas cidades e para a região na qual estão inseridas, acrescenta-se: “os consórcios públicos se apresentam como um importante instrumento de cooperação e gestão intergovernamental que visam fortalecer os entes federados com reduzida capacidade administrativa, gerencial e financeira” (18). Há outras vantagens citadas que podem ser fundamentais para o desenvolvimento de uma região: o aumento da capacidade de realização; solução de problemas, os quais não seriam resolvidos numa situação isolada; economia de recursos; modernização de processos; criação de uma identidade regional.

Apresentadas as vantagens, é preciso também ter consciência de que os consórcios só são realizados quando há ideais e atitudes que os promovam. “As vantagens são muitas, no entanto, a concretização delas demanda tempo, diálogo, articulação coesa e comprometimento, pois, como visto, a constituição de um consórcio público é uma faculdade, um ato de vontade política” (19).

O sucesso dos consórcios envolve, dentre outras ações, mobilização da comunidade para a tomada de iniciativas, a fim de encontrar soluções para enfrentar desafios comuns. Essa integração é capaz de gerar resultados que podem melhorar ambientes, de forma a contribuir com o desenvolvimento de toda uma região (20). Ao tomar como base a eficiência de instrumentos de gestão e planejamento intermunicipais apresentados, como os consórcios, é pertinente considerar seus benefícios para os municípios brasileiros, principalmente para os pouco populosos.

Novas possibilidades para os quatro municípios

Diante das possibilidades de melhoria no planejamento e na gestão de pequenas cidades, é possível estudar a viabilidade de aplicação dos princípios do planejamento intermunicipal em quatro pequenas cidades: Acaiaca, Barra Longa, Diogo de Vasconcelos e Rio Doce. Essas cidades estão localizadas na Bacia Hidrográfica do Rio Doce, em Minas Gerais, e possuem menos de 10.000 habitantes.

Esses municípios normalmente não têm nenhum tipo de regra de ordenamento do uso do solo. Além disso, não lhes é exigida a elaboração de um plano diretor, devido ao número de habitantes, mas todos se enquadram no critério do art. 41 do Estatuto da Cidade. A ausência de políticas urbanas específicas compromete o desenvolvimento desses municípios, de forma que eles ficam cada vez mais dependentes de outros maiores, que funcionam como polo. Portanto, é necessário desenvolver e aplicar um conjunto de ações e programas que auxiliem no seu desenvolvimento. A alternativa a ser apresentada neste estudo, como já foi dito, é o planejamento intermunicipal.

Caracterização

Os principais rios que banham os municípios são: Rio Carmo, Rio Gualaxo, Rio Piranga, Rio Doce e Ribeirão Pinheirinho. O Ribeirão Pinheirinho, de Diogo de Vasconcelos, desagua no Rio Gualaxo. Este, por sua vez, deságua no Rio Carmo, em Barra Longa. No município de Rio Doce, o Rio Carmo se encontra com o Rio Piranga, formando o Rio Doce.

Rodovias e hidrografia das cidades estudadas
Elaboração dos autores

Os quadros e os gráficos a seguir mostram mais características dos quatro municípios e, ao mesmo tempo, trazem um comparativo entre elas. São apresentadas características demográficas, econômicas, sociais, bem como características de infraestrutura e de gestão.

Aspectos em comum dos municípios
IBGE/ CBH Piranga

As atividades ligadas à agropecuária predominam nos quatro, seguidas do comércio e da construção civil (que são atividades de pouco dinamismo nesses municípios). O IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) é semelhante em todos, sendo o de Rio Doce o maior índice. O PIB (Produto Interno Bruto) também é semelhante nos municípios, com exceção de Barra Longa, que tem o maior PIB das quatro cidades.

A título de comparação, Ponte Nova tinha o IDHM de 0,717 em 2010 e Juiz de Fora (polo da região intermediária) tinha o IDHM de 0,778 em 2010.

Características econômicas
IBGE e Sebrae

Os quatro municípios são carentes de instituições ligadas à formação profissional. Em nenhum deles há instituições de ensino técnico ou de ensino superior. Quanto à área da saúde, os municípios possuem apenas um estabelecimento para cada mil habitantes. Essa questão poderia ser resolvida por meio da adoção de consórcio.

Como seus recursos são limitados, todos os municípios estudados necessitam dos serviços de outros municípios maiores. Além disso, fica inviável manter estruturas equipadas para uma demanda reduzida em cidades de pequeno porte.

Centros onde se buscam serviços
Sebrae, IBGE e levantamento in loco

Apenas em Acaiaca, o número de habitantes aumentou. Nos outros municípios, esse número diminuiu, mais acentuadamente em Barra Longa.

Características demográficas
IBGE e Sebrae

Barra Longa, Diogo de Vasconcelos e Rio Doce perderam população total entre 1991 e 2010. O único a registrar um pequeno aumento populacional foi Acaiaca (3.589 habitantes em 1991 para 3.920, em 2010). A população rural diminuiu em todos os municípios, enquanto que a população urbana aumentou em todos.

Em 2010, o município com o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) mais elevado era Rio Doce. Neste mesmo período, o município com maior taxa de envelhecimento era Barra Longa. Além disso, a maior taxa de fecundidade era em Acaiaca e em Diogo de Vasconcelos; a razão de dependência era maior em Diogo de Vasconcelos, onde o índice de Gini da renda domiciliar per capita era maior.

Foram realizadas pesquisas no site do IBGE e pesquisas de campo, a fim de identificar e de checar as informações relacionadas à gestão do meio ambiente nos municípios. Foram obtidas informações sobre órgãos, conselhos, planos, legislação e consórcios relacionados ao assunto.

Gestão do meio ambiente
IBGE e levantamento in loco

Percebe-se que há políticas e órgãos ligados à gestão do meio ambiente nas quatro cidades estudadas. Nem todos órgãos possuem um departamento próprio, o que faz com que os assuntos relacionados a meio ambiente, muitas vezes, não tenham a discussão necessária para a resolução de problemas ligados ao tema.

Gestão da política urbana
IBGE e levantamento in loco

Percebe-se a carência de leis urbanísticas, com exceção em Rio Doce, a única cidade que possui Plano Diretor. As quatro cidades são dependentes de um polo (Ponte Nova). Apesar de possuírem características em comum, elas dificilmente estabelecem relações econômicas entre si; essas relações acontecem, majoritariamente, com a cidade-polo. A economia da região não gira em torno de um produto agropecuário específico, sem nenhum arranjo produtivo local.

Para complementar a análise da relação entre as cidades estudadas, foi feito um levantamento dos consórcios de que elas participam. Nessa região foram identificados três consórcios atuantes (21):

  • Cisamapi (Consórcio Intermunicipal de Saúde da Microrregião do Vale do Piranga). Criado em 1995 e sediado em Ponte Nova MG, compreende todos os municípios estudados neste trabalho. Dentre os benefícios, podem-se apontar a redução da necessidade de aquisição de equipamentos especializados pelos municípios e a melhor utilização dos recursos humanos, o que permite que a população não precise se deslocar para grandes centros;
  • Cimvalpi (Consórcio Intermunicipal Multissetorial do Vale do Piranga). Compreende os municípios estudados neste trabalho. Foi criado em 2013, para atender às demandas dos municípios do Vale do Piranga. Sua atuação principal está ligada à iluminação pública, incluindo serviços de manutenção preventiva e corretiva, além de fiscalização elaborada por engenheiro elétrico;
  • Cisabi (Consórcio Intermunicipal de Saneamento Básico da Zona da Mata de Minas Gerais). Compreende os municípios de Acaiaca e Rio Doce. Criado em 2008, com o objetivo de prestar serviços de saneamento básico, os quais se efetivam com capacitação técnica do pessoal dos municípios. Dos municípios deste estudo, apenas Acaiaca e Rio Doce possuem Estação de Tratamento de Esgoto.

Foi constatada a falta engajamento por parte dos gestores de alguns municípios para atingir melhores resultados. A equipe da gestão não possui conhecimento dos benefícios que esses órgãos podem oferecer e não busca uma maior adesão a essas políticas.

Considerações sobre as quatro cidades

Diante dos dados obtidos confirma-se que as pequenas cidades aqui estudadas cresceram sem planejamento devido a fatores históricos (ocupação da região guiada pelo rio, devido às atividades de mineração). Isso não justifica a continuidade da falta de planejamento, problema que persiste ao longo dos anos. Um fator que contribui para o crescimento desordenado desses locais é a falta de capacidade técnica e de entendimento da necessidade do planejamento por parte dos gestores.

Apesar de estarem localizadas em uma mesma bacia hidrográfica, nas mesmas regiões identificadas pelo IBGE, e de participarem dos mesmos consórcios, não há, além dos consórcios, políticas urbanas que considerem seus aspectos comuns. As relações entre essas cidades não abrangem aspectos econômicos, de tal forma que esse tipo de relação acontece, majoritariamente, com a cidade-polo.

Há áreas de interesse comum entre as cidades. No que se refere à economia, por exemplo, a pecuária é o segmento principal em todas elas. Além disso, há aspectos comuns em relação ao patrimônio cultural, uma vez que a história dos municípios está interligada e é possível que haja políticas conjuntas para sua valorização. Os municípios também possuem recursos naturais que poderiam ser mais valorizados por meio de políticas de turismo que envolvam toda a região. Sendo assim, é possível criar novos consórcios para tratar de assuntos comuns.  Uma opção seria a criação de um conselho intermunicipal em que uma equipe de cada município pudesse fazer parte dele.

Além da população urbana é preciso considerar a população rural, que representa um grande percentual nos municípios estudados. É necessário proporcionar condições favoráveis de permanência das pessoas em suas cidades, como acesso à assistência técnica, à saúde, à educação, ao transporte e à habitação adequados, para que não precisem procurar outros locais para viver.

No que se refere à gestão, poucas vezes, as decisões são tomadas baseadas na legislação e respaldadas por técnicos da área. Além disso, a falta de legislações e de políticas para parcelamento, uso e ocupação do solo, proteção ao patrimônio e execução de obras dificultam a gestão dos municípios. Essa situação se mostra melhor resolvida em Rio Doce, que dispõe de equipe técnica devidamente qualificada para o trabalho que exerce. Além disso, o município conta com um plano diretor, principal instrumento de ordenamento do território.

Os órgãos que atuam na região exercem trabalhos importantes, mas é necessário que as pessoas que trabalham na gestão municipal estejam preparadas para aproveitar as oportunidades e o apoio oferecido por eles. Não há uma equipe local capacitada para elaborar projetos que atendam aos editais de apoio financeiro, disponíveis pelo Governo Federal.

A falta de planejamento e de gestão urbanos, aliada a outros problemas como o aspecto financeiro, a falta de capacitação profissional e a reduzida participação popular impactam negativamente vários segmentos da gestão dessas cidades.

Formas e ações potenciais conjuntas

A partir dessas considerações é possível apresentar um conjunto de pontos a serem observados para uma possível formação de consórcio que lide com política urbana e regional, que mais se adeque às quatro cidades estudadas.

Faz-se necessário maior apoio por parte do Estado e da União para as políticas urbanas, com o oferecimento de assistência de órgãos para auxiliar na tomada de decisões. Essa assistência possibilitaria que esses municípios levassem em consideração suas peculiaridades, a fim de que não repetissem fórmulas ou instrumentos aplicados nas grandes cidades.

Sugerem-se algumas medidas por parte do Governo Federal e dos estados:

  • desenvolvimento de ações para viabilizarem, criarem e implantarem consórcios municipais que envolvam as questões relacionadas às políticas territoriais;
  • investimento em capacitação dos profissionais para desenvolverem trabalhos que interfiram no urbano.
  • divulgação dos benefícios dos consórcios, a fim de despertar interesse nos gestores municipais sobre esse assunto; até mesmo propor, apoiar e dar suporte técnico aos municípios interessados;
  • viabilização de recursos para a elaboração de legislação urbanística que inclua políticas de planejamento regional para as cidades que formarem consórcios.
  • viabilização de recursos para contratação de equipes de planejamento regional;
  • redefinição das funções dos órgãos municipais ligados ao planejamento, dos cargos ocupados nesses órgãos e de suas estratégias de atuação;
  • organização de uma agenda que envolva reuniões periódicas, seminários, cursos de capacitação e solução de problemas comuns; divulgação dos benefícios dos consórcios.

Em relação aos governos municipais, entende-se que é necessário, quanto ao planejamento:

  • elaboração e ou revisão de legislações urbanísticas adequadas ao porte desses municípios. Essas ações devem considerar características específicas de cada um deles, mas também os aspectos que respeitem as especificidades regionais, como a mobilidade, o meio ambiente e o saneamento básico;
  • definição de metas de desenvolvimento, por meio de planos que possam servir de direção para as pessoas envolvidas na gestão;
  • elaboração de projetos e de ações que busquem a valorização dos recursos naturais do entorno dos quatro municípios.

Quanto à gestão municipal:

  • contratação de técnicos para atuarem em planejamento urbano, na elaboração de projetos e para atuarem no setor de aprovação de projetos de construção. Esses técnicos poderiam ser compartilhados entre os municípios envolvidos no consórcio;
  • vinculação a outros consórcios existentes para desenvolvimento de ações conjuntas;
  • capacitação de gestores para trabalharem de forma a otimizar os gastos dos recursos financeiros do município e a atuarem em ações cooperadas;
  • promoção do acesso a informações/leis pela população utilizando-se, por exemplo, as redes sociais.
  • Integração das atividades que possam ser desenvolvidas em todas as cidades de interesse, como o turismo e o patrimônio cultural;
  • investimento em atividades culturais que já acontecem nas cidades e que sejam potenciais, como gastronomia, artesanato, dentre outros, a começar pelo direito ao uso integral dos recursos do ICMS cultural para tais fins.

Considerações finais

Verificou-se que o planejamento urbano nas pequenas cidades enfrenta muitas dificuldades e que é necessário que os gestores atuem em busca de um desenvolvimento melhor de seus territórios. Constatou-se que as prefeituras das pequenas cidades, com raras exceções, não dispõem de recursos humanos e financeiros para alcançar seus objetivos de desenvolvimento de forma isolada. Por isso, é importante criar modelos de desenvolvimento baseados na cooperação entre os municípios.

Na busca por alternativas, conclui-se que não se devem propor políticas de desenvolvimento urbano isoladas. A alternativa mais viável é a do planejamento urbano em arranjos microrregionais. Deve-se considerar que o trabalho de forma consorciada depende de alguns fatores como o interesse político e o conhecimento técnico dos gestores. Dessa forma, é preciso que haja maior apoio efetivo das escalas estadual e federal, além da conscientização sobre a importância do planejamento urbano e regional, para que as pessoas ligadas à gestão dos municípios entendam seus benefícios e se empenhem em planejar e executar ações nesse sentido.

Considerando a importância do tema e os benefícios que podem ser adquiridos pelos municípios, com ações voltadas para o planejamento urbano e regional, esta discussão não encerra o debate. Sugere-se que outros grupos de pequenas cidades sejam investigados, de forma a aprimorar os apontamentos identificados neste trabalho.

notas

1
MARINHO, Geraldo; POZZOBON, Regina Maria. Plano Diretor para Pequenos Municípios. In BRASIL, Ministério das Cidades. Plano diretor participativo: guia para a elaboração pelos municípios e cidadãos. Brasília, Ministério das Cidades/Confea, 2004, p. 29.

2
CARVALHO, Aline Werneck Barbosa. Modelo para a Avaliação da Capacidade de Gestão Municipal no Atual Contexto de Descentralização. Anais do XI Encontro Nacional da Anpur, 2005, Salvador, 2005.

3
ENDLICH, Ângela Maria. Pensando os papéis e significados das pequenas cidades do Noroeste do Paraná. São Paulo, Unesp, 2006, p. 333.

4
SALGUEIRO et. al., 2012.

5
FRESCA, Tânia Maria. Centros locais e pequenas cidades: diferenças necessárias. Mercator, Fortaleza, v. 9, n. 20, 2010, p. 75-81.

6
SPOSITO, Eliseu Savério; JURADO DA SILVA, Paulo Fernando. Cidades Pequenas: perspectivas teóricas e transformações socioespaciais. Jundiaí, Paco Editorial, 2013, p. 46.

7
BALÃO, Ana; SARAGOÇA, José. Cooperação Intermunicipal no Alto Alentejo: «a realidade construída» pelos protocolos de colaboração. IX Congresso Português de Sociologia, p. 4.

8
ALBINO, Gilson Lunardi; MACHADO, André Luiz Caneparo; VOLPATO, Silvia Maria Berté. Gestão Municipal Consorciada: a experiência do Consórcio de Informática na Gestão Pública Municipal. CIGA <http://www.periodicos.ufpb.br/index.php/rppi/article/view/34623/18852>.

9
MARINHO, Geraldo; POZZOBON, Regina Maria. Op. cit., p. 70.

10
Idem, ibidem, p. 70.

11
ABRUCIO, Fernando Luiz; FILIPPIM Eliane Salete; DIEGUEZ, Rodrigo Chaloub. Inovação na cooperação intermunicipal no Brasil: a experiência da Federação Catarinense de Municípios (Fecam) na construção de consórcios públicos. Ver. de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 47, n. 6, 2013, p. 1543-1568.

12
PERES, Renata Bovo; SILVA, Ricardo Siloto. Interfaces da gestão ambiental urbana e gestão regional: análise da relação entre Planos Diretores Municipais e Planos de Bacias Hidrográficas. Revista Brasileira de Gestão Urbana, v. 5, n. 2, jul. /dez. 2013, p. 13-25.

13
JURASZEK; BATISTA; MARCHESAN, 2018, n. p.

14
ALBINO, Gilson Lunardi; MACHADO, André Luiz Caneparo; VOLPATO, Silvia Maria Berté. Op. cit., p. 284.

15
CARVALHO, Aline Werneck Barbosa. Op. cit.

16
SILVA, Fabiana; VIEIRA, Ricardo Stanziola. Consórcios Públicos: uma possível alternativa para o desenvolvimento territorial sustentável em Santa Catarina. Egem, 2016.

17
HENRICHS, Joanni Aparecida; MOYANO, Leandro Rico. Consórcios Públicos Intermunicipais: Uma Alternativa à Gestão Pública. Brasília: CNM, 2016, p. 11.

18
Idem, ibidem, p. 35.

19
Idem, ibidem, p. 39.

20
JURASZEK; BATISTA e MARCHESAN. Op. cit.

21
Informações apresentadas na descrição dos consórcios retiradas dos respectivos sites oficiais.

sobre os autores

Camilla Magalhães Carneiro é arquiteta urbanista e mestra em Arquitetura e Urbanismo pelo PPG.au/UFV (2019). Atua como docente do curso de Arquitetura e Urbanismo da Rede Doctum de Ensino em Caratinga MG. Desenvolve pesquisas e trabalhos relacionados a planejamento urbano e regional. É autora do artigo “Barra Longa já não é mais a mesma” (Minha Cidade, 2016).

Ítalo Itamar Caixeiro Stephan é arquiteto e urbanista, doutor pela FAU USP (2006), professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFV. Conselheiro do CAU MG nos períodos de 2013 a 2014 (fundador) e de 2018 a 2020. Seu foco de trabalho e pesquisas é na área de planejamento urbano e regional. É autor do livro Fábulas urbanas e outras lições sobre as cidades (Edição do autor, 2019).

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