“A solução colonialista que condenara a grande palmeira imperial não fizera mais do que copiar os jardins românticos, avant la lettre, do fim do século XVIII. Burle Marx mostrou o caráter falso dessa pretensa solução ao ir buscar o material de que carecia nas fontes verdadeiras, isto é, na vegetação brasileira de recursos inesgotáveis, desde a floresta amazônica, de onde nos trouxe espécimes em todo o esplêndido vigor de sua selvajaria, aos fundos das casinhas de caboclo ou à beira dos caminhos, onde foi apanhar plantas e flores abandonadas, desprezadas, mas familiares à ambiência da roça brasileira, como os cães vagabundos, sem donos, dos fundos de quintal.” (Mário Pedrosa) (2)
Lúcio Costa (1902–1998) faria 100 anos em 2002, ano em que se sucedem merecidas homenagens a um dos principais intelectuais do Brasil. Já são significativos também os esforços analíticos enfocando sua obra, realizados por intelectuais de porte, como Yves Bruand, Carlos Martins, Hugo Segawa, Otília Arantes, Margareth da Silva Pereira, Sophia da Silva Telles e outros. Nossos estudos têm se voltado para a elucidação do processo de montagem discursiva da arquitetura moderna brasileira, processo artificial de conferir retrospectivamente uma suposta organicidade a um processo histórico que passa a ser considerado, a partir dessa ótica, como a síntese entre o ideário moderno europeu e as raízes da cultura brasileira. Montagem onde, certamente, o pensamento de Lucio Costa é peça-chave. No nosso entendimento, o juízo proferido por Lúcio Costa – na realidade uma interpretação e adaptação pessoal do ideário forjado pelo modernismo paulista, em especial por Mário e Oswald de Andrade – de tão repetido tornou-se um axioma intocável há até bem pouco tempo. Como diz Otília Arantes, a versão do arquiteto carioca comporta-se como uma “história exemplar de formação”, uma espécie de “conto bem urdido”, uma “fantasia exata que veio desde então assumindo proporções mitológicas, tal o sucesso com que cada obra da Moderna Arquitetura Brasileira, grandiosa ou não, reforçava a fábula de sua própria origem miraculosa.” (3)
Tal fenômeno só foi possível por estar Lúcio Costa dos dois lados do tapume: no terreno da prática, como o líder primeiro dos jovens arquitetos brasileiros que dariam ao mundo o primeiro “arranha-céu” moderno segundo os princípios corbusianos – o edifício-sede do Ministério da Educação e Saúde Pública, no Rio de Janeiro; e no terreno das idéias, como principal teórico do grupo e autor intelectual da visão que entende a história da arquitetura tupiniquim como um religio dos liames quebrados entre o moderno e a tradição. Durante o período em que seus postulados vigoraram como verdades históricas, poucas vezes se entrou no mérito dos compromissos assumidos que, de tão extensivos e profundos, davam à arquitetura um protagonismo decisivo na própria história do país. As demandas de responsabilidade dos arquitetos corresponderiam a um extenso arco, que ia da materialização estética da racialidade até a instalação adequada do homem brasileiro no território tropical. É justamente sobre a participação de Lucio Costa neste último território, participação pouco conhecida e explorada, que nos deteremos aqui. Ao contrário de outros acontecimentos e desenvolvimentos históricos onde sempre ocupou papel principal, no caso específico da constituição de um pensamento paisagístico moderno brasileiro ele terá um papel menos destacado, mas não menos decisivo pois caberá a ele a formação do principal protagonista.
O arquiteto-paisagista Roberto Burle Marx (1994–1909) cumprirá, na evolução da arquitetura moderna brasileira, um papel de primeira grandeza, não só pelo seu reconhecido talento pessoal, que resultou numa obra inovadora, mas também pela função chave que desempenhará na legitimação dos exemplares arquitetônicos como verdadeiros espécimes brasileiros. Ao longo de sua extensa vida profissional – onde teve a oportunidade única de formar dupla com Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Rino Levi, Vilanova Artigas e outras estrelas de primeira e segunda grandeza de nossa arquitetura – Roberto Burle Marx percorreu caminhos variados, fez experiências diversas, mas sempre mantendo um valor originário – a de que o jardim é um artifício que deve reintegrar o homem à sua paisagem natural.
Os ensinamentos que recebeu ainda muito jovem de Lúcio Costa se incrustaram de tal forma em seu modo de ver o mundo que parecia não se dar conta do fato. Nas diversas entrevistas dadas – que é o material que dispomos diante de sua atitude refratária ao texto teórico –, as referências de Burle Marx ao velho mestre são sempre simpáticas, mas se restringem, em geral, ao comentário do episódio de sua iniciação profissional nas artes do paisagismo e à rica experiência da convivência pessoal, mas sem entrar no mérito das claras influências intelectuais. “Quando jovem, vivia na mesma rua que Lúcio Costa. Ele me conheceu quando eu tinha 14 ou 15 anos e esse fato contribuiu para minha carreira. Ele viu o jardim que eu realizava em minha própria casa e, como naquele tempo construía a residência de uma família Schwartz, convidou-me a fazer também aquele jardim” (4). Contudo, não há, no nosso entendimento, como compreender a fundo a obra paisagística de Roberto Burle Marx sem levar em conta o tributo devido a Lúcio Costa.
É recorrente nos textos sobre Burle Marx o papel decisivo que teve em sua vida a descoberta das plantas brasileiras apresentadas como espécimes exóticos em jardim berlinense. O episódio foi elevado à condição de mito formador pelo próprio paisagista, que se referiu ao fato diversas vezes: “Fiz uma viagem à Alemanha em 1928, onde vivi um ano e meio em Berlim. Essa viagem me influenciou muito. No Jardim Botânico de Dahlem, que era um jardim extraordinário, vi pela primeira vez, uma grande quantidade de plantas brasileiras, usadas pela primeira vez com objetivos paisagísticos. Nós, brasileiros, não às usávamos, por considerá-las vulgares. Compreendi então que, em meu país, a inspiração deveria se basear, sobretudo, nas espécies autóctones” (5). O quanto essa lembrança é fidedigna ou uma memória fabricada retroativamente não temos – infelizmente – como estabelecer. Mas é pouco provável que em 1928 as impressões de encantamento com as plantas autóctones brasileiras tivessem levado Burle Marx à convicção de uma utilização necessária. Afinal, há um passo a ser dado aqui: não é uma valoração plástico-paisagística que leva a uma utilização exclusivista, mas um julgamento mais fundo de conveniência, que acreditamos só ter sido possível na sua experiência ao longo dos anos 30.
Sua primeira obra profissional, o jardim da casa de Alfredo Schwartz, de 1932, colocou-o em contato mais íntimo não só com Lúcio Costa, mas também com Gregori Warchavchik (1896–1976), sócio do arquiteto carioca na ocasião. O arquiteto russo já havia anteriormente, em projetos residenciais construídos em São Paulo, dado grande importância ao jardim, contando aqui com a colaboração de sua esposa, Mina Klabin. Demonstrando que sua condição de migrante estrangeiro não o deixou imune às discussões em curso no modernismo paulista (6), acabou se enfrentando com o tema da brasilidade, mas de uma forma subsidiária pois lhe faltava tanto a vivência como o estudo sistemático em relação às questões abordadas. Já na mítica casa da rua Santa Cruz, de 1927-28, marco histórico de pioneirismo no transplante para o Brasil dos princípios da arquitetura moderna européia, teríamos dois elementos que atestam a preocupação com a tradição nacional e com a paisagem nativa – a varanda posterior e os jardins. A questão já foi abordada anteriormente por Agnaldo Farias:
“A fachada posterior com sua varanda formada pelo telhado esparramado, apresenta certa familiaridade com as construções tradicionais brasileiras, que não se pode advertir contemplando-se apenas a fachada principal. Warchavchik alega que justamente ali estaria, além do paisagismo realizado por sua esposa, Mina – paisagismo que, aliás, estaria sempre marcando uma expressiva presença nas obras futuras do arquiteto –, um exemplo da sua tentativa de construir uma arquitetura que se harmonizasse com a tradição do país.” (7)
Estas observações estão fundadas em alguns depoimentos da época e devidamente registrados por Geraldo Ferraz, responsável pelo primeiro estudo importante realizado sobre o arquiteto russo. Em 1928, Couto de Barros, redator-chefe do Diário Nacional, assinala a consonância entre a arquitetura e o jardim da Casa Modernista, destacando a autoria de Mina Klabin na concepção do arranjo de cactos e palmeiras que “dão ao conjunto uma nota feliz de tropicalismo e disciplina” (8). No ano seguinte, o pedagogo e idealizador do conceito de escola-parque Anísio Teixeira destaca em entrevista a brasilidade da obra: “nunca tive uma impressão mais forte da casa brasileira (...) como quando visitei a sua residência de linhas fortes e claras, construída toda de cimento, ferro e vidro, dentro de uma moldura de gigantescos cactos nacionais. A obra era brasileira porque era um consórcio inteligente entre o espírito do homem e as características da terra” (9). Mas será o próprio arquiteto, em artigo para o Correio Paulistano, que falará com mais propriedade das próprias intenções:
“Não querendo copiar o que na Europa está se fazendo, inspirado pelo encanto das paisagens brasileiras, tentei criar um caráter de arquitetura que se adaptasse a esta região, ao clima e também às antigas tradições desta terra. Ao lado de linhas retas, nítidas, verticais e horizontais, que constituem, em forma de cubos e planos, o principal elemento da arquitetura moderna, fiz uso das tão decorativas e características telhas coloniais e creio que consegui idear uma casa muito brasileira, pela sua perfeita adaptação ao ambiente. O jardim, de caráter tropical, em redor da casa, contém toda a riqueza das plantas típicas brasileiras.” (10)
A tênue preocupação com a tradição – tênue mas não desprezível, se levarmos em conta a presença da telha colonial de obras muito posteriores de arquitetos brasileiros – vai ser abandonada em suas obras posteriores, mas não a importância dada aos jardins, que passam a ser considerados um contraponto que acabariam valorizando pelo contraste as formas geométricas do projeto arquitetônico. Em carta datada de 1930 e enviada ao arquiteto Sigfried Giedion, secretário geral do CIAM, Warchavchik explica a função da vegetação em seus projetos: “os nossos aliados mais eficientes, pelo menos no Brasil, são a natureza tropical que emoldura tão favoravelmente a casa moderna com cactus e outros vegetais soberbos e a luz magnífica, que destaca os perfis claros e nítidos das construções sobre o fundo verde escuro dos jardins” (11). Esse papel dado à vegetação – de moldura tropical para o edifício moderno – tem um alcance muito restrito e alcançou nas mãos do casal Warchavchik um desenvolvimento acanhado, principalmente se compararmos anacronicamente com as posteriores soluções paisagísticas de Burle Marx. Contudo, a utilização da flora nativa com a clara intenção de acomodação regional da arquitetura moderna internacional, expressa em diversas ocasiões pelo arquiteto russo e visível para os intelectuais da época, foi solapada da compreensão evolutiva de nossa arquitetura com o claro intuito de reforçar a versão posterior de Lúcio Costa para o surgimento da “Arquitetura Moderna Brasileira”.
Um avanço no tempo se faz necessário. Em 1948, Geraldo Ferraz irá contestar o epíteto de pioneiro da arquitetura contemporânea no Brasil atribuída à Lúcio Costa e cobra do arquiteto carioca um depoimento para desfazer o que chamou de “falseamento informativo” e “escamoteação da verdade histórica” (12). Em tom panfletário, Ferraz advoga a primazia de Gregori Warchavchik e Flávio de Carvalho, que num ambiente cultural sem cultivo e hostil, enfrentando a ignorância sórdida dos detratores, teriam conseguido pensar e construir as primeiras edificações modernas no país. Seriam eles, ainda no final dos anos 20, os legítimos representantes brasileiros das vanguardas européias, cabendo a eles portanto a homenagem de pioneirismo. Lúcio Costa não fugiu da provocação. Sua resposta, contudo, foi desconcertante. Abandonando a polidez que lhe era característica, desloca por completo a argumentação ao afirmar que “arquitetura não é Far-West”, não adiantando, portanto, “perderem tempo à procura de pioneiros” (13). A questão essencial não estaria em se saber qual foi o primeiro edifício moderno ou qual arquiteto sofreu mais com a hostilidade conservadora ou reacionária, mas em verificar onde residia a colaboração qualitativa e diferenciada que daria à arquitetura moderna uma trajetória peculiar em nosso país. Surge aqui uma nuance que fará carreira vitoriosa nas cenas crítica e histórica brasileiras – de um lado, a arquitetura moderna realizada no Brasil, segundo os princípios estabelecidos na Europa, que foram importados e aplicados em bloco, e que poderia muito bem ter acontecido em qualquer outro país do mundo; de outro, a arquitetura moderna brasileira, algo inusitado e surpreendente, que vicejou única e tão somente aqui, encontrando formas e soluções plásticas inusitadas, ganhando por este motivo o interesse e os elogios da crítica estrangeira.
Nas duas décadas que separam os passos iniciais da introdução da arquitetura moderna no Brasil e a instauração da visão histórica de Lúcio Costa ocorreu o soterramento das intenções de “abrasileiramento” defendidas por Gregori Warchavchik. Mas, ao que tudo indica, tal formulação original não passou desapercebida ao jovem arquiteto Lúcio Costa. Recém saído das hostes neocoloniais, não havia ainda encontrado um caminho seguro a seguir dentro da cena moderna, e no qual vai dar os primeiros passos em 1934, com os croquis e memorial para a Vila Monlevade. Os projetos desses anos incertos, que Lúcio Costa chama significativamente de chômage (14), a maior parte não construídos, são resultados, segundo sua própria opinião, do estudo sistemático que faz dos baluartes da arquitetura moderna européia: “a clientela continuava a querer casas de estilo – francês, inglês, colonial – coisa que eu então não conseguia mais fazer. Na falta de trabalho, inventava casas para terrenos convencionais de doze metros por trinta e seis, – Casas sem Dono. E estudei a fundo as propostas e obras dos criadores, Gropius, Mies van der Rohe, Le Corbusier.” (15)
Observando os projetos das casas sem dono, de Mies van der Rohe pouco se vê – talvez apenas o caráter introspectivo, semelhante ao presente nas casas-pátio da década de 30 –, mas os desenhos mostram um Lúcio Costa familiarizado com o arsenal corbusiano, em especial os pilotis, e também com a rigorosa geometria de Gropius, mas no registro dado por Warchavchik – os volumes simples e homogêneos contrastando com a vegetação tropical adotado nas suas casas paulistas. Nas três casas sem dono de Lúcio Costa temos a presença assinalada e, em duas delas temos redes presas em pilotis, tal como adotaria em Monlevade, em 1934, e três décadas depois, no Pavilhão do Brasil na 13ª Trienal de Milão, em 1964 (16). Ainda nos anos 30 projetaria para seu cunhado a chácara Coelho Duarte segundo o mesmo encaminhamento, mas já demonstrando um visível maior controle dos elementos formais modernos e utilizando pela primeira vez o recuo do fechamento na planta inferior para a criação de uma varanda, fórmula repetida com grande êxito no Park Hotel São Clemente vários anos depois.
Roberto Burle Marx ensaia seus primeiros passos profissionais justamente nesse momento de incertezas e mudanças pelo qual passava Lúcio Costa, do qual, inevitavelmente, compartilhou. Convidado pelo próprio arquiteto carioca para ser professor da Escola Nacional de Belas Artes e para ser seu sócio em escritório no Rio de Janeiro, Gregori Warchavchik acaba exercendo sobre Lúcio Costa uma ascendência momentânea, mas significativa e certamente menosprezada pelos críticos e historiadores. Mais do que informar ao anfitrião carioca sobre soluções concretas da relação entre arquitetura moderna e paisagem brasileira, a experimentação já em curso do arquiteto russo assinalava o enorme desafio envolvido – tanto no aspecto conceitual como nos conhecimentos científicos necessários – desafios para os quais não estava preparado e jamais viria a estar. Com o passar do tempo, questões propostas pelo casal Warchavchik e que mereceram um tímido desenvolvimento – tradição brasileira e natureza tropical – vão se tornar centrais em Lúcio Costa e vai caber a seu pupilo, o jovem Burle Marx, o papel principal de enfrentamento de um dos desafios – integrar a arquitetura moderna na paisagem tropical. Coincidência ou não, em seu primeiro projeto paisagístico de maior significação cultural, Burle Marx vai se valer dos cactus – tão apreciado por Mina Warchavchik (17) – para obter o tão almejado selo de brasilidade em seu jardim.
Em 1935, na condição de diretor de Parques, subordinado à Diretoria de Arquitetura e Construções da cidade do Recife, Burle Marx vai projetar o Cactário Madalena para a praça Euclides da Cunha. Esta e outras propostas de jardins para Recife causaram uma enorme celeuma junto às elites locais e contava com a simpatia dos intelectuais modernos recifenses – Gilberto Freyre, Joaquim Cardozo, Cícero Dias e outros. Os conservadores, liderados por “Mário Melo, do Instituto Arqueológico do Recife, reagem ao que entendem ser uma tentativa de devolver a cidade para a selva”. Numa contenda onde os dois lados querem ocupar a mesma trincheira de defesa da brasilidade – repetindo curiosamente o confronto entre modernos e neocoloniais na década passada –, as armas usadas são muito distintas: enquanto Melo apela para o passado heróico local ofendido com a retirada de um monumento comemorativo, Burle Marx vai se defender dizendo que está “semeando a alma brasileira e divulgando o senso de brasilidade”. (18)
A defesa que Burle Marx faz da utilização do cactus no Recife não se baseia apenas em suas qualidades paisagísticas intrínsecas, mas sobretudo na sua adequação por ser nativa da região. Advoga, já na ocasião, a utilização quase exclusiva de espécimes locais, abrindo exceção apenas para situações onde houver grande semelhança entre o clima original e o do transplante (19). Mas no Brasil, onde o número de espécies autóctones de árvores e arbustos é infindável, não haveria razão para uso de plantas exóticas, cujo grande prejuízo é transformar o caráter da paisagem (20). Sua atuação no exterior muitas vezes provocou estupor ou mesmo decepção ao adotar o mesmo princípio, como é o caso do jardim que realizou em Viena em 1962 (21) e os Jardins da Exposição Internacional de Caracas (futuro Parque del Este) na segunda metade da década de 50. (22)
O princípio defendido pelo paisagista não pode ser confundido com um nacionalismo esquemático, pois prevê uma aprofundada observação do lugar específico aonde será implantado o projeto paisagístico. Então, dentro do mesmo país ou mesmo dentro de uma região geográfica pode haver incompatibilidades, como explica o próprio Burle Marx: “Eu creio que, para fazermos um jardim, temos que começar por entender o ambiente, o meio ambiente. Se eu faço um jardim para o Amazonas, esse mesmo jardim não pode servir para o Rio de Janeiro ou São Paulo. Temos que compreender que devemos utilizar plantas da natureza e, com elas, construir jardins feitos pelo e para o homem” (23). Muitas vezes pode haver um grande prejuízo quando o autor do jardim não consegue compreender a realidade natural do local, aquilo que não foi elaborado pelo homem, o que o impossibilitará de criar algo devidamente relacionado com o preexistente. É o que ocorreu, segundo Burle Marx, com um paisagista japonês contratado para realizar o jardim do Palácio da Alvorada, a residência oficial do presidente da República em Brasília, que não teria compreendido a paisagem brasileira, dando ao local um caráter paisagístico japonês. (24)
No entanto, as reações aqui e acolá contra os projetos de Burle Marx se fundam em gostos arraigados, que esperam de um jardim algo que não se conhece, gosto que mantém correspondência com o desenvolvimento de tradições específicas do paisagismo. Sempre haverá quem ache encantador a diferença – um parque exuberante de plantas tropicais no meio de uma cidade moderna de clima temperado ou então um parque com vegetação européia disciplinada com rígida geometria em meio ao caos urbano de uma cidade de algum país pobre e populoso. Cabe aqui uma pergunta que contém implicações diversas: por quê um jardim deve utilizar necessariamente plantas nativas da região? Ora, qualquer que seja a resposta, ela não conseguirá se restringir a aspectos paisagísticos estritos, pois não há como justificar que uma ambiência seja boa ou ruim, ou que as texturas resultantes de uma certa composição vegetativa seja bonita ou feia apenas pela preexistência ou não das espécies utilizadas na região. Os valores de onde se irradia o julgamento de valor encontram-se em outro âmbito, do qual seria muito difícil nos ocuparmos caso fôssemos obrigados a nos restringir às falas esparsas de Burle Marx e caso não tivéssemos a límpida explanação de Mário Pedrosa, que dedicou ao paisagismo ao menos dois artigos.
Num deles, chamado Arquitetura paisagística no Brasil e publicado no Jornal do Brasil em 09 de janeiro de 1958, Mário Pedrosa lembra a péssima reputação da natureza brasílica perante as gerações passadas: “o fato é que essa natureza natural, isto é, tropical e exuberante, não era bem vista pelos nossos avós. Dela se tinha medo” (25). Pedrosa retoma aqui os argumentos desenvolvidos por José Lins do Rego alguns poucos anos antes no artigo O homem e a paisagem, publicado na revista francesa L’Architecture d’Aujourd’hui. O literato paraibano trata de maneira sintética a acomodação do homem no território brasileiro desde a descoberta e colonização pelos portugueses. Em sua ótica, o que teríamos como constante na relação homem-paisagem em toda a história do Brasil seria uma reiterada impossibilidade de harmonia – “o homem se opunha à natureza”; “[vivia] em permanente luta com a paisagem”; “nada de carinho para com a terra”. A agressividade do meio, o predomínio da imponência e exuberância da mata tropical, o temor frente ao nativo tapuia, esses e outro fatores da mesma ordem, teriam caracterizado o habitat humano como um refúgio, um abrigo, uma fortaleza, ou seja, uma espécie locus apartado das avassaladoras forças naturais e preexistentes. “Era preciso, portanto, viver em permanente luta com a paisagem, que nos enchia de terror. A casa brasileira, no princípio, não foi uma morada, mas uma espécie de trincheira.” (26)
Este “terror” provocado pelo ambiente hostil seria uma constante na vida do colonizador, provocando uma sensação de perene estranhamento, de não pertencimento, que se materializa em uma acomodação no território que reflete fielmente a dimensão psíquica – sítios protegidos por paliçadas, muros e muralhas, mínimos territórios da cultura e civilização humanas, resguardados da natureza hostil e inclemente. A argumentação de Lins do Rego, por sua vez, recupera antiga concepção de Graça Aranha, o terror cósmico diante da natureza, tratada com pretensões filosóficas no livro ensaístico Estética da vida (27), publicado em 1921, mas que já tinha sido suporte narrativo para seu famoso romance Canaã de 1902, onde as ações e percepções dos personagens são condicionadas pelo meio natural:
“A floresta tropical é o esplendor da força da desordem. Árvores de todos os tamanhos e de todas as feições; árvores que se alteiam, umas eretas, procurando emparelhar-se com as iguais e desenhar a linha de uma ordem ideal, quando outras lhes saem ao encontro, interrompendo a simetria, entre elas se curvam e derreiam até ao chão a farta e sombria coma. [...] Se por entre as folhas secas amontoadas no solo se escapa um réptil, então o ligeiro farfalhar delas corta a doce combinação do silêncio; há no ar uma deslocação fugaz como um relâmpago, pelos nervos de todo o mato perpassa um arrepio, e os viajantes que caminham, cheios de solidão augusta, voltam-se inquietos, sentindo no corpo o frio elétrico do pavor...” (28)
A concepção mesológica abraçada por Graça Aranha, de grande influência no final do século XIX, adentra o século XX e perpassa a produção intelectual e artística brasileira, inclusive a moderna. Ela acalenta um desejo de harmonia e correspondência entre a natureza tropical e o homem que busca se aninhar em seu seio. O medo, o terror, precisava ser amainado e caberia à cultura e em especial a arte o trabalho necessário para esse fim. Se em Graça Aranha temos um desejo ou uma promessa, em José Lins do Rego já temos uma constatação. Ao primeiro coube participação destacada na Semana de Arte Moderna de 22, sendo um dos principais responsáveis pela adesão modernista à convicção mesológica que supõe íntima relação entre cultura humana e meio natural. O segundo, participante da terceira fase do modernismo brasileiro, momento onde a ânsia vanguardista já tinha sido substituída pela acomodação da literatura regionalista de extrato moderno, confere ao processo ocorrido dentro da arquitetura um final feliz. Entre um e outro – projeto de futuro e narrativa do passado – acontece a visita do arquiteto suíço-francês Le Corbusier ao Brasil e a instauração da Arquitetura Moderna Brasileira.
“Le Corbusier foi, portanto, o ponto de partida para que a nova escola de arquitetura brasileira pudesse se exprimir com uma grande espontaneidade e chegar a soluções originais. Como a música de Villa Lobos, a força expressiva de um Lúcio Costa e um Niemeyer foi uma criação intrinsecamente nossa, algo que brotou de nossa própria vida. O retorno à natureza, e o valor que vai ser dado à paisagem como elemento substancial, salvaram nossos arquitetos do que se poderia considerar formal em Le Corbusier.” (29)
A constatação de Mário Pedrosa percorre os mesmos argumentos. Durante o longo período que vai da colônia ao Império, os jardins que foram plantados pelos portugueses no Brasil refletiram a inadequação e a falta de intimidade do colonizador com a natureza. Eles – os jardins – eram “pedantes e artificiais, sem raça e sem vigor, sem a alma da terra que lá fora arrebentava, pujante e luxuriante, nos arbustos e plantas locais, nas flores selvagens dos campos e das florestas, as quais por vezes vinham até a beira do caminho, ali pertinho, bem defronte dos grandes jardins” (30). O questionável nos jardins exóticos não se encontra nas texturas, colorações, massas, volumes ou dos odores que abrigam, mas na inadequação entre homem e paisagem natural que expressam.
Seguindo o receituário modernista de Mário de Andrade e defendido por Lúcio Costa no âmbito da arquitetura, Mário Pedrosa entende que o paisagismo – tal como as outras artes – só tem sentido e ganha um estatuto superior se interpretar de forma coerente o caráter nacional. O paisagismo moderno brasileiro deveria expressar de forma harmônica a relação entre o homem brasileiro e a natureza tropical, utilizando-se como arte que é uma forma de expressão adequada, não se restringindo à aplicação de conhecimentos especializados recentes de ciências como a botânica, biologia e ecologia, ou de práticas ancestrais de horticultura e jardinagem. Assim como o conhecimento da língua coloquial e do folclore regional permitiu ao escritor uma expressão literária superior, ou o inventário de modinhas e cantos populares possibilitou ao compositor uma música elevada – casos exemplares de Mário de Andrade e Vila Lobos – o conhecimento sistemático e abrangente da flora brasileira e das especificidades ecológicas e climáticas constituiriam uma condição necessária, mas não uma condição suficiente, para a elaboração de uma arte paisagística relevante e adequada. E esse papel histórico necessário encontrou alguém que o encarnasse:
“Foi então que chegou Burle Marx, jovem, robusto, nativo, revolucionário, e acabou com todos esses preconceitos. Graças a ele, a arquitetura moderna brasileira encontrou seu ambiente, sua integração na natureza. E as plantas nacionais plebéias, como, por exemplo, os crótons nativos de que temos mais de uma dúzia de variedades, nos tons mais belos e transparentes, obtiveram carta de entrada nos novos jardins. E o pintor, em Burle Marx, viu logo, na riqueza desses tons, o material ideal para inaugurar no país uma verdadeira arte paisagística.” (31)
Se a matéria prima – no caso, a natureza – é brasileira, as idéias estéticas são fortemente marcadas pela modernidade européia. O conhecimento dos princípios formais da abstração pictórica e a sólida compreensão dos valores defendidos pelas vanguardas, aos quais Burle Marx teve acesso ainda na década de 20, o habilitaram a manipular e a codificar de forma apropriada os elementos naturais orgânicos e inorgânicos, transcendendo a situação original de natureza intocada e obtendo uma paisagem transformada onde homem e natureza se reencontraram. Assim, “o jardim de Burle Marx não se subordina à natureza, à arquitetura, ao lugar, à tradição, mas sua identidade existe em equilíbrio com eles” (32). Ou, agora nas palavras de Mário Pedrosa, Burle Marx “tende, antes a definir o espírito do lugar. Estruturando os espaços circundantes, procura o artista criar um contra-ritmo, que ao mesmo tempo isola a unidade arquitetônica para que ela se defina e expanda, numa espécie de acentuação ou complementação de seu partido e de seu programa, e a integra num todo com o meio ambiente, o clima, a atmosfera, a luz, a natureza, enfim”. (33)
O processo de criação artística em paisagismo mantém, portanto, uma completa simetria com as outras artes, segundo a velha forma de Mário de Andrade: um primeiro momento de levantamento extensivo da variabilidade de espécies existentes em estado natural e uma pesquisa aprofundada das relações que elas mantém entre si e com o meio onde vivem; e um segundo momento de elaboração formal, de criação estética, aonde a matéria prima disponível se eleva ao estatuto de arte segundo valores subjetivos ou objetivos do artista (34). É exatamente por esse motivo que Burle Marx vai reeditar as velhas viagens de estudos dos modernistas paulistas, agora não mais para conhecer fazendas e igrejas esquecidas nas vilas interioranas, mas para descobrir orquídeas e bromélias. Comentando uma expedição científica realizada pelo paisagista à Amazônia – viagem que dura 53 dias e passa, entre outros lugares, por Boa Vista, Serra do Caiapó, Cuiabá, Porto Velho, Manaus e Belém – a historiadora Vera Beatriz Siqueira faz o seguinte comentário, entremeado por passagens retiradas do relatório da expedição:
“O objetivo principal da expedição é ampliar o vocabulário jardinístico, através da descoberta de novas plantas, além de valorizar a flora brasileira, renovando o espírito dos viajantes europeus oitocentistas, tais como Von Martius, Saint-Hilaire e Gardner. A rotina austera de observação, coleta de espécies, documentação e catalogação, embalagem das plantas vivas, prensagem e secagem do material de herbário, aliada aos hábitos de dormir em acampamentos nos postos de gasolina e de fazer apenas duas refeições ao dia, contribuiu para acirrar o tom científico e aventureiro da viagem.” (35)
Colada na própria descrição do paisagista, a historiadora não se dá conta de que as semelhanças entre as expedições são grandes, mas também são as diferenças. As viagens dos naturalistas estrangeiros eram missões científicas de levantamentos, onde os envolvidos, quase sem exceção, objetivavam o trabalho de taxionomia das espécies encontradas, ou seja, a ampliação da classificação em curso dos seres vivos da natureza, no caso, vegetais. Evidentemente os resultados seriam utilizados nas mais diferentes áreas, inclusive a artística, mas a finalidade das viagens, do ponto de vista dos seus participantes, era muito objetiva e específica. No caso de Burle Marx, sua viagem é a primeira parte do seu trabalho – o trabalho de campo da coleta –, e a segunda, tão ou mais importante do que esta, se daria em prancheta, com desenhos e croquis, e in loco na implantação do projeto. Do ponto de vista cultural e histórico, as expedições dos estrangeiros, financiadas direta ou indiretamente pelos governos centrais, constituem a ponta avançada e aparentemente neutra do colonialismo europeu, enquanto que as viagens do paisagista brasileiro fazem parte dos esforços, empreendidos pelas elites intelectuais dos grandes centros urbanos, de desvendamento da realidade desconhecida do imenso interior do país. Se nos aspectos científico e aventureiro as viagens se assemelham, o mesmo não pode ser dito dos aspectos profissional, histórico e simbólico.
Se for para fazer um paralelo, seria muito mais oportuno, em nossa opinião, comparar suas viagens com as realizadas pelos modernistas paulistas na década de 20 e as dos arquitetos do SPHAN a partir da década de 30. Vera Beatriz Siqueira não faz qualquer ilação nesse sentido, como de resto não faz qualquer tipo de paralelo entre o procedimento estético de Burle Marx e os princípios desenvolvidos por Mário de Andrade e Lúcio Costa nas suas buscas pela brasilidade na cultura e na arte brasileiras. Salvo engano de nossa parte, o arquiteto carioca é mencionado uma única vez – episódio do convite para o jardim na casa Schwartz (36) – e o escritor paulista está ausente de seu livro. O que não deixa de ser integrante, afinal a discussão sobre a opção preferencial pela planta autóctone é uma presença constante na argumentação da historiadora e sua busca, em excursões ao ar livre, foi uma constante na sua vida.
Em setembro de 1965, durante uma expedição botânica no Morro do Chapéu, interior da Bahia, Burle Marx presenciaria a morte arquiteto paulista Rino Levi, com quem compartilhou durante anos da amizade e do prazer pelas viagens de estudo e coleta. Ao não dar atenção aos vínculos intelectuais existentes entre as jornadas exploratórias da tradição e da natureza, Vera Beatriz Siqueira obtém um resultado muito limitado sobre a genealogia da operação intelectual realizada por Burle Marx: ou ela não existe – seria ela uma geração espontânea ou uma invenção de sua lavra –, ou ela simplesmente não tem importância. Vale ressaltar que a historiadora aponta com clareza os dois momentos do trabalho do paisagista e aos quais nos referimos anteriormente: “articulam-se, portanto, dois procedimentos: o ecológico e o lingüístico. Por um lado, observar e respeitar a relação da planta com o seu habitat, seus processos de crescimento, germinação e florescimento; por outro, transformar cada planta em signo de um discurso plástico coerente” (37). Como descrição do trabalho isolado de Burle Marx, está perfeito!
A obra do mais importante paisagista brasileiro vai passar por mudanças no aspecto expressivo, mas o cerne vai permanecer sempre – a predileção pela planta autóctone. A hegemonia de uma visão mais ecológica do início, e que tem no conjunto de jardins recifenses sua grande expressão, vai cedendo aos poucos espaço para as preocupações formais cada vez mais alinhadas com a evolução das artes plásticas modernas na Europa. Já no início da década de 40, quando se ocupa dos jardins do edifício-sede do Ministério de Educação e Saúde, Burle Marx abandona as formalizações mais clássicas em prol da abstração. O próprio paisagista tem consciência da transformação, apesar de insistir em coerências retroativas: “Inicialmente meus jardins tiveram um enfoque ecológico. Mas esse enfoque é bastante relativo. Eu fiz, por exemplo, o jardim do MEC com umas manchas bastante abstratas, pois nessa época eu já conhecia Arp. De modo que não se pode dizer que meus jardins, mesmo nos seus inícios tivessem uma preocupação essencialmente ecológica” (38).
O paisagista Fernando Tábora, seu colaborador durante anos, tinha uma clareza maior da trajetória do mestre: “seu salto evolutivo do classicismo de Pernambuco para as amebas do MEC equivale aos mesmos passos dados pelos arquitetos da época, tal como Lúcio Costa no Brasil e Villanueva na Venezuela; do academicismo para a Modernidade. O valor de Burle Marx foi de ter dado o salto junto com eles” (39). A composição com formas livres, em geral ondas amebóicas coloridas que se expandem e reverberam nas massas vegetativas, passou a conviver com uma abstração geométrica mais rígida a partir de meados dos anos 50 e início dos anos 60. É bem provável que Burle Marx tenha assimilado, consciente ou inconscientemente, a crítica crescente que se fazia na Europa – Max Bill e Bruno Zevi, principalmente – à gratuidade da forma livre na arquitetura moderna brasileira. O endereço principal da crítica é Oscar Niemeyer, mas não seria de se estranhar que o paisagista tenha se incomodado com as observações ácidas e tenha adotado um novo arsenal formal, onde impera um controle mais rígido do projeto.
Burle Marx passou a compartilhar com Lúcio Costa, desde o início da sua vida profissional, um conjunto de valores culturais que convergem para a brasilidade, à qual os intelectuais deveriam consagrar, como um princípio ético, uma humilde obediência. Uma brasilidade virtual em muitos aspectos, que deveria ser conquistada e materializada com o trabalho sincero dos homens cultos, com os olhares sempre postos nos princípios herdados da tradição. Esta, por sua vez, era concebida como resultante da interação entre o homem e o meio físico natural, portadora portanto da alma profunda de um povo. São convicções de extrato romântico que tiveram forte presença na cultura brasileira desde a segunda metade do século XIX e das quais nosso modernismo não escapou. A busca de uma arquitetura moderna que fosse essencialmente brasileira é fruto dessas convicções mescladas com o ideário moderno originário da Europa, do qual nos abstivemos de falar pela restrição de espaço e por ser por demais conhecido. A síntese buscada por Roberto Burle Marx entre a brasilidade da flora e os princípios formais presentes na pintura moderna européia é análoga à integração entre tradição colonial e arquitetura moderna proposta por Lúcio Costa. Simetria que, longe de se tratar de uma coincidência fortuita, revela um profundo arraigamento no cenário arquitetônico brasileiro de idéias e princípios que compartilharam, o paisagista como um dos mais ilustres materializadores, o arquiteto como o mais importante forjador.
notas
1
O presente artigo, originalmente publicado na Revista USP, é amplamente baseado em GUERRA, Abilio. Lúcio Costa: modernidade e tradição. Montagem discursiva da arquitetura moderna brasileira, Tese de doutorado, Unicamp, Campinas, 2002.
2
PEDROSA, Mário. Arquitetura e atualidade. Dos murais de Portinari aos espaços de Brasília. São Paulo, Perspectiva, coleção Debates, n. 170, 1981, p. 267.
3
ARANTES, Otília Beatriz Fiori. Lúcio Costa e a boa causa da arquitetura moderna. ARANTES, Otília Beatriz Fiori e ARANTES, Paulo Eduardo. O sentido da formação. Três estudos sobre Antonio Candido, Gilda de Mello e Souza e Lúcio Costa. São Paulo, Paz e Terra, 1997, p. 126.
4
MARX, Roberto Burle. Depoimento. XAVIER, Alberto (org). Arquitetura moderna brasileira: depoimento de uma geração. São Paulo, ABEA / FVA / Pini, projeto Hunter Douglas, 1987, p. 300-304. Entrevista publicada originalmente em BAYÓN, Damián. Panorâmica de la Arquitectura Latino-Americana, Barcelona, Editorial Blume, 1977, p. 40-63. Em entrevista a Ana Rosa de Oliveira, muitos anos depois, ele volta a dizer praticamente a mesma coisa: “Eu tive sorte porque Lúcio Costa morava na mesma rua que a minha família. Eu o conheço desde os 9 anos. Se hoje tenho 82 e ele tem 90 anos... Isso lhe mostra o que o convívio com pessoas que conhecem... Uma lição de arquitetura do Lúcio é uma lição de mestre”. MARX, Roberto Burle. Roberto Burle Marx entrevistado por Ana Rosa Oliveira. Vitruvius, São Paulo, Entrevista, fev. 1992.
5
MARX, Roberto Burle. Depoimento. XAVIER, Alberto (org). Arquitetura moderna brasileira: depoimento de uma geração, p. 306. Em outra ocasião, afirmou quase o mesmo, mas dando os créditos ao botânico responsável: “Em Berlim, freqüentei assiduamente o Jardim Botânico de Dahlem. Esse, cujas coleções de plantas, agrupadas por Engler sob critérios geográficos, foram para mim vivas lições de botânica e ecologia. Foi ali onde pude apreciar pela primeira vez, de forma sistemática, muitos exemplares da flora típica do Brasil. Eram espécies belíssimas quase nunca usadas em nossos jardins” MARX, Roberto Burle. Roberto Burle Marx entrevistado por Ana Rosa Oliveira.
6
Gregori Warchavchik era concunhado do pintor russo Lasar Segall. Ambos judeus, acabaram se casando com as irmãs Mina e Jenny, da rica e culta família Klabin. O parentesco e o compartilhamento do ideário modernista os colocaram no circuito das discussões em curso e que tinham nos Andrades suas figuras de proa.
7
FARIAS, Agnaldo Aricê Caldas. Gregori Warchavchik: introdutor da arquitetura moderna no Brasil, Campinas, dissertação de mestrado, IFCH-UNICAMP, 1990, p. 16.
8
BARROS. R. Couto de. Diário Nacional, 17/07/1928. Apud FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a introdução da nova arquitetura no Brasil: 1925 a 1940. São Paulo, Museu de Arte, 1965, p. 26.
9
TEIXEIRA, Anísio. Como a inteligência nova do Brasil vê São Paulo, Diário da Noite, 22/10/1929. Apud FERRAZ, Geraldo. Op. cit, p. 27.
10
WARCHAVCHIK, Gregori. Correio Paulistano, 8/06/1928. Apud FERRAZ, Geraldo. Op. cit, p. 27.
11
Apud FERRAZ, Geraldo. Op.cit., p. 51.
12
FERRAZ, Geraldo. Falta o depoimento de Lúcio Costa, Diário de São Paulo, 01/02/1948. Republicado em COSTA, Lúcio. Sobre arquitetura (org. Alberto Xavier). Porto Alegre, Centro dos Estudantes Universitários de Arquitetura, 1962, p. 119-122. Em 1947, organizado pela revista Anteprojeto dos estudantes da Faculdade Nacional de Arquitetura, foi publicado um álbum – Arquitetura Contemporânea no Brasil – que reunia fotografias de projetos e obras construídas, procurando, em linhas gerais, mostrar o trabalho dos arquitetos brasileiros, principalmente a partir de 1940. Era dedicado "ao arquiteto Lúcio Costa, mestre da arquitetura tradicional e pioneiro da arquitetura contemporânea no Brasil".
13
COSTA, Lúcio. Carta depoimento, datada de 20 de fevereiro de 1948 e publicada n'O Jornal, de 14 de março de 1948. Republicada em COSTA, Lúcio. Op. cit., p. 123-128, e posteriormente em COSTA, Lúcio. Lúcio Costa: registro de uma vivência. São Paulo, Empresa das Artes, 1995. Trata-se de uma resposta ao artigo de FERRAZ, Geraldo. "Falta o Depoimento de Lúcio Costa", de 01/01/1948.
14
Chômage, em francês, significa tanto a situação de desemprego como a de inatividade. Lúcio Costa dá ao termo um significado muito próximo ao do ócio criativo defendido pelos modernistas Mário de Andrade e Oswald de Andrade.
15
COSTA, Lúcio. Chômage 1932–36. Lúcio Costa. Registro de uma vivência, p. 83.
16
Guilheme Wisnik faz interessante ilação sobre a presença das redes no Pavilhão Brasileira para a Trienal de Milão: “A rede, no Brasil, é ao mesmo tempo lugar de descanso e reflexão. É também um objeto artesanal dos mais finos, cuja tessitura denota um saber construtivo paciente e rigoroso. Suspensa pelo tensionamento de cabos, ela parece revelar, como num ready-made às avessas, a possibilidade de um lugar artístico em que a gratuidade significa, ao mesmo tempo, empenho, e em que chômage quer dizer produção e criatividade”. WISNIK, Guilherme. Lucio Costa. Entre o empenho e a reserva. São Paulo, Cosac & Naify, coleção Espaços da Arte Brasileira, 2001, p. 49.
17
“Os cactus, sem dúvida, juntamente com a vegetação parcimoniosa do paisagismo de Mina Warchavchik, iriam sempre valorizar as obras do arquiteto. Funcionando como esculturas, eles, com sua rigidez orgânica e sua aparência áspera, fazem contraponto com a assepsia geométrica da obra arquitetônica, como é o caso desta residência localizada na rua Itápolis, projetando nas superfícies limpas e brancas o nanquim recortado das suas sombras”. FARIAS, Agnaldo Aricê Caldas. Op. cit., p. 19.
18
Apud SIQUEIRA, Vera Beatriz. Burle Marx. Paisagens transversas. São Paulo, Cosac & Naify, coleção Espaços da Arte Brasileira, 2001, p. 18.
19
“A magnólia grandiflora é uma árvore da América do Norte. Pode-se usá-la na Argentina porque existem algumas plantas que vão bem com o clima e que dão a impressão que sempre existiram na paisagem”. MARX, Roberto Burle. Depoimento. Op. cit., p. 309.
20
Idem, ibidem, p. 309.
21
“Lembro-me de um jardim que fiz em Viena, no ano de 1962. As pessoas ficaram desiludidas porque pensaram que eu ia fazer – no centro da Europa – um jardim tropical. Que eu ia pôr orquídeas nos álamos, trepadeiras da selva subindo pelos pinheiros. É claro que não fiz nada disso, porque estou convencido de que cada clima tem a sua flora, cuja utilização tem que estar de acordo com o meio físico”. Idem, ibidem, p. 311.
22
“Recordo um fato, quando eu trabalhava no Parque del Este, na Venezuela. Havia gente que se aproximava para olhar, e cujo único comentário era: Isso é puro mato!”. Idem, ibidem, p. 311.
23
Idem, ibidem, p. 305-313.
24
Idem, ibidem, p. 308.
25
PEDROSA, Mário. Arquitetura paisagística no Brasil, 1958. Dos murais de Portinari aos espaços de Brasília, p. 282.
26
REGO, José Lins do. O homem e a paisagem. XAVIER, Alberto (org.). Depoimento de uma geração, p. 301. Publicado originalmente em francês na revista L’Architecture d’Aujourd’hui, Paris, n. 42-43, ago 1952, p. 8-14.
27
ARANHA, José Pereira Graça. A estética da vida. Rio de Janeiro, Livraria Garnier, 1921.
28
ARANHA, José Pereira Graça. Canaã, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 3. ed., 1981, p. 50-51.
29
REGO, José Lins do. Op. cit., p. 303.
30
PEDROSA, Mário. Arquitetura paisagística no Brasil, p. 283.
31
Idem, ibidem, p. 283.
32
OLIVEIRA, Ana Rosa de. A construção formal do jardim em Roberto Burle Marx. Vitruvius, São Paulo, Texto Especial Arquitextos, n. 004, jul. 2001.
33
PEDROSA, Mário. O paisagista Burle Marx, 1958. Dos murais de Portinari aos espaços de Brasília, p. 287.
34
A analogia do seu trabalho com a pintura e outras artes era usual no discurso de Burle Marx: “Não quero fazer um jardim que seja somente pintura. Mas também não posso deixar de reconhecer que a pintura influiu muito em minhas concepções de paisagismo. Trata-se de certos princípios, princípios gerais de arte, que estão indissoluvelmente ligados entre si. Essa é a coisa mais importante. Saber como estabelecer um contraste, como utilizar uma vertical, a analogia de formas, de volumes, a seqüência de certos valores. São princípios que se podem aplicar à música, à poesia. Sem esses princípios, creio que, simplesmente não se pode praticar qualquer forma de arte”. MARX, Roberto Burle. Depoimento. Op. cit., p. 307-308.
35
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Op. cit., p. 7. Em itálico, as passagens retiradas do relatório original de Burle Marx e entre aspas no texto da autora.
36
Idem, ibidem, p. 11.
37
Idem, ibidem, p. 33.
38
MARX, Roberto Burle. Roberto Burle Marx entrevistado por Ana Rosa Oliveira.
39
Entrevista de Fernando Tábora à Ana Rosa de Oliveira, 8/01/1997. Apud MARX, Roberto Burle. Roberto Burle Marx entrevistado por Ana Rosa Oliveira.
40
FERRAZ, Geraldo. Warchavchik e a introdução da nova arquitetura no Brasil: 1925 a 1940. São Paulo, Museu de Arte, 1965, p. 58.
41
SCHWARTZ, Jorge (org.). Brasil 1920-1950: de la antropofagia a Brasilia. Valência, IVAM Centre Julio Gonzalez / Generalitat Valenciana, 2000, p. 390.
42
SCHWARTZ, Jorge (org.). Brasil 1920-1950: de la antropofagia a Brasilia. Valência, IVAM Centre Julio Gonzalez / Generalitat Valenciana, 2000, p. 390.
43
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Burle Marx. Paisagens transversas. São Paulo, Cosac & Naify, coleção Espaços da Arte Brasileira, 2001, p. 65.
44
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Burle Marx. Paisagens transversas. São Paulo, Cosac & Naify, coleção Espaços da Arte Brasileira, 2001, p. 66.
45
OLIVEIRA, Ana Rosa de. Hacia la extravasaria: la naturaleza y el jardín de Roberto Burle Marx. Valladolid, tese de doutorado, Universidad de Valladolid, 1998.
sobre o autor
Abilio Guerra é professor da FAU PUC-Campinas, ex-editor da Óculum, atual editor de www.vitruvius.com.br e co-autor de Rino Levi – arquitetura e cidade (Romano Guerra).