Programa Pro Moradia
Objetivos
O presente trabalho tem por objetivo principal e genérico oferecer uma alternativa qualificada ao que tem sido construído em nosso país no campo da habitação popular de custo muito baixo. Seu objetivo específico é oferecer propostas não apenas para a unidade habitacional mas também para o seu conjunto e suas relações com o entorno. Os exemplos que conhecemos no nosso país, na maioria dos casos, não resolvem esses dois aspectos ao mesmo tempo: quando as unidades tem boa qualidade, o aspecto urbanístico é deficiente; outras vezes, o conjunto é qualificado mas as unidades não o são.
Esta proposta vai além do projeto da unidade individual, pretendendo propiciar a criação de conjuntos arquitetônicos capazes de conformar bairros de qualidade, que sejam sustentáveis ao longo do tempo e façam uso eficiente do solo, tudo isso sem produzir densificação excessiva. No entanto, a qualidade urbana não é independente do projeto das unidades habitacionais individuais. Por isso, propomos unidades que podem crescer com facilidade sem comprometer a ordem visual do conjunto, são estruturalmente seguras e estão ao alcance da população de baixa renda.
Consoante com o propósito de oferecer moradias com o menor custo possível, sem abrir mão de um padrão mínimo de qualidade, entendeu-se que a unidade a ser entregue aos usuários deveria constituir um módulo básico tanto em termos do seu tamanho quanto dos seus equipamentos e acabamento. A unidade residencial aqui proposta poderá aumentar de tamanho e ter sua distribuição interna alterada, por iniciativa dos seus habitantes, dentro de um marco arquitetônico bem definido, assim como receber ao longo do tempo o acabamento e as melhorias que forem desejadas.
A proposta pretende se encaixar no Programa Pró-Moradia, na modalidade Produção de Conjuntos Habitacionais, que possibilita ações que visem à execução de conjuntos habitacionais, inclusive as relativas à infra-estrutura básica necessária para sua habitabilidade.
O Programa Pró-Moradia tem por beneficiários finais famílias com rendimentos, preponderantemente, de até 03 salários mínimos mensais. O valor máximo de financiamento por família beneficiada é de R$ 17 mil.
O lugar
O terreno escolhido situa-se na cidade de Cristalina, em Goiás, sendo composto por três quadras (números 5, 8 e 11), circunscritas pelas ruas Pedro Pereira da Silva, José Attiê, Rio Grande do Sul e José Rodrigues de Queiroz. Todas as quadras possuem a mesma dimensão (150x60m) e área (9.000 m2). A proposta detalhada ocupa a quadra 5, aparecendo as demais na planta geral como possíveis alternativas de implantação.
A solução das unidades
O projeto se estrutura a partir de um terreno quadrado de 8x8m dividido em quatro partes. A unidade residencial básica consiste em uma casa térrea e um apartamento sobre ela. Cada um ocupa 2/4 do quadrado inicial, havendo uma sobreposição apenas parcial entre eles. Da metade restante do terreno 1/4 é reservado como espaço aberto e não pode ser ocupado. A última quarta parte (localizada sob o apartamento) é a área de crescimento da casa, bastando a colocação de piso e a construção de uma parede com abertura para que se torne espaço interno. De uma área inicial de 34,50 m2 a casa pode passar a ter 51,20 m2.
O apartamento sobre a casa é um paralelepípedo de pé direito duplo com o sanitário colocado sobre a cozinha. Esta unidade pode crescer internamente, pela extensão total ou parcial do piso superior, ou externamente, construindo-se um volume de um ou dois pavimentos sobre metade da casa. Assim, de uma área inicial de 39,70 m2, cada apartamento deste tipo pode chegar a ter 84,40 m2.
É importante que qualquer conjunto arquitetônico baseado na repetição de uma unidade apresente algum tipo de variedade visual, o que confere identidade a cada setor e facilita a orientação dos moradores e visitantes. No entanto, a necessidade de variedade visual deve ser compatibilizada com outros requerimentos de um projeto desta natureza.
Há três possibilidades de combinação da unidade básica, sendo as alternativas 1 e 2 as mais econômicas, pois permitem concentrar as redes de serviço e o acesso às redes de serviço. Estas alternativas são também as que apresentam melhores condições de iluminação e ventilação por meios naturais. Na proposta aqui desenvolvida, foi usada a alternativa 2, caracterizada pela geminação das unidades.
Perspectiva animada
Imagem dos autores do projeto
O arranjo urbano
Uma preocupação essencial da proposta é fazer com que os conjuntos habitacionais a serem construídos a partir dela sejam mais do que a simples soma das suas unidades residenciais. Para isso, é essencial dotar o projeto de espaços públicos (praças, jardins e ruas interiores) e de alguns equipamentos urbanos que sirvam para elevar a qualidade de vida dos habitantes, neste caso para recreação e esportes.
A planta geral mostra as três quadras ocupadas de modo diferente, o que dá uma mostra da versatilidade da unidade básica. Em todas as alternativas de implantação o número de unidades residenciais é o mesmo: 136. Na quadra inferior (11), a ocupação é periférica, por meio de duas faixas paralelas. Na quadra do meio (8), a ocupação também é periférica, mas com faixas edificadas nos quatro lados, o que reduz bastante a extensão do pátio interior.
A quadra 5, aquela que escolhemos para detalhar, é uma variação da primeira, e consiste em uma faixa contínua, de um lado, e duas paralelas a ela mas situadas a distâncias diferentes. Este layout resulta na criação de duas vias internas, pensadas como de circulação de pedestres, embora veículos possam trafegar por elas também, e dois espaços abertos com graus diferentes de privacidade: um mais interior e outro ligado diretamente å rua. Os dois espaços abertos foram pensados para serem utilizados como jardim, playground, praça ou quadra esportiva.
A definição geometricamente clara das unidades, a clareza da implantação e uma certa variedade criada pelas alternativas de agrupamento garantem uma estrutura visual que permanecerá mesmo se todas as unidades forem ampliadas pelos seus habitantes.
Urbanização
Água e energia
Para reduzir o custo das obras de infra-estrutura, optou-se por sistemas de abastecimento de água e energia sobre o nível do solo, evitando instalações subterrâneas a não ser no trecho que conecta a rede local com a rede pública.
No interior do terreno o abastecimento de água é feito por sobre as construções. Dutos de água, protegidos termicamente, correm sobre os reservatórios d’água em condutos de plástico de seção retangular, de fácil acesso para manutenção.
Da mesma forma, os cabos elétricos são abrigados em um conduto plástico de seção retangular, colocado sobre o solo e fixado à viga de fundação das unidades de residência. A sua integridade é garantida por uma tampa aparafusada de aço galvanizado.
Escoamento da água das chuvas
Sempre que possível, o escoamento será superficial. Quando seu volume não permitir que isso aconteça, a água das chuvas será recolhida por valas drenantes laterais, que utilizam pedras de diferentes tamanhos e outros materiais baratos, constituindo um sistema de captação e condução pluvial de baixíssimo custo.
Esgoto
As águas servidas têm um tratamento primário por meio de fossas sépticas e filtros anaeróbicos situados em frente das casas, conjunto que permitirá a captação de entre 70 a 90% da DBO.
Posteriormente, serão infiltradas nas valas drenantes que constituem o sistema pluvial do conjunto habitacional. Essas valas, pela sua construção, funcionam como filtros anaeróbicos lineares adicionais, o que faz com que os líquidos cloacais, quando saem do conjunto, tenham um nível de depuração de 95%.
Pavimentação
As vias públicas, seguindo princípios de economia, seriam tratadas de acordo com as disponibilidades locais de materiais inertes e de baixo custo. Propõe-se o uso de técnicas como solo cimento, canto arredondado ou pedra quebrada, misturados com cimentos pozolânicos ou cal hidráulica, colocadas adequadamente sobre uma base compactada.
ficha técnica
Equipe
Arquitetos Edson da Cunha Mahfuz, Nicolás Palermo
Infra-estrutura urbana
Engenheiros Juan Luis Mascaró
Orçamento
Eng. Norberto Bedin
Estagiários
Acadêmicos Roberto Nehme e Albert Koelln
Área do terreno
0.9 ha.
Número de unidades
136
Construção
Paredes exteriores
blocos de concreto de 19cm de espessura
Paredes interiores
blocos de concreto de 14cm de espessura
Lajes
Unidirecionais mistas (vigotas de concreto e blocos de cerâmica)
Cobertura
Laje mista impermeabilizada
Aberturas externas
Alumínio
Aberturas internas
madeira
Pisos
cimento alisado
Escadas externas e internas
Préfabricadas em concreto armado.
