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PORTAL VITRUVIUS. Prêmio Caixa / IAB 2004. Concurso Nacional de Idéias para Habitação Social no Brasil (categoria profissional). Projetos, São Paulo, ano 05, n. 051.03, Vitruvius, mar. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/05.051/2456>.


Composição dos programas listados acima

“O caboclo Marculino/ Tinha oito boi zebu/ Uma casa com varanda/ Dando pro Norte e pro Sul”
Xanduzinha, de Luiz Gonzaga

Introdução

A cidade escolhida para a proposta é Belém, no Pará, que possui um déficit habitacional de 62.432 moradias (valor relativo de 21%)*. O clima é quente e úmido com precipitação média anual alcançando 2.834 mm. A temperatura média é de 25°C em fevereiro e 30ºC em novembro. Está na zona climática Afi (classificação de Köppen), que coincide com o clima de floresta tropical, permanentemente úmido, com ausência de estação fria e temperatura do mês menos quente acima de 18°C. A sede municipal tem as seguintes coordenadas geográficas: 01°23' de latitude sul e 48°30'15'' de longitude a oeste do Meridiano de Greenwich. Segundo dados do Censo-2000, a população total do município de Belém corresponde a 1.280.614 habitantes com densidade demográfica de 1.202,45 hab/km2.

A economia do município de Belém baseia-se predominantemente nas atividades ligadas ao setor de serviços, seguido pelas atividades de comércio (principalmente pequenas e médias empresas) e por algumas atividades no ramo da indústria de transformação de matérias-primas, embora seja também desenvolvida alguma atividade agrícola, especialmente no cultivo de mandioca, dendê, laranja, arroz, milho, cacau e feijão, além da extração da borracha.

O terreno escolhido para o desenvolvimento do projeto (com área aproximada de 155.000m2) localiza-se no bairro Tapanã, junto à Rodovia Artur Bernardes, que liga Belém a Icoaraci, eixo de crescimento da cidade. Esta rodovia percorre o município na direção norte-sul e faz a ligação da área de crescimento urbano com o centro histórico. Fica a 300 metros da Baía de Guajará (limite do município à oeste) e seu interior está coberto por vegetação nativa. Situa-se em bairro de classe baixa, predominantemente de residências unifamiliares. Nos limites do terreno existem algumas moradias irregulares. É dotado de rede de água potável, energia elétrica, iluminação pública e telefone.

O partido

A proposta surgiu do desejo de preservar a mata nativa existente no terreno, transformando-a num grande Parque para as pessoas da região. Partindo deste ato primordial, organizamos a intervenção tendo este Parque como núcleo organizador do espaço.

Ao longo da rodovia Artur Bernardes, corredor importante e estruturador da cidade, temos uma grande marquise de generoso pé-direito sobre pilotis, cuja clareza permite imediata apreensão para quem transita, seja a pé ou de carro. Esta estrutura porosa constitui a face urbana da intervenção, que além de realizar a transição entre a rua e o Parque, também organiza o espaço vertical da proposta: elevados da marquise e longitudinalmente a ela, pousamos os edifícios de habitação multifamiliares de forma a permitir o livre caminho das brisas provenientes da Baía de Guajará, concluindo assim a composição volumétrica básica. Temos sob essa cobertura muita sombra, áreas livres, áreas de comércio e serviços e os estacionamentos dos condomínios (destinados a 30% das unidades). Sobre ela, as áreas de lazer reservadas aos moradores e acima, os apartamentos. Abrimos em lugares estratégicos deste grande plano elevado imensas clareiras circulares, lugares donde partem os elevadores e escadas para os andares superiores. Constituímos então uma nova e instigante relação com a Baía: da plataforma e dos edifícios avistamos de um lado suas águas e de outro, a copa das árvores do Parque.

Após o núcleo verde, temos, do lado oposto aos conjuntos multifamiliares, residências unifamiliares cuja implantação tem a escala do bairro. Quanto à orientação das edificações, as implantamos de modo que todas as aberturas fossem voltadas para o Norte e para o Sul. No caso dos apartamentos, as fachadas estão sempre protegidas, ora pelas próprias passarelas de circulação horizontal, soltas da edificação, ora por brises horizontais, também soltos da fachada, contribuindo para a dissipação do calor.

No caso das residências unifamiliares, fizemos as coberturas com beirais e elevamos a casa do chão em 50 cm, permitindo a circulação do ar sob ela e evitando o contato com a grande umidade do solo. Implantamos as unidades geminadas duas a duas, pois assim protegemos uma das faces Leste/Oeste e, como nos edifícios multifamiliares, desalinhamos os blocos para que os ventos circulem livremente.

O Programa de Financiamento

Adotamos a composição dos programas PAR (Programa de Arredamento Residencial) e PSH (Programa subsídios à Habitação de Interesse Social conjugada com Programa Carta Crédito FGTS). A escolha desses dois programas se deu pelos motivos:

Adequação à realidade local: o público-alvo do PAR é composto por famílias com rendimento mensal não superior a 6 salários mínimos e do PSH por pessoas físicas com renda familiar bruta de R$ 150,00 a R$ 740,00.

Conjugação de residências unifamiliares e multifamiliares. O PAR é prioritariamente utilizado nos grandes centros urbanos e admite a construção de 500 unidades habitacionais cujo valor máximo de aquisição não ultrapasse R$ 25.800,00. A área útil mínima é de 37 m2. O PSH permite a aquisição de imóvel novo de valor venal de até R$ 21.000,00.

Pelo PAR são 500 unidades, assim as vendas podem ser divididas em 4 etapas.

Preços de vendas distintos entre o PAR e o PSH, atingindo desse modo diferentes públicos-alvos.

Pelo PAR propusemos a construção de 500 apartamentos, sendo 240 unidades com 3 dormitórios e 260 unidades com dois dormitórios (divididos em 148 tipo A, 87 tipo B e 25 tipo B adaptado aos portadores de necessidades especiais e idosos, correspondente a 5% do total de unidades).

Pelo PSH são 288 residências unifamiliares compostas por 120 unidades de 3 dormitórios (sendo 6 unidades adaptadas) e 174 unidades de 2 dormitórios (sendo 9 unidades adaptadas), destinando 5% do total de unidades aos portadores de necessidades especiais e idosos.

Aspectos jurídicos

Pela Lei Complementar de Controle Urbanístico da Prefeitura Municipal de Belém, mapa 02, anexo 09, o terreno objeto de intervenção está inserido dentro de uma ZUM-1, limite com uma ZH-3. De acordo o art. 72 da subseção V da mesma lei adotamos para a área o zoneamento ZH-3.

Art. 72 Em lote situado em via limites de zonas, excetuando-se os lotes localizados em Zonas Especiais de Preservação, será permitida a utilização de modelo qualquer das zonas limítrofes.

Desse modo, podemos construir habitações unifamiliares (modelo M1 segundo anexo 03 da Lei acima citada) e multifamiliares (modelo M3 – recomendado para habitação popular) que permitem compor com comércio.

Para as residências unifamiliares fizemos um lote padrão de 10 m de testada por 12,50m de comprimento (totalizando uma área de 125m2, mínimo exigida pela Lei), cuja área de projeção é de 85 m2 e área construída de 47,25 m2.

Para as residências multifamiliares adotamos lotes que variam de 5.545,05 m2 a 16.537,05 m2.

Nota-se pela tabela que poderíamos construir quase o dobro do que propusemos. Tivemos a preocupação de não adensar exageradamente a área já que a cidade de Belém, especialmente esse bairro, é pouca adensada. Destinamos 40% da área da gleba para uso público sendo que 37% desta área pública é formada pelo parque.

Atendemos a Lei Complementar de Controle Urbanístico da Prefeitura Municipal de Belém em relação às Políticas Setoriais e Produção do Espaço Urbano com:

  • a criação de comércio e serviços sob a área da marquise (procurando fortalecer o subcentro e corredor de comércio e serviços e promover a descentralização da cidade e a redução das pressões sobre o centro histórico);
  • criação de um parque, um novo espaço público de lazer;
  • maximização da área verde, do sombreamento (mediante arborização das vias, da marquise);
  • preservação das áreas vegetadas;
  • proveitamento das brisas da Baía do Guajará.

 

Conclusão

A arquitetura é instrumento de ação de mudanças urbanas, que refletem em novas posturas em relação ao meio, provocando um novo olhar sobre a cidade. A surpresa de um novo espaço, a criação de uma nova sombra, a valorização da vegetação que sempre esteve lá, só que em outro contexto. O desejo de voar e ver o mundo de cima: da marquise a vista se estende pela Baía, pelas ilhas e as copas das árvores já não estão tão altas assim. Uma nova relação é criada, o que era sempre tronco vira folhas, o que era limite torna-se possibilidade. E assim a arquitetura transforma a cidade em um local mais acessível, mais livre e mais humano.

O clima da região de Belém do Pará e a Arquitetura

1. Introdução

Do estudo das condições climáticas podemos estabelecer diretrizes para os projetos urbanos e arquitetônicos que conduzem a obtenção das condições térmicas mais favoráveis. Dentre as variáveis climáticas mais importantes podemos citar: as condições de insolação, as variações de temperatura do ar, as condições de umidade do ar, os ventos, as condições de cobertura do céu e o regime das chuvas. Este conjunto de variáveis climáticas depende, principalmente, da latitude do local, que é de 1º 23', quase sobre a linha equatorial e da sua localização na região da Floresta Amazônica úmida.

2. Análise das variáveis climáticas

2.1. A radiação solar

Utilizamos uma carta solar desenhada para a latitude de 2º Sul onde constatamos a quase perfeita simetria entre as trajetórias aparentes do sol. Isso quer dizer que as fachadas norte e sul recebem insolação semelhante, com uma diferença de 6 meses, ou seja, a insolação da fachada norte em junho é semelhante à insolação da fachada sul em dezembro e a principal conseqüência disso é que durante o semestre, entre março e setembro, a fachada norte recebe insolação enquanto a fachada sul permanece sombreada. A situação se inverte no semestre entre setembro e março. A fachada norte em junho e a fachada sul em dezembro recebem uma intensidade máxima da radiação solar de 458 watt/m2 enquanto que as fachadas leste pela manhã e oeste durante à tarde recebem intensidades superiores a 400 watt/m2 durante o ano todo.

Pelas condições da geometria da insolação percebemos que as fachadas norte e sul são mais facilmente protegíveis do que as fachadas leste e oeste. As fachadas norte e sul podem ser protegidas por marquises, varandas ou combinações de placas com eixo horizontal e eixo vertical. Considerando a inclinação dos raios solares às 12 horas sobre as fachadas norte e sul temos a situação indicada na Fig. 1. Propomos para os apartamentos uma associação de placas como a indicada na Fig. 2, que garantem a proteção da fachada norte e sul em mais de 70% do tempo.

Considerando as condições da insolação, a diretriz arquitetônica mais imediata é aquela que estabelece que as construções deverão ter sua maior dimensão na direção leste-oeste. A permanência do sombreamento das fachadas norte e sul durante um semestre favorece a ventilação caso as aberturas estejam localizadas nessas fachadas (ver cortes AA).

2.2. As variações da temperatura do ar

A informação mais importante dessa variável é a pequena diferença entre as temperaturas máximas e mínimas diárias. A média das máximas fica ao redor dos 32º C enquanto a média das mínimas fica próxima dos 26º C. Isso quer dizer que as construções deverão utilizar materiais com pouca massa para redução da inércia térmica. A ventilação deverá ser otimizada para permitir a retirada do calor e umidade do interior dos ambientes e para favorecer a obtenção do conforto térmico.

2.3. As condições de umidade do ar

Em Belém do Pará a umidade relativa do ar em média atinge valores superiores a 80%. Esses valores combinados com os das temperaturas do ar indicam a dificuldade de obtenção de condições de conforto térmico na região. Algum alívio pode ser atingido com a movimentação do ar. Para tanto, as edificações propostas possuem aberturas que garantem a ventilação permanente, principalmente durante a noite.

2.4. Regime dos ventos

Pela localização, a região de Belém está sujeita aos ventos da chamada Convergência Equatorial, além daqueles conseqüentes da vizinhança de massas d`água. Os ventos da primeira e segunda predominância são provenientes da direção leste, nordeste, sudeste e norte. Para aproveitar estes ventos as edificações mantêm espaçamentos entre elas. Adotamos a implantação das construções com eixo leste-oeste, assim as aberturas estão localizadas nas fachadas norte e sul para permitirem a ventilação cruzada.

2.5. As condições de cobertura do céu

Na região de Belém o céu apresenta-se quase sempre encoberto ou semi-encoberto. Isso significa que a luminosidade é alta mesmo nas regiões de céu próximas ao horizonte e que, portanto, pode-se obter iluminação natural mesmo que as aberturas estejam protegidas da insolação proveniente das partes altas do céu.

2.6. O regime das chuvas

Em Belém do Pará as precipitações pluviométricas são altas e distribuídas ao longo do ano pois temos que em dezembro chove 195,6 mm, em setembro 120,4 mm e em junho 173,3 mm. Desse modo, projetamos as edificações de modo que apresentem boa proteção contra as chuvas, com telhados que garantam também a proteção das aberturas (janelas e portas) para que a ventilação seja mantida mesmo durante as chuvas. Para tanto, as aberturas possuem venezianas e as partes envidraçadas são independentes das partes ventiladas.

Conclusões

Da combinação das diversas variáveis climáticas, a cobertura desponta como o componente construtivo mais importante. Ela tem a responsabilidade de proteger os espaços da radiação solar, das chuvas, bem como facilitar o aproveitamento da ventilação. O projeto de cobertura das residências atende as expectativas previstas. É composto por dois elementos: o telhado externo isolante e reflexivo e o forro interno pouco isolante e que permite a ventilação dos ambientes. Para isso, o espaço entre o telhado e o forro é ventilado e protegido da invasão de animais.

Propusemos arranjos urbanos abertos com os edifícios espaçados para aproveitamento da ventilação. Assim, as edificações cumprem as necessidades de proteção.

* METRODATA, Observatório de Políticas Urbanas e Gestão Municipal (IPPUR/UFRJ-FASE). Informações básicas da regiões metropolitanas brasileiras. Disponível em http://www.ippur.ufrj.br/observatorio.

Ficha Técnica

Autores
FRENTES / Arquitetos Juliana Corradini e José Alves

Consultor para Condicionamento Bioclimático
Luiz Carlos Chichierchio (Ambiental)

Planilhas e Orçamento
Paulo Sérgio Lucas da Cunha (Nova Engenharia)

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Equipe premiada
São Paulo SP Brasil

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