Adalberto Retto Júnior e Christian Traficante: No "Diary of a planner" (2002) o Senhor enfatizou, citando Pierre Bourdieu, que a construção do projeto e das políticas da cidade tornou-se em anos recentes um campo aberto, onde diferentes indivíduos com diferentes competências e experiências, com diferentes histórias e background culturais, interesses e poderes, ligações e relações com o resto da sociedade são legitimados a expressar as próprias interpretações e as próprias propostas. Por outro lado, hoje se fala também do declínio ou morte do urbanismo, ou mesmo do seu fim. O que o Senhor pensa destas afirmações e qual é o verdadeiro papel do urbanista nos dias de hoje?
Bernardo Secchi: Amo muito o teatro e amo muito a música; não pode surpreender portanto que freqüentemente eu me refira a imagens teatrais ou musicais.
O canteiro de obras da cidade me aparece como um local onde indivíduos com diferentes papéis, poderes e competências, que falam línguas específicas e entre eles alguns se encontram em um difícil diálogo; um local onde se formam assonâncias ou dissonâncias, ligações e pausas. Cada um neste diálogo traz a sua própria história, as próprias experiências e o próprio imaginário. A idéia modernista de poder reconstruir esta tumultuada conversa com um único critério de racionalidade é hoje impraticável, assim como seria a idéia de podê-lo reconduzir à observância de uma única autoridade real ou papal. Os planos construídos sobre esta idéia e sobre as retóricas que a sustentavam precisamente devem ser considerados planos do passado. Na ingenuidade deles desenvolveram contudo um papel importante e seria tolo e inculto não reconhecer quanto devemos á eles.
Tudo isso não decreta a morte do urbanismo, assim como a passagem do renascimento ao maneirismo, ao barroco e ao neoclássico não decretou a morte da arquitetura ou de outras formas artísticas. Os necrófilos prontos a declarar a cada dia a morte de alguma coisa, talvez tenham apenas matado a curiosidade do novo.
O que aconteceu foi simplesmente que, dentro de uma nova e mais ampla constelação de indivíduos, o urbanismo orientou sobre novos eixos a própria reflexão, redesenhou o mapa dos problemas, aceitando experimentalmente novas hipóteses.
Mas também este movimento não deve ser enfatizado mais do que o devido. O canteiro da cidade sempre foi um lugar onde se depositam objetos, técnicas, afirmações e imagens dotadas de diferente inércia e quem praticar hoje o urbanismo italiano, mas também a de diferentes países ocidentais, sabe que as ligações com os modos de fazer passados, os quais se consolidaram dentro de instituições, leis e imaginários, são muito mais fortes do que normalmente são considerados. Inovar não é destruir, fazer "tabula rasa", deve significar alguma coisa que se acrescente, modificando-a, àquilo que pré-existe.