Adalberto Retto: No texto "La città territorio, verso una nuova dimensione" (revista Casabella continuità, 1962), Manfredo Tafuri, com Vieri Quilici e Giorgio Piccinato, enfrenta, pela primeira vez, o tema da crítica da cidade, perguntando-se qual poderia ser a “dimensão fundamental a se fazer referência nas hipóteses de desenvolvimento urbanístico”.
O artigo fala da superação “da sistemática origem racionalista preocupada em subdividir cada complexa problemática em problemas particulares, cada um dos quais passíveis de serem resolvidos separadamente [...] para atingir diretamente a complexidade e a contrariedade de uma realidade em que operar” (p. 24). Deste modo, para os autores, o chamado “modello operativo” em urbanismo entra em declínio. Vinte anos mais tarde, no ensaio Machine et mémoire – la città nell’opera di Le Corbusier, ele enfrenta mais uma vez o tema procurando fazê-lo através da arquitetura, da pintura e urbanismo, analisando os métodos projetuais, as ideologias políticas, as referências culturais e formais do mestre do movimento moderno.
“O attico Béistegui não faz parte de algum programa urbanístico: pelo contrário, é um baú precioso para uma elite mundana, bem diferente, nas suas conotações sociológicas e culturais, daquela que Le Corbusier gostaria de ter confiado as próprias soluções para a reforma do universo moderno. Mas, justamente deste emergem muitos elementos da abordagem lecorbusiana em relação às temáticas urbanas sobre a qual os seus escritos teóricos – não casualmente – se calam” (p. 44).
O senhor pode esclarecer melhor a relação de Tafuri e a cidade?
Marco Biraghi: Naturalmente a relação é muito complexa, e mereceria um outro momento para efetivo aprofundamento. Todavia creio que a cidade representasse para Tafuri o último horizonte ao qual olhar; não no sentido estritamente disciplinar, entendido como urbanismo, obviamente, muito mais no sentido que a cidade aos seus olhos encarnava aquela efervescente estratificação de contradições convivendo, o que ele considerava a própria natureza da história.
Poderia talvez ser dito que para ele a imagem da história era verdadeiramente a imagem da cidade e, com isso os seus tempos e modos diversos. Veneza, neste sentido, encarna provavelmente uma das “figuras” que mais se aproximou à sua idéia de história. Não somente em Venezia e il Rinascimento e nas partes de Ricerca del Rinascimento dedicadas à Veneza, mas também no belíssimo diálogo à três com Massimo Cacciari e Francesco Dal Co, O mito de Veneza, emerge esta imagem concreta de Veneza como cidade das contradições, como concretude histórica vital, jamais morta, sempre em porvir.
Le Corbusier, deste ponto de vista, se constitui uma referência imprescindível para Tafuri, que nele vê um dos grandíssimos homens do moderno, e assim a encarnação do trágico, mais uma vez. E é significativo que de Le Corbusier lhe interessasse mais a fase intermediária e a final, em que arquitetura e cidade se misturam de modo mais “insustentável”, por assim dizer: isto é, Le Corbusier do Plan Voisin, e mais ainda do Plan Obus ou de Chadigarh, que procura confrontar-se com a realidade sem poder mais confiar (ou crer de confiar) no grande mito da racionalidade. É este Le Corbusier “surreal, ou “irracional”, ou justamente por isso “trágico”,que interessa a Tafuri. E a cidade lhe tem o mesmo valor. Levando em conta de qualquer forma do profundo destaque que, a partir da segunda metade dos anos sessenta, Tafuri demonstrou para todos os discursos do tipo “cidade território”...