A análise dos aspectos normativos que, em 1973, estabeleceram a RMSP aponta tendências importantes da gestão pública e das políticas territoriais no Brasil. Por exemplo: o aumento do grau de autonomia municipal, a transferência, da União para os estados, da competência de criação de regiões metropolitanas e o crescimento da participação da sociedade civil no processo de tomada de decisões. Entre outros fatores, tais tendências decorreram da redemocratização do Estado brasileiro, marcando o desfecho do período da ditadura militar iniciado em 1964 e a promulgação da “constituição democrática” de 1988.
Nesse contexto, a institucionalização da RMSP, em pleno regime autoritário, não pode permanecer um processo intocado como se, desde então, nada tivesse ocorrido. Para atender a constituição vigente, o ato normativo responsável por sua criação precisa ser profundamente revisto, seguindo, em linhas gerais, a redação do PLC 6/2005, comentado, anteriormente, na primeira parte deste trabalho. Ainda não votado na Assembléia Legislativa de São Paulo, o seu teor, relacionando-se à reorganização da RMSP, quando aprovado, tem chances de promover mudanças significativas no contexto normativo que a instituiu em 1973. Consequentemente, na gestão metropolitana.
Esta análise, apresentada em duas partes, buscou, na primeira delas, situar circunstâncias relacionadas à institucionalização de regiões metropolitanas no Brasil. Aqui, na segunda parte, se pretende discutir a natureza dessas alterações, a política territorial em curso e de que modo contemplam a complexidade do fenômeno regional na atualidade.
Tendências apontadas pela reorganização da Região Metropolitana de São Paulo
Caso fosse necessário indicar apenas uma referência sobre os aspectos normativos que melhor traduz as tendências da gestão urbano-regional-metropolitana em São Paulo, ela seria a LC 760/1994. De forma geral, podem ser considerados reflexos diretamente conduzidos pela constituição atual todos os dispositivos que, através desta LC, o estado de São Paulo passou a contar para os assuntos referentes à sua organização regional. Vejamos, pelo menos, cinco classes de reflexos.
1) Um princípio ordenador para a organização regional (art. 1º) (1)
O planejamento regional é, por excelência, o instrumento regulador da organização regional do território. Por seu intermédio, a constituição estadual objetiva alcançar uma diretriz invariavelmente incluída nos planos governamentais: desenvolvimento sócio-econômico e melhoria da qualidade de vida. Com ela, o mais difícil: redução das desigualdades sociais e regionais. O princípio está contido nos Princípios Fundamentais na CF/1988, como fundamento da República Federativa do Brasil: “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, III).
O tema justificaria uma obra inteira. Nunca se falará demais a respeito do assunto. Para a reflexão, “a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens” (2), mesmo porque, o capítulo que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos principia-se com o seguinte artigo: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)” (art. 5º, caput).
Na CE/1989 (art. 152, V) e na LC 760/1994 (art. 1º, V), a dialética desigualdade/diferença apresenta-se com a reprise do ditame sobre a “redução das desigualdades sociais e regionais”.
“A cooperação dos diferentes níveis de governo, mediante a descentralização, articulação e integração de seus órgãos e entidades da Administração direta e indireta atuantes na região, visando ao máximo aproveitamento dos recursos públicos a ela destinados” (LC 760/1994, art. 1º, II) – também correspondente na CE/1989, art. 152, II – é o dispositivo que estabelece o federalismo de integração como princípio formulador do planejamento e da gestão territorial.
2) Um princípio para a divisão territorial do estado (arts. 2º ao 6º)
O assunto, abordado anteriormente na primeira parte deste trabalho, trata das questões que envolvem a divisão parcial ou integral, e das três classes de unidades regionais.
3) Um princípio integrador de atribuições e competências do estado e dos municípios (arts. 7º e 8º)
O que se entende por “funções públicas de interesse comum” ao agrupamento de municípios integrantes da mesma região, fundamenta os casos em que o princípio da integração deve ser incondicionalmente prevalente em face de qualquer outra situação. Em síntese, são aquelas em que a LC organizou em torno da noção de “campo funcional” que extrapola o âmbito local das municipalidades (planejamento urbano e uso do solo, transporte e sistema viário regionais, habitação, saneamento básico, meio ambiente, desenvolvimento econômico e atendimento social). Da prestação de serviços ao uso de bens públicos, os campos funcionais definem-se na medida em que somente podem ser cumpridos no âmbito regional. Isto é, no âmbito que integra os municípios entre si, e estes com o estado e/ou com a união.
4) Um princípio organizador e representativo das entidades regionais de caráter metropolitano (arts. 8 a 19)
Configura-se na forma de Conselho de Desenvolvimento Regional, de caráter normativo e deliberativo, a ser criado em todas as unidades regionais. A diferença está nas regiões metropolitanas, em que esse conselho “(...) integrará entidade com personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, que será criada por lei com o propósito de integrar a organização, o planejamento e a execução – sem prejuízo da competência das entidades envolvidas – das funções públicas de interesse comum (art. 17, caput)”.
Quanto à representação das entidades regionais, a lei não prevê a participação da sociedade civil, restringindo-se a participação paritária do conjunto dos municípios em relação ao estado (art. 7ª, parágrafo único). No caso da reorganização da RMSP, essa representação poderá estar garantida. Há, nesse sentido, emendas do legislativo ao projeto de lei complementar 6/2005.
5) Um princípio para o processo orçamentário (arts. 20 e 21)
Prevê-se a regionalização orçamentária, o que sinaliza positivamente rumo à representação da sociedade civil na distribuição dos recursos do estado. Contudo, somente os planos plurianuais foram dotados dessa virtude (art. 20). A lei de diretrizes orçamentárias e o orçamento-programa anual ainda rezam a mesma cartilha. Por isso, há incertezas quanto ao alcance da política territorial do estado. Há indícios de que continue a ser praticado setorialmente.
Para o desenvolvimento das funções públicas de interesse comum, o espírito do federalismo de integração está presente na forma como devem viabilizar-se os recursos orçamentários: o estado e os municípios deverão prevê-los em seus planos e orçamentos (art. 21).
Para alguns, os avanços trazidos pela LC 760/1994 foram demasiadamente acanhados. Para outros, as conquistas não foram poucas, ainda mais se comparadas ao quadro constitucional da CF/1967/69. O fato é que há possibilidades de alterações nada desprezíveis que permanecem no desdém.
Um exemplo é o que se encontra no parágrafo único do artigo 1º da LC 760/1994, em que se menciona que o Estado “criará um Sistema de Planejamento Regional e Urbano, sob a coordenação da Secretaria de Planejamento e Gestão, com as finalidades de incentivar a organização regional e coordenar e compatibilizar seus planos e sistemas de caráter regional”.
Ora, um sistema dessa natureza é fundamental em face ao ritmo acelerado de modificações que se processam no território, e obedecendo às mais diversas causas. Desde as relacionadas à segurança pública, às catástrofes que demandam o serviço da defesa civil, às estratégias relacionadas ao desenvolvimento econômico e ao atendimento social. Outrora, a regionalização concebida em recortes ideais de regiões impunha-se não apenas com finalidade político-administrativa, como também pelas limitações técnico-operacionais existentes no momento. Atualmente, podem-se simular a organização e desorganização de regiões ao sabor das necessidades, e à natureza delas. Se perenes, ou transitórias. Esse é apenas um dos detalhes que podem influir na concepção de sistemas dessa espécie.
Também há o seguinte quanto às tendências da organização regional paulista: sua dinâmica de produção especial exige crescente atenção por parte do gestor público.
É notória a complexidade territorial do estado de São Paulo, exprimindo-se tanto do ponto de vista da organização espacial quanto da institucional. Aliás, uma acaba levando à outra. Por exemplo, a agudização da questão ambiental e, particularmente, a dos recursos hídricos, promoveu institucionalmente o surgimento das UGRHI e dos Comitês de Bacias. Outro exemplo. O impacto provocado com a Hidrovia Tietê-Paraná promoveu a institucionalização da Agência de Desenvolvimento do Tietê-Paraná (ADTP). São ainda numerosos os convênios e consórcios intermunicipais que tratam dos mais variados temas. Do turismo ao tratamento de lixo e ao fornecimento de contas de consumo de serviços públicos. Também não se poderá descuidar dos territórios sob regime de concessões, como os envolvidos com a privatização das rodovias e ferrovias e, nelas apoiadas, as redes de fibras ópticas (3). Na mesma linha de raciocínio, devem ser incluídas as diversas regionalizações adotadas pelas unidades descentralizadas da administração pública e do judiciário. Estas rebatem atividades setoriais díspares como, por exemplo, as regionalizações da agricultura, da educação, dos transportes e da segurança pública. Incluem-se, aí, as áreas abrangidas pelos conselhos de desenvolvimento como as do Vale do Ribeira, do Pontal do Paranapanema e do Vale do Paraíba. Há que se considerar também as regionalizações dos órgãos federais e do exército. Outro detalhe é a convivência de figuras regionais sobrepostas. Por exemplo. A região da Baixada Santista é, simultaneamente, Região Administrativa, Região de Governo e Região Metropolitana. A Região Administrativa de Franca, criada pela Lei 6.207/1988, e a Região Administrativa de Barretos, criada pelo Dec. 20.530/1983, são também Regiões de Governo. Parte dos municípios que integram a Região de Governo de Campinas compõem a Região Metropolitana de igual nome. Além disso, não se poderá ignorar:
- A prerrogativa da divisão territorial do estado, total ou parcialmente, em unidades regionais futuras.
- A possibilidade concreta de surgirem outras tantas articulações regionais, tais como agências, consórcios e cooperativas que resultarão não só da articulação espontânea e competitiva entre municipalidades e regiões, mas também como decorrências do avanço do processo de descentralização e do exercício da autonomia municipal. O Consórcio Intermunicipal do Grande ABC é um exemplo de um agrupamento de municípios com força de regionalização.
- As tendências atuais de organização espacial, particularmente no que diz respeito à expansão dos “sistemas de engenharia” (4) e ao avanço do processo de metropolização.
Com tais possibilidades de organização regional, cabe ao estado manter íntegra e funcional a organização de suas regiões, mesmo porque, é uma de suas atribuições constitucionais. Isso quer dizer que deverá haver uma concepção estratégica da organização territorial que, em atendendo as peculiaridades locais, não poderá perder de vista a totalidade espacial do território. Do contrário, sobrevirá o caos, ainda mais se forem incluídas as influências provocadas pelo mercado que, também, detém enorme força de regionalização.
Portanto, pode-se concluir pela importância da institucionalização de um sistema com essa natureza. O que se sobressai é a urgência da constituição de semelhante instrumento de gestão, através da criação, mediante lei, do Sistema de Planejamento Urbano e Regional, mas ele ainda não foi sequer formulado.
O estudo de caso da reorganização da RMSP desperta interesse não apenas porque ainda não está institucionalizada (5), mas porque se trata da maior e mais problemática região metropolitana do país. Tal revisão implica não apenas adequá-la institucionalmente ao que hoje preceitua a lei, como também quanto à sua própria configuração territorial.
Mas, sob o ponto de vista institucional, o que poderá significar a reorganização da RMSP?
Um primeiro ponto a ser considerado na readequação institucional da RMSP é que, no atual ordenamento jurídico, não é mais tolerável que a gestão metropolitana esteja apartada da própria organização regional do estado. Daí que, ao lado das aglomerações urbanas e microrregiões, as regiões metropolitanas configuram as entidades regionais a perfazerem a organização regional prevista no Capítulo II do Título IV da CE/1989 (art. 152). Sobre as entidades regionais devem pairar os mesmos princípios gerais de organização e qualquer diferenciação, salvo as expressas em lei, será, no contexto constitucional vigente, arbitrária. No passado, esse quadro não se configuraria, visto que as regiões metropolitanas eram criadas por força de lei federal. Desse modo, eram territórios estaduais legislados por lei federal.
Os conteúdos dos artigos 152 e 153 da CE/1989 estão necessariamente interrelacionados e os seus efeitos complementares, caso contrário não faria sentido estarem abrigados na mesma matéria constitucional. Trata-se, pois, da previsão de dispositivos recorrentes que implicam manter a integridade territorial do estado. Isso é vital para que se persigam os “objetivos, diretrizes e prioridades” da organização regional (CE/1989, art. 152, I a V; LC 760/1994, art. 1º, I a V) em, pelo menos, dois pontos de vista.
1) Sob o ponto de vista sistêmico, caso contrário não se preveria a prerrogativa do executivo criar, mediante lei, um “Sistema de Planejamento Urbano e Regional” com a finalidade de (a) “incentivar a organização regional” e (b) “coordenar e compatibilizar [os] planos e sistemas de caráter regional [do Estado]” (CE/1989, art. 152, parágrafo único; LC 760/1994, art. 1º, parágrafo único).
2) E com princípios gerais de divisão territorial, através de estamentos regionais em três níveis de complexidade e de complementaridade das funções públicas de interesse comum (CE /989, art. 153; LC 760/1994, arts. 2º ao 5º).
Recorde-se que a autonomia das entidades regionais é relativa e condicionada, não se constituindo um quarto poder. Portanto, é atribuição do estado manter a organização regional integrada e coordenada, sem o que se disseminaria o seu contrário: o caos, a desorganização regional.
Mesmo que se desconsidere o estritamente estabelecido pela LC 760/1964, é indispensável que a reorganização da RMSP se dê em bases integradoras e participativas (6). Em outras palavras, que sua reorganização atinja o nível legal mais pleno possível de descentralização, sob o risco da autarquia territorial que venha a representá-la não se revestir de legitimidade. E essa integração deve ser considerada tanto na organização interna da região metropolitana, quanto em suas interações com as demais unidades regionais do estado.
Historicamente, a integração metropolitana da Grande São Paulo no quadro urbano-regional paulista nunca foi completa. Ao contrário, a existência de instrumentos exclusivos para a gestão metropolitana provocou um isolamento relativo da Grande São Paulo em relação ao conjunto formado pelas demais regiões do estado. Também, considerando-se que as possíveis futuras unidades regionais certamente evoluirão a partir da regionalização administrativa historicamente construída, é fato que a RMSP apresenta um sério descompasso em relação às demais.
Desde o seu estabelecimento, a gestão metropolitana da Grande São Paulo não foi palco de nenhuma espécie de inovação, ao contrário do restante do estado que, entre outras peculiaridades, participou da gestão descentralizada ensaiada com a criação das Regiões de Governo na gestão do governador André Franco Montoro (1983-1987). Por isso, pode-se dizer, e com grande possibilidade de acerto, que o processo de integração entre estado e municípios está mais sustentado e vigoroso no “interior” do que na “capital”.
Também, há que se relembrarem dinâmicas e processos relacionados à regionalização paulista que remontam aos anos 1950. Para ater-se ao contexto mais recente, até meados dos anos 1990, havia, na Secretaria de Economia e Planejamento, dois grupos técnicos, duas porções territoriais do estado distintas, como também matrizes teóricas relativamente diferenciadas. Por um lado, o “interior”, através dos dispositivos do Dec. 52.576/1970, que dispunham “sobre as regiões que deverão ser adotadas pelos órgãos da Administração Pública”, e que tinham, na CAR, o seu principal órgão implementador (Dec. 54.548/1970). Por outro, a “capital”, através da LC 94/1974 que disciplinava a RMSP, tendo a Emplasa como seu organismo de planejamento.
O resultado é que a organização regional do estado ficou dividida. A gestão metropolitana da Grande São Paulo permaneceu isolada, tanto no que diz respeito às experiências práticas que marcaram a regionalização paulista como um dos mais importantes processos de descentralização administrativa no Brasil, quanto no que concerne à revisão de seu recorte territorial. Além do mais, em que pesem os escalões regionais estabelecidos em lei, as unidades regionais são definidas pela área de influência local exercida por seus centros urbanos, mas também pelo peso relativo que tais centros desempenham no conjunto da rede urbano-regional do estado.
Vale dizer, as unidades regionais são definidas pelo que representam em si, nos seus efeitos locais, mas também pelo que representam relativamente na totalidade territorial do estado. Por isso, além do que dispõe a LC 760/1994, poderão ser desde já considerados os efeitos futuros que, mediante lei, advirão com o Sistema de Planejamento Urbano e Regional, onde as unidades regionais, enquanto sistemas e sub-sistemas territoriais, interagem-se nas dimensões local, regional, estadual, como também, nacional e, até mesmo, global. Exemplo disso é o planejamento regional que envolve as regiões sob o impacto direto dos sistemas de transportes de caráter continental.
Agora, a propósito do recorte territorial, é possível afirmar-se categoricamente que a conformação espacial da RMSP é a mesma de há 30 anos? Qual seria seu “mapa” atual face às implicações espaciais do fenômeno da globalização? Aliás, o que se entende por metropolização, já que a interpretação do fenômeno é determinante para o entendimento do que atualmente é definido como região metropolitana em São Paulo.
De uma forma ou de outra, o fato é que a gestão da RMSP não pode ser pensada como uma “ilha”, mas, também, nas suas interações com as demais localidades paulistas (7). Isto é, inserida na rede urbano-regional do estado, em que as cidades desempenham um papel relativo junto às suas áreas de influência direta e no conjunto da rede urbana.
A importância desse tipo de análise reside no fato de que, não obstante o estritamente disciplinado sobre as regiões metropolitanas no artigo 3º, I a IV da LC 760/1994, há implícita, se não como norma, enquanto método de análise regional e como medida de ponderação, a necessária inter-relação com o conjunto da organização territorial.
Daí os desdobramentos do conceito de autonomia condicionada, onde a autonomia municipal é relativamente dimensionada face ao interesse regional, valendo a aplicação do mesmo princípio quando se tratar do condicionamento do interesse regional ao interesse do estado.
Para ilustrar as tendências atuais de organização regional do paulista a figura 1 apresenta a hierarquia funcional dos centros urbanos obtida em estudo realizado pela FIPE (8).
Pela inspeção visual desse mapa – onde foram desconsiderados os municípios atualmente integrantes da Região Metropolitana da Grande São Paulo – note-se o seguinte:
- os centros urbanos que desempenham papéis superiores na hierarquia funcional estão densamente localizados no entorno metropolitano.
- por outro lado, verificam-se áreas espacialmente desarticuladas, o que equivale dizer social e economicamente desfavorecidas. Por exemplo, Vale do Ribeira, Pontal do Paranapanema e partes do Vale do Paraíba do noroeste do Estado.
Os reflexos imediatos dessa tendência é o recrudescimento das desigualdades sociais e regionais, cuja redução está prevista como um dos objetivos da organização regional do estado, contando, para tanto, de instrumento técnico igualmente previsto em lei, ou seja, “o planejamento regional para o desenvolvimento sócio-econômico e melhoria da qualidade de vida” (CE/1989, art. 152, I; LC 760/1994, art. 1º, I).
A não ser que se considerem esses objetivos apenas como meras figuras retóricas, fadados a serem “letras mortas”, cabe ao estado estabelecer medidas planificadoras de efeito preventivo e corretivo.
Quanto à implicação que terá a institucionalização da RMSP nessa problemática é que o estado, ao delimitar ou arbitrar sob os seus contornos, restringindo-os ou ampliando-os, o fará paralelamente a uma concepção global e estratégica da organização regional. Não por acaso, pela LC 760/1994, caberá à Secretaria de Economia e Planejamento a expedição do certificado mencionado no artigo 6º, I, como também a coordenação do Sistema de Planejamento Urbano e Regional previsto no artigo 1º, parágrafo único.
A delimitação atual da RMSP, remontando aos anos 1960, pode ter sido bastante afetada. Pelo Dec. 48.162/1967, a RMSP tinha, em 1966, 6.895.538 habitantes. Em 2009, 19.917.608 habitantes (Seade). Evidentemente, esse comportamento demográfico alterou os seus padrões espaciais.
Acompanhando semelhante crescimento, o processo de urbanização também se modificou. Já não se fala mais em urbanização, mas, sim, em metropolização. Ou, ainda, “macrourbanização” (9). Aliás, o fenômeno de metropolização não pode ser compreendido apenas como restrito à formação de regiões ou áreas metropolitanas, tratando-se de um processo mais abrangente do que isto.
Ante essas evidências é possível admitir que os limites territoriais da RMSP foram significativamente alterados, abrangendo, inclusive, o chamado “entorno metropolitano”, principalmente em direção à Sorocaba, Jundiaí, Bragança Paulista e São José dos Campos. Resta, portanto, a pergunta: o que é a RMSP hoje? Segundo o PLC 6/2005, não houve qualquer alteração.
Mas não é bem assim. A configuração territorial e a dinâmica social vêm trazendo novidades tanto na forma quanto no conteúdo das regiões. Mesmo o sentido da gestão do território pode estar prestes a ser revista e amplificada. O exemplo da reorganização normativa da RMSP avança, mas não se encontra indícios de que esteja atenta à importância da política territorial no quadro de disputas e tampouco à complexidade do fenômeno regional no mundo contemporâneo.
Agenda da gestão metropolitana no Brasil, pistas para discussão
No presente período histórico, a dinâmica do fenômeno territorial vem se confirmando em outra totalidade. Suas condições atuais resultam da “unicidade técnica” – a serviço do projeto global de unificação econômica, que também é política e cultural (10) – e do tecido social – criado pelas relações orgânicas que os “homens lentos” constroem no contato cotidiano com as necessidades da sobrevivência, que igualmente se territorializam (11).
Na totalidade territorial do presente, o “território usado” (12) corresponde ao espaço efetivamente usado pelas empresas e pela sociedade (13). É território usado pelo mercado, como também território “praticado” pelos homens lentos. Além de concretizar racionalidades hegemônicas, ele é “prenhe das experiências daqueles que conquistam a sobrevivência em ambientes hostis e antagônicos” (14).
Nessa dimensão epistemológica do fenômeno territorial, os atributos que fizeram do conceito de região um categoria central das ações planificadoras, isto é, a região para fins de “ação e controle” (15), precisa ser revisto para revelar a dinâmica acelerada das transformações do mundo contemporâneo. No passado ainda recente, as temporalidades e mobilidades vagarosas que imprimiam maior durabilidade ao “edifício regional” evoluíram em novas racionalidades, mais dinâmicas e efêmeras, mas que não suprimem a região (16). Ela apenas muda de conteúdo. Ainda que o território usado, e não a região, possa melhor cumprir o papel de coordenação de ações setoriais que se espera das políticas de natrureza territorial – o que recomenda considerar o território usado como categoria central de análise da regionalização (17) –, o fato é que a região assume um grau de complexidade inédito, fazendo de sua aplicação prática na planificação uma temeridade. O que se pode pensar para ultrapassar tais dificuldades é a hipótese de que a “regionalização histórico-administrativa” esteja sendo sobreposta pela regionalização privada, pela planificação privada que produz uma espécie de “regionalização unificadora-complexa” (18), o que, por ora, não suprime nem uma, nem outra. Em termos práticos, o contorno clássico da RMSP explodiu e contempla atualmente a unificação de, no mínimo, as três unidades metropolitanas existentes no estado: São Paulo, Baixada Santista e Campinas.
Outro avanço necessário é a evolução do discurso normativo para além da racionalidade instrumental da gestão do território. A norma deve acompanhar a natureza dinâmica do fenômeno que pretende regular, e não o contrário. As funções públicas de interesse comum compreendem o interesse de todos, não de alguns. As regiões podem persistir desde que suas territorialidades resultem da prática social de todos os agentes que as animam. Tanto das empresas quanto dos homens lentos. O próprio conceito jurídico de descentralização administrativa (19) impõe esse caráter compreensivo da política territorial, que é pública.
Os possíveis históricos dos sistemas regionais podem rumar para outra regionalização, mais solidária e voltada à humanização da política. Afinal, o que se espera da lei é que traduza um projeto de sociedade. No caso, um projeto regional para o Brasil. Contudo, o que se tem presenciado no plano das políticas públicas territoriais?
Tome-se o caso das regiões metropolitanas brasileiras até a promulgação da CF/1988. Naquela época, havia nove. Hoje, são 26 (20). Claro que isso significa o avanço do processo de metropolização, mas o tema tem que ser examinado com maior cuidado. Por exemplo, o estado de Santa Catarina tem seis regiões metropolitanas. O estado de São Paulo, três. Levando-se em conta que São Paulo é mais urbanizado e o que possui a rede urbana mais concentrada do país, como explicar tal fenômeno?
Se atentar-se apenas à realidade própria de cada estado, há explicações. Ao propor a criação de seis regiões metropolitanas, o estado de Santa Catarina pressupõe uma expansão futura das áreas urbanas, fincando já, como estratégia, a concentração populacional em cidades. Mais especificamente, em grandes cidades. Mas por que a concentração populacional em grandes cidades está sendo vista como fatalidade? Que reflexos ela terá no modo de vida da população? É sabido que a densidade urbana elevada representa uma relação favorável no custo/benefício das infra-estruturas urbanas, mas com acentuada perda na qualidade ambiental das cidades (21). Por que, então, essa escolha? Há estimativas de que 80% da população urbana do país viverá em 10% das cidades brasileiras (22). Por que tal inexorabilidade? Há uma política territorial velada por detrás desse vaticínio ou ausência dela? O grau de urbanização do somatório da população dos 466 municípios que integravam as unidades metropolitanas brasileiras em 2000 era de 95%. No Brasil, 81%. Correspondiam a 8,4% dos municípios existentes na época, mas abrigavam 48% da população urbana do país.
E mais. O que é região metropolitana no Brasil? Mesmo que os estados tenham ampla liberdade para instituí-las, um fato não pode ser ignorado: é a natureza do fenômeno metropolitano. Desse modo, no Brasil, ou o conceito de região metropolitana é relativo ou não há, de fato, 26 regiões metropolitanas no país.
Outra questão: por que só as regiões metropolitanas estão sendo criadas? Não há exemplo de criação de aglomerados urbanos e microrregiões. Todos os estados concordam quanto ao que vem a ser uma microrregião: são geralmente regiões de baixo desenvolvimento, onde, de forma geral, a política recomendada é a promoção dessas localidades. Já com relação ao conceito de aglomeração urbana, tal como ocorre com o de região metropolitana, é extremamente flexível. Qual o significado dessa flexibilidade? A que corresponde? A quem interessa?
Além dessas discrepâncias, outras razões recomendam estudar mais atentamente a regionalização político-administrativa dos estados brasileiros. Das 26 unidades da federação, sete não dedicam sequer um artigo em suas constituições estaduais à organização regional dos respectivos territórios. Estariam esses estados em desvantagem? Por que o tema é tão bem regulamentado em certos estados e ignorado em outros? Observando-se o mapeamento das unidades metropolitanas brasileiras, é notório como reproduzem estratégia semelhante a da colonização portuguesa na ocupação prioritária da faixa litorânea (figura 2).
Por que a urbanização consolidada e a anterioridade histórica é fator condicionante da metropolização? Há relação com a disponibilidade de infra-estruturas?
Outro tema de relevância é a regionalização setorial relativamente bem sucedida nas áreas de educação, saúde, turismo e ciência e tecnologia. Aparentemente esses setores da administração pública caminham ao largo da organização regional dos estados. Há também, em profusão, exemplos de organizações regionais autônomas, tais como as dos consórcios intermunicipais e agências de desenvolvimento (23). Detalhe: organizadas localmente, tais arranjos têm grande força de regionalização. Os “sistemas de engenharia” (24) também têm essa virtude (25).
De toda maneira, há enorme variedade de processos de regionalização em curso. Uns podem conduzir a mais distorções na forma e no conteúdo regional do que outros, mas todos interferem na configuração e gestão territorial.
No estado de São Paulo, pesquisa revelou a existência de duas tipologias territoriais. Uma é caracterizada pela predominância de áreas rurais e por uma rede de cidades mais porosa para os padrões do estado. Outra constitui larga continuidade territorial interligando as RM da Baixada Santista, São Paulo e Campinas e, passando por Araraquara e São Carlos, inclui Ribeirão Preto, ao norte do estado. Essa região de cidades é formada por 132 municípios, dos quais 37 formam agrupamentos que reúnem 56% da população do estado em apenas 16% de sua área territorial. Tais municípios são responsáveis por 70% do valor adicionado e por mais de 90% das operações de crédito e operações bancárias do estado nesta última década (26). Então, o que se passa nesses outros 608 municípios? Há outro detalhe. No interior das cidades dessas massas urbanizadas, convivem, lado a lado, os “dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos” (27).
Em 2000, a porcentagem das pessoas residentes com 10 anos ou mais de idade com rendimento nominal mensal de até dois salários mínimos, incluindo-se os que se declararam sem rendimento, atingiu 47% do total nas RM de São Paulo e de Campinas. Nos 466 municípios que integram as unidades metropolitanas brasileiras foi de 66%. Logo, a grande geração de riqueza vem acompanhada por intenso processo de empobrecimento da população urbana, o que é mais acentuado nas grandes cidades e nas metrópoles, reforçando a tendência de acirramento de velhas desigualdades socioespaciais.
Para concluir, não é por acaso que os problemas socioambientais venham se agigantando a cada dia. O fenômeno de “periferização da pobreza” dá mostras visíveis de que tenha se acentuado. No início da década de 1970, a população favelada do município de São Paulo correspondia a 1% da população total. Em 1993, 20% (28). Supondo que essa taxa de 20% tenha se mantido – o que corresponderia a um cenário otimista – o município de São Paulo abrigaria, atualmente, mais de 2 milhões e cem mil pessoas em favelas (29).
E há mais o seguinte. As favelas tendem a ocupar duas situações distintas em São Paulo. “(...) Em locais próximos a potenciais mercados de trabalho (formais ou informais) e próximos às vias expressas e rodovias”, ou “(...) em áreas ambientalmente frágeis, como as áreas de proteção das represas Billings e Guarapiranga, ao sul e sudeste, e a Serra da Cantareira, ao norte” (30). Também, na RMSP, os dados censitários indicam que as maiores taxas de crescimento populacional no período 1991/2000 ocorreram na periferia da área urbanizada, com destaque aos setores localizados entre as represas Billings e Guarapiranga, ao sul do município de São Paulo (31).
Apenas para efeito comparativo, vejam-se os seguintes resultados indicativos do adensamento populacional ao redor de áreas de preservação de mananciais. Os resultados foram obtidos por intermédio da intersecção do mapeamento dos setores censitários da RMSP com buffers de 30, 500 e 1000 metros a partir das bordas das represas Billings e Guarapiranga (32).
Em 2000, estimava-se que, na faixa marginal de 30 metros (área de preservação permanente de mananciais, segundo o Código Florestal) moravam mais de 211 mil pessoas. Alargando para 500 metros, por volta de 500 mil; para a faixa de 1.000 metros, mais de 900 mil pessoas. Na mesma época – só para dimensionar o vulto do problema – o município de Campinas tinha 968 mil habitantes.
Considerando-se apenas os municípios banhados pelas represas, há Itapecerica da Serra, Embu-Guaçu, São Paulo, Diadema, São Bernardo do Campo, Santo André e Ribeirão Pires. A resolução dos problemas de preservação dos mananciais em São Paulo deve compreender, portanto, a compatibilização de interesses e o consenso de, no mínimo, sete municípios, e desses com o estado. Porém, é preciso levar em a conta a bacia do Alto Tietê, com sua população de 17,5 milhões de pessoas. Tem mais. Nessa região, a disponibilidade de água é de 400 m3 anuais por habitante. É inferior aos 1.500 m3, que, segundo a ONU, correspondem à situação crítica, e mais distante ainda do ideal – 2.500 m3/ano por habitante. Em conseqüência, o sistema Cantareira captura água da bacia dos rios Piracicaba/Capivari e Jundiaí, situada ao norte da RMSP. Na UGRHI dessa bacia moram mais 4,3 milhões de pessoas.
Em resumo. O equacionamento da questão dos recursos hídricos nessa porção territorial do estado de São Paulo envolve duas RM – São Paulo e Campinas, e sem considerar a área de influência de Jundiaí e Bragança Paulista – e a gigantesca comunidade de mais de 22 milhões de pessoas. Portanto, é impossível imaginar a dissociação do plano urbano do plano regional. Mesmo sob a ótica puramente instrumental, não dá mais para ignorar a imprescindibilidade do planejamento simultâneo em várias dimensões do espaço construído. Do bairro à região, para não falar do país.
Por mais técnico que às vezes pareça ser o planejamento das situações que envolvem ações integradas entre municípios, estados e união, ele está indissociavelmente relacionado à gestão do território, que é política. O equacionamento dos problemas se dá apenas no plano político e na gestão do território, mas compreendido como totalidade.
Conclusões
Forma e norma. A RMSP é prova contumaz das consequências do abandono da política e da gestão territorial. Por um lado, a imensa região de cidades dá mostras inesgotáveis de vitalidade social, cultural, política e econômica. De outro, a indigência com que se trata o quotidiano de milhões de cidadãos contribuintes.
Frank Lloyd Wright, o inventor da broadacre city – modelo urbanístico desprovido de centralidades, um lugar onde as propriedades dispersavam-se umas das outras e imersas na paisagem –, teria dito que o isolamento só é possível quando pode ser rompido a qualquer instante. Do mesmo modo, a vida quotidiana do homem comum, habitante desse maciço urbanizado chamado Grande São Paulo, só é moralmente aceitável se puder contar com o poder coordenador da política territorial do Estado.
Por suas dimensões, e em muitas naturezas diferentes, a gestão da RMSP pode servir como “instrumento medidor” do controle social. Tanto do Estado, quanto da sociedade civil. Aliás, a gestão metropolitana, analisada do ponto de vista de seus aspectos normativos, pode aprimorar-se a ponto de superar problemas estruturais. Por exemplo, a cultura conservadora e concentradora da minoria que centenariamente comanda o país, e a subserviência e o gosto por alcançar privilégios da maioria que constrói a nação.
Em pouco mais de 40 anos, houve um salto significativo na gestão metropolitana no Brasil. A análise da evolução do contexto constitucional que a envolve demonstra esse processo com facilidade. Claro que há enormes dificuldades a serem ultrapassadas, como também contradições que nem sequer foram ainda explicitadas. Porém, mesmo assim, houve melhorias.
Se, por um lado, o Estado não demonstra vivamente o interesse por uma política territorial de fato, para todos os lugares e para toda a gente, a sociedade brasileira avança em suas conquistas sociais. Prova cabal foi a superação do período militar e a construção coletiva de uma federação francamente libertária.
O epílogo não pode ser outro que não o de relembrar a importância do território como base do processo político. E quanto às normas, claro, elas produzem formas.
notas
NE
Parte 1 do artigo: SILVA NETO, Manoel Lemes da. Evolução e tendências da gestão metropolitana em São Paulo: aspectos normativos (parte 1). Arquitextos, São Paulo, n. 11.124, Vitruvius, set. 2010 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.124/3584>.
1
Artigo 1º – A Organização Regional do Estado de São Paulo terá por objetivo promover:
I – o planejamento regional para o desenvolvimento sócio-econômico e melhoria da qualidade de vida;
II – a cooperação dos diferentes níveis de governo, mediante a descentralização, articulação e integração de seus órgãos e entidades da administração direta, indireta atuantes na região, visando ao máximo aproveitamento dos recursos públicos a ela destinados;
III – a utilização racional do território, dos recursos naturais e culturais e a proteção do meio ambiente, mediante o controle da implantação dos empreendimentos públicos e privados na região;
IV – a integração do planejamento e da execução de funções públicas de interesse comum aos entes públicos atuantes na região; e
V – a redução das desigualdades sociais e regionais (LC 760/1994).
2
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. São Paulo: Ediouro, (1753) 1994. (Clássicos de bolso).
3
As redes de fibras ópticas terrestres são implantadas em canteiros de rodovias, nas ferrovias e em redes de distribuição de energia elétrica.
4
SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988, p. 80. (Geografia: teoria e realidade).
5
Desde quando enviado pelo governador, o PLC 6/2005 foi alvo de 59 emendas parlamentares, um substitutivo e uma subemenda substitutiva, que foram rejeitados pela Comissão de Assuntos Municipais da Assembléia Legislativa. Essa comissão incorporou as sugestões de 15 emendas, propondo outro substitutivo (SÃO PAULO (Estado). Emplasa. SIJUR. PLC 6/2005: parte 3 <www.emplasa.sp.gov.br>. Acesso em: 15 maio 2009).
6
TEIXEIRA, Ana Carolina Wanderley. Região metropolitana: instituição e gestão contemporânea; dimensão participativa. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008.
7
Observe-se que as interações restringem-se aos limites territoriais do estado, já que, esta abordagem, limita-se aos aspectos normativos. Isto é, não se poderá extravasar nas inter-relações que as regiões paulistas mantêm com as demais regiões brasileiras, o que seria, por definição, competência de interesse comum aos estados e à união. No entanto, do ponto de vista espacial, recorde-se que a definição de lugar, na qualidade de acontecer solidário, “se apresenta sob três formas no território atual: um acontecer homólogo, um acontecer complementar e um acontecer hierárquico. (...) O acontecer homólogo é aquele das áreas de produção agrícola ou urbana, que modernizam mediante uma informação especializada, gerando contigüidades funcionais que dão os contornos da área assim definida. O acontecer complementar é aquele das relações entre cidade e campo e das relações entre cidades, consequência igualmente de necessidades modernas da produção e do intercâmbio geograficamente próximo. Finalmente, o acontecer hierárquico é um dos resultados da tendência à racionalização das atividades e se faz sob um comando, uma organização, que tendem a ser concentrados. (...) Em todos os casos, a informação joga um papel parecido àquele que, no passado remoto, era reservado à energia” (SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo; razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996, p.132).
8
SILVA NETO, Manoel Lemes da. Organização urbano-regional do Estado de São Paulo. São Paulo: Fipe/USP, nov. 2000. Mimeo. (Relatório de pesquisa).
9
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. 5 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005, p. 87-89. (Coleção Milton Santos ; 6).
10
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à universal. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.
11
SANTOS, Milton. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. São Paulo: Hucitec, 1994, p. 84-86. (Geografia: teoria e realidade).
12
SANTOS, Milton. O retorno do território. In: SANTOS, Milton; SOUZA, Maria Adélia A. de; SILVEIRA, Maria L. (Org.). Território: globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec/Anpur, 1994. p. 15-16. (Geografia: teoria e realidade).
13
SOUZA, Maria Adélia A. de. Política e território: a geografia das desigualdades. FORUM BRASIL EM QUESTÃO. Brasília, jun. 2002. Mimeo.
14
RIBEIRO, Ana Clara Torres. Território usado e humanismo concreto: o mercado socialmente necessário. In: SILVA, Catia Antonia da et al. Formas em crise: utopias necessárias. Rio de Janeiro: Arquimeds Edições, 2005, p. 94.
15
CORRÊA, Roberto Lobato. Região e organização espacial. São Paulo: Editora Ática, 1986, p. 47-50. (Série Princípios).
16
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo; razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996, p.196-197.
17
SOUZA, ibid.
18
SILVA NETO, Manoel Lemes da. Regionalização histórico-administrativa versus regionalização unificadora-complexa: reflexões sobre as tendências da organização regional paulista. Tempo & Memória, São Paulo, ano 3, n. 4, p. 85-108, jan./jul. 2005.
19
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 608.
20
Correspondem aos municípios que integram as 26 regiões metropolitanas e regiões integradas de desenvolvimento e os respectivos colares metropolitanos ou áreas de expansão metropolitana.
21
ACIOLY Junior, Claudio; DAVIDSON, Forbes. Densidade urbana e gestão urbana. Rio de Janeiro: Mauad Editora, 1998.
22
HOTZ, Eduardo Fontes. A organização metropolitana pós-constituição de 1988. São Paulo em perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 4, out./dez., 2001.
23
KLINK, Jeroen Johannes. A cidade-região: regionalismo e reestruturação no grande ABC paulista. Rio de Janeiro: De Paulo Editora, 2001.
24
SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988, p. 80. (Geografia: teoria e realidade).
25
SILVA NETO, Manoel Lemes da. A questão regional hoje: reflexões a partir do caso paulista. In: Souza, Maria Adélia A. de. (Org.) Território brasileiro: usos e abusos. Campinas: Editora Instituto Territorial, 2003. p. 355-379.
26
SILVA NETO, Manoel Lemes da. Regionalização histórico-administrativa versus regionalização unificadora-complexa: reflexões sobre as tendências da organização regional paulista. Tempo & Memória, São Paulo, ano 3, n. 4, p. 102, jan./jul. 2005.
27
SANTOS, Milton. O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
28
TASCHNER, Suzana Pasternak. Compreendendo a cidade informal. SEMINÁRIO INTERNACIONAL COMPREENDENDO A CIDADE INFORMAL, 1995, Belo Horizonte. Anais... p. 57-76. Apud LEME, Maria Cristina da Silva. São Paulo: impactos atuais da modernização econômica e precarização das condições de vida. Red Iberoamericana de Investigadores sobre Globalización y Território, 2002 <www.cmq.edu.mx>. Acesso em: 6 set. 2009.
29
Segundo o SEADE, em 2009, a população do município de São Paulo corresponderia a 10.998.813 habitantes.
30
BALTRUSIS, Nelson; D'OTTAVIANO, Maria Camila Loffredo. Ricos e pobres, cada qual em seu lugar: a desigualdade socio-espacial na metrópole paulistana. Cadernos CRH [online]. 2009, vol.22, n. 55, p. 138.
31
SÃO PAULO (Município) Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente; PNUMA; Instituto Socioambiental. Projeto ambientes verdes e saudáveis: construindo políticas públicas integradas na cidade de São Paulo; Diagnóstico: caracterização populacional no município de São Paulo. São Paulo: PMSP, 2009, p. 3.
32
Sondagem do autor.
listagem das siglas utilizadas
CAR – Coordenadoria de Ação Regional
CF/1967/69 – Constituição Federal de 1967, com a Emenda Constitucional de 1969
CF/1988 – Constituição Federal de 1988
Emplasa – Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A.; originariamente, denominava-se Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo S.A. (LC 94/1974, art. 14, caput)
LC – Lei Complementar
PLC – Projeto de Lei Complementar
RM – Região Metropolitana
RMSP – Região Metropolitana de São Paulo
UGRHI – Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos
sobre o autor
Manoel Lemes da Silva Neto, arquiteto e urbanista, mestre e doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (FAU/USP) e especialista em Gestão do Desenvolvimento Regional pelo Instituto Latino-americano e do Caribe de Planificação Econômica e Social (ILPES), é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo do Centro de Ciências Exatas, Ambientais e de Tecnologias da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas)