A cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, com aproximadamente 800 mil habitantes, posição geográfica privilegiada no crescente comércio com a União Européia, turismo internacional em franca expansão, maior aeroporto da América Latina em construção, necessita de um Complexo Cultural à sua altura. Um conjunto cultural que não só atenda os moradores do Estado como espaço de expressão e desenvolvimento culturais, mas que também atraia visitantes nacionais e estrangeiros incrementando a economia visto que atualmente o turismo é a sua maior fonte de renda. As belas obras da Natureza, como as dunas, as falésias, a Mata Atlântica, o mar já são um forte atrativo. Um outro atrativo será uma obra do Homem: um Complexo Cultural que contemple todas as formas de manifestações artísticas (dança, música, teatro, pintura, escultura, cinema, poesia) a começar pela arquitetura. Um belo edifício, que considere todos os aspectos técnicos para as melhores performances artísticas e que seja a manifestação do espírito democrático, o desejo do gesto, a liberdade materializada.
O Edifício
As dunas e as falésias de Natal são um grande marco visual na paisagem da cidade. Aqui a natureza se torna fonte de inspiração e referência: a caixas cênicas dos quatro teatros são colocadas lado a lado no sentido do menor para o maior configurando uma íngreme e inclinada parede de concreto armado junto ao movimento constante da Avenida Prudente de Moraes, remetendo à verticalidade pujante das falésias.
Em tempos de espetáculos os transeuntes se aproximarão curiosos pela movimentação de caminhões na Rua de Serviços e docas: oba, hoje tem espetáculo! Este setor do programa foi locado sem constrangimento junto à Avenida Prudente de Morais e os moradores logo saberão da chegada de uma nova apresentação: caminhões, chafarizes ligados, iluminação diferente, um surpreendente espetáculo antes da própria apresentação. A grande empena, além de marco na paisagem e referência urbana, é também outdoor, uma grande base para a divulgação dos eventos programados, atividades culturais, projeção de imagens.
Atrás da “falésia” de concreto a surpresa: o céu brilhante, um resquício de Mata Atlântica. Uma cobertura levemente inclinada de vidro refletivo incolor pousa delicadamente no espelho d’água. Tem a forma sinuosa e em movimento como as dunas e está lá para abrigar as mais diversas expressões artísticas e folclóricas, feiras de artesanato, shows de música, protegendo o homem das intempéries e proporcionando conforto ambiental. As laterais do edifício são abertas e sua implantação está voltada para o sudeste, de onde vêm os ventos dominantes. Assim, a brisa é constante e o ar está em contínua circulação através do efeito chaminé proporcionado pelas grandes aberturas na cobertura. A vegetação e o espelho d’água com seus chafarizes borrifando gotículas de água contribuem para a criação de um ambiente agradável sob a cobertura, de modo ecológico e sustentável, eliminando a necessidade de climatização deste recinto.
Sobre as coberturas dos teatros de 200, 400 e 600 lugares estão as escolas de dança e teatro (voltadas para a generosa Praça, despertando a curiosidade e o desejo nas pessoas) e áreas administrativas em um primeiro piso e, num segundo piso, a biblioteca, bar, restaurante e jardins suspensos. Sobre a cobertura do teatro de 2.000 lugares estão as salas de ensaio, com acesso direto ao palco através de elevador privativo situado dentro da caixa cênica. Estas áreas citadas com programa específico e que necessitam de um maior controle da luz, são protegidos da irradiação solar por brises soleils metálicos voltados para o norte e dispostos sobre a cobertura de vidro fazendo um desenho sinuoso, na projeção do programa que abriga abaixo.
Sob o piso da Praça há dois níveis de estacionamento (totalizando 518 vagas) e sob as platéias do teatro estão as oficinas, áreas técnicas e camarins, todos com acesso ao palco e às docas através de escadas e monta-cargas situados no fosso do palco. Conectando todos os recintos temos dispostos em lugares estratégicos núcleos verticais de circulação compostos por torres metálicas e passarelas plugadas no concreto dos teatros.
A Estrutura
O corpo semi-enterrado do edifício composto das quatro salas de espetáculos mais o programa anexo foi projetado em concreto armado aparente. As coberturas dos teatros são constituídas de lajes nervuradas de concreto que vencem as grandes larguras e apóiam parte do programa. As platéias são sustentadas através de pilares que seguem a malha estrutural do subsolo: 7.50 X 8.00m.
O primeiro pavimento, formado pelas escolas e áreas administrativas e que faz a transição entre o piso térreo e o da biblioteca e restaurante, tem a laje constituída por uma bandeja metálica. Para apoiá-la, utilizamos a laje de cobertura das salas de 200 e 400 lugares, pendurando o piso através de tirantes metálicos dispostos numa malha de 7,50 X 8,00m e ancoramos a bandeja nas paredes de concreto adjacentes.
Os pisos dos estacionamentos e da Praça são também constituídos por lajes de concreto e estão apoiados em pilares dispostos sob malha estrutural 7,50 X 8,00m. Em alguns desses pilares, mais robustos, nascem os pilares metálicos que vão apoiar a estrutura da cobertura. Eles são formados por um conjunto de braços metálicos inclinados que, distantes entre si 22,00m diagonalmente, se abrem e buscam as treliças metálicas espaciais da cobertura. Estas treliças metálicas compõem a malha principal da cobertura e vencem vãos de 15,00m em um sentido e 16,00m no outro. Uma malha secundária constituída de vigas-vagão metálicas completa o conjunto para apoiar a cobertura de vidro.
A Acústica
Duas preocupações distintas e que se complementam serão adotadas para obtermos uma adequada qualidade acústica nas salas do Teatro de Natal: externamente estão isoladas do meio ambiente, funcionando como uma caixa totalmente estanque e impermeável a sons e vibrações vindos tanto de fora como entre elas e internamente serão providas de uma adequada difusão dos sons refletidos em suas superfícies.
A construção sólida semi-enterrada em concreto armado com paredes de grande espessura e a separação entre elas por paredes espessas de concreto já garantirá por si só o isolamento acústico, potencializado pelo fechamento de portas e painéis acústicos.
Garantido o isolamento acústico de sons provenientes de fontes externas, resta-nos o trabalho de promover o melhor aproveitamento acústico dos sons produzidos internamente para os mais variados eventos. Isso se dará através de uma condição de reflexão sonora multidirecional das superfícies dos seus vários elementos componentes, tais como pisos, paredes, balcões, frisas, painéis acústicos e acabamentos.
A Iluminação
Dotar os espaços dos recursos cênicos necessários para as mais diferentes apresentações sejam orquestrais, teatrais ou de dança impõe toda uma vestimenta cênica a ser prevista para os palcos e toda a iluminação com os recursos que a tecnologia hoje oferece e que em função dos custos que o empreendimento pode suportar serão mais ou menos sofisticados.
Há a opção de dotar esses espaços da devida infra-estrutura e sempre que ocorrerem os espetáculos ser realizada a locação dos refletores e mesas de controle. Este é um fator que deve ser levado em conta porque não passa a ser um investimento total de obra. Na maioria das vezes seria projetada uma iluminação cênica básica, para uma apresentação orquestral, uma premiação, um congresso, um evento onde a iluminação do palco se diz de nível geral a um determinado valor suficiente para realizar esses eventos e sempre de caráter dimerizável. Não só as apresentações cênicas, mas todos os auditórios podem se revestir de condições de uso do tipo congressos, grandes seminários ou até mesmo cursos com grande participação de ouvintes, então também a iluminação ambiental agora assume outra conformação. Não só deve ser ela controlável para permitir vídeo, projeções (dimerização) como também oferecer climas e alternativas de cenários diferenciados: ora uma luz de trabalho, mais branca, onde há uma intensificação dos participantes na escrita, na leitura, hora de um caráter mais intimista na apresentação de um grande palestrante tornando a atmosfera mais quente. Isso requer pelo menos a participação de dois sistemas de iluminação alternativos, quase sempre dimerizáveis.
Evidente que em um espaço grandioso com a grande participação de pessoas os cuidados com a iluminação de emergência vão estar prescritos. Não só iluminação de emergência de segurança para eventuais saídas de fuga, balizamentos e com a sinalização apropriada como também um sistema de iluminação de vigília para permitir o trânsito das pessoas durante as apresentações, seja junto ao mobiliário (incorporado às poltronas), seja através de balizamentos de piso (incorporados às paredes), quase sempre com fontes de luz de muito baixa potência.
Vamos lembrar que por serem espaços grandiosos todos esses sistemas alternativamente ofertados até então não são os mais apropriados para manutenção e montagem dos espetáculos nas salas. Um sistema de serviço mais econômico operacionalmente deverá ser prescrito no sentido de dar efetividade às ações de limpeza, rearranjo das poltronas e montagem dos eventos propriamente ditos.
Do ponto de visto da iluminação, especialmente considerando o foyer desses espaços, também deve haver um enobrecimento através da luz, associada à valorização de obras de arte. Artistas locais poderão ser convocados para efetivar uma referência do espaço integrando arquitetura, arte local e tudo relativo à performing arts pode ser considerado.
Toda a iluminação estará pautada pelo uso de fontes economizadoras de energia que vão colaborar não só na operação econômica do sistema de iluminação do conjunto edificado como também vão permitir a adoção de lâmpadas com longa vida útil para que períodos de manutenção sejam os mais delongados possíveis. Quando se elegem fontes alternativas e de grande desempenho e baixo consumo quase sempre temos também contribuições favoráveis na redução da carga térmica devido ao sistema de iluminação, o que favorecerá o dimensionamento mais apurado do sistema de ar condicionado. Uma proposta criteriosa dada a extensão do espaço com acionamentos parciais invocando a temporalidade do uso também se fará prescrito enquanto intenção de projeto de modo a favorecer, por exemplo, o uso de áreas de circulação ou de apoio sem efetivar o acionamento de áreas que num dado momento não estariam ocupadas. Essa programação de acionamento criteriosa leva a economias do ponto de vista operacional.
A Climatização
Para condicionar as quatro salas mais as áreas de camarins e oficinas localizadas no subsolo adotamos unidades condicionadoras do tipo fan-coil. Para a sala de 2000 lugares teremos dois fan-coils de 77TR, para a de 600 um de 70 TR, para a de 400 um de 30 TR e para a de 200 um de 15 TR. A distribuição do ar nas salas será realizada através do insuflamento do ar pelo piso, com difusores distribuídos ao longo da platéia. Para garantir o isolamento acústico destes equipamentos com as salas será utilizado um sistema de atenuação acústica. A tomada de ar externo para renovação do ar e manutenção da pressão positiva interna será feita através de abertura de 8m2 localizado na fachada Nordeste.
A água de Natal é alcalina, portanto não é adequada para alimentar os equipamentos de ar condicionado, pois a tubulação sofre após três anos o fenômeno da incrustação, que resulta na diminuição do seu diâmetro interno, havendo a necessidade de manutenção contínua para que os equipamentos funcionem adequadamente. Sendo assim, optamos pela utilização de dois chillers de condensação a ar de capacidade nominal de 129 TR cada um.
Todos os demais recintos do edifício se abrem para a grande Praça coberta e recebem os ventos de todas as direções e principalmente os predominantes vindos do sudeste, fazendo com que não haja a necessidade de condicionamento artificial. Há a possibilidade de todos os recintos serem condicionados futuramente, pois há shafts distribuídos estrategicamente e que proporcionarão o encaminhamento de futuras instalações.
O Conforto Ambiental
A grande cobertura de cristal sobre a Praça central será constituída por painéis de vidro de segurança laminado refletivos incolores para o controle solar. Ela será inclinada e com sua aerodinâmica voltada para o sudeste, donde provêm os ventos dominantes.
A ventilação deverá ser otimizada para permitir a retirada do calor do interior do ambiente. Para favorecer a obtenção do conforto térmico esta cobertura será dotada de grandes aberturas zenitais conjugados com a total ausência de fechamentos laterais.
Abaixo das aberturas estarão praças arborizadas cujas árvores terão as copas densas que atravessarão os rasgos na cobertura, protegendo os vidros e fazendo sombra para os usuários. Além disso, um grande espelho d’água e chafarizes proporcionarão um clima agradável ao ambiente.
Este conjunto formado pela cobertura de vidro refletivo, pelo espelho d’água, o borrifamento das águas dos chafarizes, a sombra das copas das árvores e a ação dos ventos constantes tornarão este ambiente agradável.
Na projeção das áreas onde estão o restaurante e biblioteca bem como sobre as salas de ensaio, mesmo sendo espaços também favorecidos pelos ventos e brisas, adotamos brises soleil dispostos sobre a cobertura de vidro e voltados para o norte, proporcionando um maior controle da incidência e radiação solares.
ficha técnica
Autores
Frentes / Arquitetos Juliana Corradini e José Alves
Colaborador
Ricardo Canton
Consultor de climatização
Eizo Kosai
Consultor de iluminação
Antônio Carlos Mingrone
Planilhas e Orçamento
Mauro Zaidan