Mais uma vez se perde um importante edifício modernista do Rio de Janeiro: a sede do Jornal do Brasil, projetada e construída pela equipe do escritório de Henrique Mindlin – com a participação de Giancarlo Palanti, Walter L. Morrison, Walmyr L. Amaral e Marc D. Foundoukas – em 1966; abandonado por muitos anos e logo vandalizado, está sendo totalmente deformado na sua adaptação para hospital do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO).
A mudança nas fachadas, realizada com paredes de alvenaria com pequenas aberturas como janelas, anulou a forma original caracterizada pelas faixas contínuas que definiam claramente lajes, peitoris e os elementos estruturais verticais. A fenestração horizontal contínua, recuada da estrutura, identificava o valor plástico do prédio. Assim, uma das principais obras da arquitetura brasileira dos anos sessenta não resistiu a persistente falta de sensibilidade dos políticos e das instituições responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio arquitetônico moderno.
É surpreendente a falta de respeito pelo edifício: o INTO pelo menos deveria ter assumido como exemplo os hospitais da Rede Sarah Kubitschek que, projetados por João Filgueiras Lima para uma especialidade médica similar, são exemplos de boa arquitetura hospitalar, reconhecidos internacionalmente.
É triste saber que a obra de Henrique Mindlin (São Paulo 1911; Rio de Janeiro 1971), falecido prematuramente, não tenha sido reconhecida na capital carioca, sendo ele um dos principais profissionais brasileiros de fama internacional nos anos quarenta e cinqüenta. Somente um edifício seu aparece no Guia dos Bens Tombados pela Prefeitura: a Associação Religiosa Israelita em Botafogo (1958-1963). Infelizmente o mesmo não aconteceu com outras obras importantes como as torres do Avenida Central (1958-1961); do BANERJ (1963-1966) e do hotel Sheraton (1968).
Estes edifícios representam no Rio de Janeiro, não somente a aplicação de uma linguagem “brutalista” baseada em estruturas de concreto armado, mas também o bom emprego de tecnologias avançadas de origem norte-americana para a construção de torres com estrutura de aço e fachadas de vidro curtain wall: o conjunto da Avenida Central, foi um marco na arquitetura carioca. Vale lembrar que a eficiente organização do seu escritório, baseado em sistemas funcionais utilizados nos EUA, deixou marcas indeléveis na prática profissional carioca.
Sem dúvida, a sede do Jornal do Brasil, tinha um maior destaque entre estes outros, primeiro, pela forma horizontal do bloco; segundo, pela pureza e nitidez da volumetria e da solução das fachadas, que com o recuo das janelas contínuas não necessitavam do brise-soleil; e terceiro pelas soluções técnicas utilizadas para a criação de uma estrutura de grandes vãos, e os sistemas de isolamento acústico que permitiam a coexistência das máquinas rotativas do jornal e os escritórios dos jornalistas e do sistema administrativo.
Desde a Perimetral, o edifício do Jornal do Brasil, no contexto de armazéns anônimos do porto, era uma visão de beleza arquitetônica que dominava na paisagem desta área deteriorada da cidade. Hoje, em 2009, conseguiram apagar a sua originalidade, marco da arquitetura brasileira dos anos sessenta, e transforma-lo em mais um elemento para construção da “feiúra urbana”, manifestação estética tão cara aos políticos cariocas.
notas
As imagens foram retiradas do livro: XAVIER, Alberto; BRITTO, Alfredo; NOBRE, Ana Luiza. Arquitetura Moderna no Rio de Janeiro. RioArte, Fundação Vilanova Artigas, Pini. SP, 1991. P. 127.
sobre o autor
Roberto Segre é coordenador do DOCOMOMO-Rio.
Roberto Segre Rio de Janeiro RJ Brasil