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architexts ISSN 1809-6298


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português
Éolo Maia tinha muita pressa em acabar os seus projetos em andamento. O problema é que a própria vida é um grande projeto em andamento, que só é concluído quando tudo, inexplicavelmente, se acaba

english
Éolo Maia had a great hurry to end his ongoing projects. The problem is that life itself is a large ongoing project, which is only complete when all, inexplicably, it ends


how to quote

BRANDÃO, Zeca. Éolo Maia, um entusiasmo que se encerra. Arquitextos, São Paulo, ano 03, n. 029.09, Vitruvius, out. 2002 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/03.029/744>.

Ruth,

Acabei de ler as suas palavras sobre o Éolo e fiquei emocionado. Não sei bem porque, mas essas coisas batem mais forte quando a gente está longe de casa. Senti vontade de conversar com você e com todos aqueles que, como nós, tiveram a oportunidade de conhecê-lo. Considerando o assunto, o lugar mais adequado para esse encontro seria num boteco em BH. O bar do Pelé, talvez, onde certamente contaríamos com a agradável e imprescindível presença do Sylvio (de Podestá). Diante da impossibilidade, vai ter que ser nesse espaço virtual mesmo.

O acaso me fez encontrar, pela última vez, com o Éolo quando estive no Brasil em abril desse ano. Fui levado pelo João Diniz à uma festa e lá estava ele... Primeiro, o susto com o seu abatimento físico decorrente da luta contra a doença, que até então não sabia. Depois a surpresa ainda maior com o seu inabalado tesão pela vida. Sem fumar nem beber, falou a noite inteira sobre arquitetura. Percebi aí como o meu próprio interesse pela arquitetura, que imaginava ser grande, ficava pequeno junto ao dele. Senti-me feliz por estar em sua companhia e constrangido por não conseguir demonstrar o mesmo entusiasmo pelo tema.

No final da festa, ele se despediu me convidando para no dia seguinte irmos ao atelier do seu amigo, o artista plástico Amílcar de Castro. Ele queria que eu conhecesse o Amílcar e o seu trabalho, fonte de inspiração da sua proposta vencedora do concurso para a sede do Grupo Corpo (pois é, o Éolo ganhou concursos até aos quarenta e dois minutos do segundo tempo). Depois de uma longa e descontraída conversa com os dois, fomos apreciar as obras do artista expostas no atelier. Saí de lá meio leve e feliz da vida, um pouco pelo efeito do vinho delicioso que tomamos, mas principalmente por ter vivido aquela experiência.

Mas o meu encontro com o Éolo não acabou ai... “Agora você está pronto para conhecer de perto a nossa proposta. Sem esse papo com o Amílcar você não iria entender porra nenhuma. Amanhã a gente se encontra lá no escritório dos meninos”. Os meninos (Alexandre Garcia e Carlos Maciel) eram, juntamente com sua companheira Jô Vasconcellos, seus parceiros na proposta.

Chegamos, o João e eu, um pouco antes da hora combinada e começamos a subir as escadas. O escritório ficava no terceiro andar (se não me engano) de um prédio antigo sem elevador. O meu primeiro pensamento foi: como é que o Éolo consegue subir e descer todos os dias essa escada na condição física em que se encontra? Após alguns minutos, apareceram a Jô e logo atrás o Éolo, apoiado em sua bengala, ofegante, mas com um olhar de quem acabou de vencer mais um desafio. Assim que recuperou o fôlego, começou a apresentar o projeto em ritmo acelerado e com o seu usual entusiasmo. Parecia ser fundamental que eu entendesse rápido todo o processo de criação até chegar a proposta final. Como se eu fosse um cliente apressado ou mesmo membro de um júri e prestes a tomar a minha decisão. Lembro claramente da presença de um forte sentimento de urgência.

É incrível como eu simplesmente não fiz as conexões necessárias para entender o que estava vivenciando naqueles dias que passei em BH. Hoje, revendo a situação enquanto te escrevo, tudo faz o maior sentido. O Éolo tinha muita pressa em acabar os seus projetos em andamento. O problema é que a própria vida é um grande projeto em andamento, que só é concluído quando tudo, inexplicavelmente, se acaba.

Um grande abraco,

Zeca

nota

1
Email enviado à arquiteta Ruth Verde Zein após a leitura do artigo “Éolo Maia 1942/2002”, Texto Especial Arquitextos nº 148, setembro de 2002.

sobre o autor

Zeca Brandão é arquiteto e Professor Universidade Federal de Pernambuco – UFPE – e doutorando pela Architectural Association School of London – AASchool na condição de bolsista da CAPES

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029.09
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