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architexts ISSN 1809-6298


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Organizador do Ciclo Cinemacidade, ocorrido na PUC-PR em maio de 2004, o autor faz a apresentação dos textos apresentados no evento


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DUARTE, Fábio. Cinemacidades. Arquitextos, São Paulo, ano 05, n. 053.00, Vitruvius, out. 2004 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.053/532>.

Aproximar o cinema da cidade, aproximar a linguagem cinematográfica da dinâmica urbana pode ser uma forma instigante de pensar sobre um objeto a partir de suas representações – no diálogo sempre enriquecedor que privilegia o entre, principalmente quando esse diálogo entre o um e o outro faz-se com uns e outros tão múltiplos e mutáveis em si mesmo: diferentes cidades no espaço e no tempo representadas por obras cinematográficas igualmente variadas.

Porém, o parágrafo acima ganharia relevância independendo da linguagem que representasse a cidade. O que o cinema tem particular neste diálogo é que sua origem histórica está muito próxima do início da industrialização com tendência planetária que se inaugurava no final do século XIX. Tendencialmente planetária pois infiltrando em todos os âmbitos sociais, culturais e econômicos, tanto na lógica do mundo agrário quanto do comercial: a industrialização estaria no âmago da sociedade urbana, como defendeu Henri Lefebvre nos anos 1960.

E o cinema é a primeira forma de arte industrial – não apenas arte técnica, como já o era a fotografia, pelo aparato instrumental que envolvia na representação do mundo; mas arte industrial, envolvendo equipes de produção com tarefas distintas, sem conhecimento mútuo ou domínio do processo total ou consciência do produto final: a linha de produção internalizada no processo artístico, do argumento ao storyboard, do cenário à atuação, da iluminação à comercialização.

O cinema e a metrópole industrial desde o início têm um fascínio mútuo, com momentos laudatórios, outros críticos, uma hora cenário, outra personagem. De qualquer modo, o cinema pode sempre instigar a cidade ver-se pelo olhar do outro – não encarar o cinema como um espelho, mas como um prisma, não para ver o objeto refletido no filme, mas usar o filme para ver através da cidade a sua pulsão urbana.

Essa foi a intenção e desafio da 1ª Mostra Cinemacidades, realizada pelo Grupo de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná em 2004.

Para esta primeira edição escolhemos quatro temas, e para cada tema, um filme: Cidade e as máquinas, Cidade pós-futurista, Cidade Vigiada e Cidade Consumida.

Em Cidade e as máquinas, a semioticista Roti Nielba Turin, professora da USP e da Unicenp, tomou dois filmes, Metrópolis, de Fritz Lang (1926) e Tempos Modernos, de Charles Chaplin. É o início do século XX. As cidades transformavam-se com a velocidade da industrialização e tomavam suas feições. A industrialização infiltrou-se no imaginário das pessoas, tendo de um lado os humanos tornados reféns em um mundo controlado por engrenagens e máquinas inteligentes (Lang), e de outro (Chaplin) o homem tentando desajeitadamente controlar essas máquinas e, ao mesmo tempo, e desabusadamente, invertendo as possibilidades controladoras das máquinas explorando as falhas intrínsecas ao sistema.

Salvador Gnoato, doutor em arquitetura (USP) e professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da PUCPR toma o filme Blade Runner (Ridley Scott, 1982), para falar sobre a Cidade pós-futurista [GNOATO, Luís Salvador Gnoato. "Blade Runner. A cidade pós-futurista"]. É a falência do urbanismo moderno, e o termo escolhido por Gnoato, Pós-Futurista, empresta o seu nome do movimento italiano dos anos 1910, e seus anseios de expressão da era da máquina, para uma realidade que não correspondeu as utopias do início do século XX. A ficção imaginada em Los Angeles de 2019 por Scott, e a perspectiva de 22 anos após o lançamento do filme, permitem avaliar muitas realidades que já aconteceram, como o contraste entre o caos das ruas degradadas e o ambiente intimista dos apartamentos. Convivem também diversos sistemas de circulação, altamente tecnológico no espaço e tradicional na superfície. A pop-art na escala da cidade, antecipa o projeto de Rem Koolhaas (1989), para o ZKM Center for Art Media Technology. Blade Runner representa também as críticas pós-modernas do esgotamento da cidade funcionalmente planejada.

A Cidade vigiada foi o tema de Rosa Moura, geógrafa do IPARDES, que se baseou em Show de Truman, de Peter Weir [MOURA, Rosa. "A cidade vigiada. The Truman Show, de Peter Weir, 1998"]. Vinte anos depois de 1984, de George Orwell, parábola sobre o totalitarismo, o Grande Irmão permanece onipresente na ficção e na realidade. Recoloca-se na figura de Christof, que concebe, produz e conduz Truman em todos os momentos. Ao criar o espaço/set – seu panopticom –, refaz a história e a memória, moldando a ideologia na qual atém o personagem. Que relações existem entre Seahaven e as cidades deste início de século? Em que sua dinâmica pré-concebida reproduz o atual modo de planejar e gerir os espaços urbanos? Por que a prevalência de um pensamento hegemônico exige o acirrado uso da técnica para garantir constante a vigilância sobre a cidade? O ser vigiado vislumbra saídas? Atira-se por uma porta que o liberta, mesmo que ao escuro, de um mundo previsível? Ou acomoda-se à imposição de um modelo que o mantém em pleno estado de exceção?

Fecha a mostra Cinemacidades o tema da Cidade consumida, conduzida por Clóvis Ultramari, doutor em urbanismo (UFPR) e professor no curso de Arquitetura e Urbanismo da PUCPR, que tomou o filme Hotel de um milhão de dólares (Wim Wenders, 2000) [ULTRAMARI, Clovis. "Hotel de um milhão de dólares"], que discutiu a dinâmica urbana em grandes cidades, com a ocorrência simultânea da degradação e recuperação de áreas centrais com a constante ampliação da malha urbana que constitui as grandes periferias metropolitanas. O filme tem como cenário o compartimento central da cidade de Los Angeles. Ao se localizar o debate nas cidades brasileiras, vê-se, de um lado, a ocupação caótica dos extremos das manchas urbanas; de outro, um esforço custoso de recuperação dos centros tradicionais.

Para esta edição especial do Arquitextos, apresentamos três textos originários da 1ª Mostra Cinemacidades – com o intuito de trazer ao leitor o cinema como um olhar através do mundo urbano como uma forma de (re)ver nossas cidades.

sobre o autor

Fábio Duarte é professor do mestrado em Gestão Urbana da PUCPR. Arquiteto e urbanista pela Universidade de São Paulo, mestre em Multimeios pela Unicamp, doutor em Comunicações e Artes pela Universidade de São Paulo. Autor de Global e local no mundo contemporâneo (Moderna, 1998), Arquitetura e tecnologias de informação: da revolução industrial à revolução digital (Annablume / Fapesp / Unicamp, 1999) e Crise das matrizes espaciais: arquitetura, cidades, geopolítica e tecnocultura (Perspectiva, 2002) e Do átomo ao bit: cultura em transformação (Annablume, 2003).

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053.00
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original: português

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053

053.01

Blade Runner. A cidade pós-futurista

Salvador Gnoato

053.02

A cidade vigiada. The Truman Show, de Peter Weir, 1998

Rosa Moura

053.03

Hotel de um milhão de dólares

Clovis Ultramari

053.04

Elogio aos errantes. Breve histórico das errâncias urbanas

Paola Berenstein Jacques

053.05

El renacimiento de las estaciones ferroviarias

Una renovación urbana con"dulces y látigos", en Austria y Alemania (1)

Thomas Hagedorn

053.06

De la anécdota a la realidad. El Fórum de las Culturas Barcelona 2004.

Una revisión necesaria (1)

Humberto González Ortiz

053.07

João Walter Toscano e a arquitetura da cidade

Margareth da Silva Pereira

053.08

Arquitetura limítrofe. Invólucro sagrado dos anjos de rua

André Teruya Eichemberg

053.09

Dobrando espaços. A obra de Ana Holck

Alberto Tassinari

053.10

Espaços de lazer e cidadania: o Parque Farroupilha, Porto Alegre

Luiz Fernando da Luz and Ana Rosa de Oliveira

053.11

A imagem da cidade turística: promoção de paisagens e de identidades culturais

Maria da Glória Lanci da Silva

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