Este estudo investiga as técnicas construtivas alternativas e foi aplicado para a elaboração de residências no Estado do Rio Grande do Norte; se tratam de técnicas alternativas e sustentáveis voltadas para o ramo da construção civil, que aliadas aos conhecimentos da permacultura, trazem melhorias na qualidade de vida dos usuários. Devido ao seu consumo energético e diversos tipos de contaminação (água, ar, solo e sono) oriundos do avanço da construção civil, crescimento das cidades, escassez de recursos naturais e o cenário de pandemia, é que tiveram início os estudos pertinentes a este trabalho.
Em contrapartida, a rapidez com que o ser humano vem utilizando, de modo extrativo os recursos naturais necessários para o desenvolvimento e crescimento das cidades, por exemplo, é muito maior. Essa rapidez precisou ser de certa forma refreada nos últimos meses, devido ao isolamento social causado pela pandemia de Covid-19, responsável pela morte de milhares de pessoas em todo o mundo, que resultou na paralização e diminuição das mais diversas áreas e suas atividades. Ainda assim, o consumo permaneceu desenfreado, gerando impactos no planeta. Foi pensando nessas necessidades básicas de alimentação e moradia, que associados ao cenário atual de mudanças mundiais faz esse trabalho buscar soluções a partir da integração entre arquitetura e permacultura, compreendidos como agentes transformadores da vida do indivíduo, buscando melhorias no social a médio e longo prazo.
O presente trabalho tem, portanto, como objetivo geral, elaborar uma proposta de edificação autônoma e sustentável adotando as técnicas e aplicações da permacultura e bioconstrução. Com relação à metodologia, foram feitos estudos em textos, sobretudo em meio digital; estudos de referência direta com as visitas in loco (foi vivenciado esse novo estilo de vida, alternativo e sustentável; durante quinze dias ininterruptos e várias visitas para construção do modelo protótipo do chalé, foi vivenciado como é o estilo de vida das pessoas que habitam em comunidades permaculturais, tendo em vista aplicar estas dinâmicas no projeto); levantamento fotográfico; estudos de referência indireta através de material disponível em websites; além da parte normativa, com a análise de leis e normas pertinentes ao projeto; em seguida, foram realizados os estudos preliminares, envolvendo análises climáticas, topográficas, elaboração de programa de necessidades, pré-dimensionamento (quando entraram as referências das tiny houses), conceito, partido, estudos volumétricos e fachadísticos, que possibilitaram a resolução do objeto proposto.
Referencial teórico-conceitual
Para compreender melhor os conceitos que subsidiaram a elaboração do projeto da Tiny Eco House, se fez necessário estudar de forma detalhada algumas das temáticas como sustentabilidade e estilo de vida; bioconstrução; permacultura; Earthship; e Movimento Tiny House.
Segundo a cartilha Construções Sustentáveis (1), produzida pelo Ministério do Meio Ambiente — MMA, sustentabilidade é o caminho do equilíbrio em que o social, o econômico e o ambiental se somam para vivermos em uma sociedade melhor para todos. Para que algo seja considerado sustentável, deve atender aos três pilares, ou seja, sendo economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente adequado. No final da década de 1980, dá-se esta definição, o conceito de “desenvolvimento sustentável”, sendo definido pelo Relatório de Gro Harlem Brundtland (2) da seguinte forma: “desenvolvimento que dê resposta às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras darem resposta às suas próprias necessidades" (3). Tal definição se aplica no projeto com a intenção de alertar o contínuo uso dos recursos naturais de forma exploratória, buscando amenizar esses impactos que trazem grandes danos à nossa saúde e a saúde do planeta.
Para Alison Kwok e Walter Grondzik (4), a palavra sustentabilidade em arquitetura vai muito mais além do que o emprego de certas técnicas e materiais em projeto, que causem menores impactos ambientais. Para tanto, afirmam que ser sustentável significa atender às necessidades da geração atual, sem prejudicar as gerações futuras. E dessa forma assume-se o termo edificação ecológica ou verde, para se tratar de projetos de arquitetura eficientes em consumo de energia, água e demais recursos, além de abordar os impactos ambientais no local e fora dele. Assim, o projeto apenas é considerado como sustentável quando neste inexistem (ou são bastante mitigados) os impactos líquidos negativos sobre o meio ambiente.
O setor da construção civil, responsável por 15 a 50% do consumo dos recursos naturais (5), é certamente o maior gerador de resíduos de toda a sociedade (6), poluição do mundo, e também de toda a extração dos recursos naturais para o desenvolvimento das cidades e centros urbanos espalhados pelo mundo. Atualmente esse pensamento vem ganhando força, tendo tomado impulso desde a Segunda Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano — Rio92 (7), que teve como objetivo principal o desenvolvimento sustentável e a elaboração de formas para diminuir ou desacelerar os processos de degradação ambiental. Uma vez que este setor tem grande influência na economia e no ambiente, é extremamente importante aplicar os princípios da sustentabilidade nesta atividade, assim como nos materiais utilizados nesta indústria.
Uma das condições para haver sustentabilidade na construção civil é através da bioconstrução; segundo Cecília Prompt (8), a bioconstrução é a construção de ambientes sustentáveis por meio do uso de materiais de baixo impacto ambiental, adequação da arquitetura ao clima local e tratamento de resíduos. Para Prompt e outros autores da mesma área, a bioconstrução se trata da construção de ambientes sustentáveis por meio do uso de materiais de baixo impacto ambiental, adequação da arquitetura ao clima e tratamento de resíduos. Tomar a decisão de bioconstruir é buscar mecanismos para estar mais autônomo quanto aos elementos construtivos e suas técnicas (9).
Complementando o conceito, de acordo com o Ipoema Instituto de Permacultura (10), entende-se construção sustentável como um termo genérico para designar elementos distintos e com especificidades. O termo aponta para correntes diversas da construção sustentável, tais como bioaquitetura, arquitetura bioclimática, construção ecológica, eco-casas, construção natural e bioconstrução, entre outros. Neste viés, se torna imprescindível o estudo de materiais de vedação, que possam funcionar como as tradicionais paredes. Assim, o trabalho traz os conceitos de Superadobe (ensacada e comprimida em sacos de ráfia, podendo ser individuais ou em rolos), adobe, COB (areia, argila e palha em proporções distintas do adobe), taipa de mão ou pau-a-pique, taipa de pilão, solocimento, fardos de palha e ferrocimento.
Diante dessas informações iniciais, vamos analisar alguns pontos que serviram de embasamento para nortear um projeto de bioconstrução. Tomamos como base o material do Ipoema Instituto de Permacultura (11), que define em cinco passos, o design ideal e que serviram para nortear o projeto final proposto, um chalé autônomo e sustentável, adotando tecnologias voltadas à moradia, no quesito de captação e reutilização de recursos. São elas: a posição relativa do terreno, que implica na melhor posição em que a edificação será instalada e construída, aproveitando a topografia do terreno para recolher as águas da chuva e energia do sol. Um aspecto muito significativo é que a casa aproveite um ponto na topografia do terreno, que facilite a movimentação e escoamento de suas águas assim como o seu armazenamento, e também para a captação de energia solar. A multifuncionalidade de seus recursos é a forma com que eles se conectam e trabalham entre si. Um bom exemplo disso é um telhado verde com painéis solares, que além de receber energia do sol e a armazenar em baterias, como ocorre nas Earthships, também colhem as águas da chuva e possibilitam um melhoramento no conforto térmico da residência. Manter ou aderir ao máximo essa técnica resulta em um melhor desempenho da edificação. O planejamento energético que distribui o terreno em setores, em zonas e melhora de acordo com o design, otimizar o rendimento da edificação, adotando também a multifuncionalidade, exemplo anterior. Também se faz importante explorar recursos e energias renováveis, a fim de diminuir os impactos ambientais durante e após a construção. Casas projetadas para receber melhor a luz do sol, aproveitar a ventilação natural, associado às técnicas de bioconstrução, são bons exemplos de menor gasto de energia e uma casa mais viva.
Um desdobramento dessas ideias, especificamente na construção, pode ser vislumbrada nas Earthships, tema que começa a ser discutido no início da década de 1970. Estas pesquisas buscam alternativas de se construir e também viver de forma autônoma ao sistema, produzindo energia e o seu armazenamento de forma sustentável, e diminuindo para quase zero os impactos causados ao meio ambiente. Seu autor, Michael Reynolds (12) a partir de sua “casa embarcação” decide construir casas de forma alternativa, utilizando materiais reciclados como latas, garrafas, pneus etc.
A bioconstrução ganha ainda mais força se associada ao cultivo da permacultura. “Uma comunidade com autonomia é aquela que tem a capacidade de satisfazer as suas próprias necessidades sem depender de grupos ou pessoas de fora da comunidade. Autonomia é sinônimo de liberdade para uma comunidade, pois com isso ela não precisa depender de recursos externos ao ambiente onde vive”. (13). Desta maneira, associado à bioconstrução, foi estudada a permacultura, que se trata de um sistema pelo qual podemos existir de maneira cíclica no planeta, utilizando a energia que está naturalmente em fluxo e é relativamente inofensiva; e, da mesma forma, pelo uso de alimentação e de recursos naturais que sejam abundantes, sem destruirmos a vida na terra (14). A permacultura busca trabalhar com fluxos de energia cíclicos, de modo que o sistema possa se gerir e se tornar permanente, daí a ideia de uma cultura permanente.
Aplicadas ao projeto, devido a sua capacidade de trazer sustento aos usuários, a permacultura se encaixa neste trabalho como uma peça fundamental para suprir as necessidades de famílias que em períodos críticos como o momento de pandemia enfrentado, terem seus alimentos orgânicos em casa, reduzindo seus gastos, trazendo mais independência e a possibilidade de venda, troca, valorizando o comércio informal e ensinando como cuidar da terra de forma adequada e produtiva.
A permacultura utiliza as qualidades inerentes das plantas e animais, combinadas com as características naturais dos terrenos e edificações, para produzir um sistema de apoio à vida, tanto para a cidade como para a zona rural, utilizando praticamente a menor área possível (15). Por ser uma metodologia de desenho e gestão ambiental, esta pode ser vista como complementar aos princípios ecológicos, vez que aborda questões não contempladas na agroecologia, com relação à ocupação humana nos ecossistemas, tais como energia, habitações, saneamento, além do cultivo propriamente dito (16).
No livro Permaculture One, Bill Molisson e David Holmgren nos fornece uma definição mais atual sobre a permacultura, vista de uma forma mais ampla e de modo a agregar os conceitos de ética e de design: “paisagens conscientemente desenhadas, que reproduzem padrões e relações encontradas na natureza e que, ao mesmo tempo, produzem alimentos, fibras e energia em abundância e suficientes para prover as necessidades locais” (17).
Essas técnicas reunidas tornam possível um melhor entendimento por parte do leitor em como ter uma vida mais voltada para questões naturais e sustentáveis. E por se tratar de uma ciência que aborda várias áreas do saber, se faz necessário uma ordem lógica e bem elaborada para o seu melhor entendimento. É dessa maneira que a permacultura dispõe da “flor da permacultura”, um diagrama ilustrativo, começando com ética e princípios focados no campo e no manejo da terra e da natureza, a permacultura está evoluindo para uma aplicação progressiva dos seus princípios e integração de todos os sete campos (sete pétalas) necessários para a sustentação da humanidade ao longo do período de declínio de energia (18).
Assim, a permacultura se antecipa à hipótese de uma progressiva redução do consumo de energia fóssil e recursos finitos e de uma inevitável redução no crescimento da população humana. O fundamento conceitual e científico deste prognóstico consiste em diversas fontes. David Holmgren cita o trabalho do ecologista norte-americano Howard Odum como uma de suas principais fontes de estudo (19).
No que se refere aos princípios éticos da permacultura, pode-se dizer que estes atuam como um freio para os instintos egoístas de benefício próprio do indivíduo ou de um grupo (organização, cidade, nação etc.), proporcionando uma visão mais abrangente e de longo prazo das consequências de nossas ações. A permacultura defende três valores éticos básicos que estão intimamente ligados entre si e orientam os princípios da permacultura (20): 1. Cuidar da terra; 2. Cuidar das pessoas; 3. Partilha justa. Tais valores foram considerados, segundo Holmgren, após “pesquisa em ética comunitária, como adotada por culturas religiosas antigas e grupos cooperativos modernos” (21). Os valores descritos fundamentam as atividades propostas nos institutos e centros de permacultura e localizam-se no centro da flor que gira em espiral e cujas pétalas representam propostas de ação.
Também é de suma relevância atentar para os princípios de design permacultural: a visão que embasa esses princípios se origina do estudo e observação do mundo natural e das sociedades sustentáveis pré-industriais, e estabelece que estes podem e devem ser adotados tanto num contexto de abundância ecológica quanto em um de escassez (22). Tais princípios fundamentam uma lista de tarefas que norteia todo o complexo processo de design de um assentamento humano sustentável, quer seja uma casa, condomínio, sítio, quer seja, até mesmo, uma cidade ou nação, que nesse caso serão estudados para trazer conhecimentos para o melhor entendimento da forma e como ela influencia o sistema de organização permacultural.
Os princípios do design são os seguintes (23): 1. Observe e interaja; 2. Capture e armazene energia; 3. Obtenha rendimento; 4. Pratique autorregulação e aceite feedbacks; 5. Utilize e prefira recursos e serviços renováveis; 6. Evite o desperdício; 7. Parta dos padrões para se chegar aos detalhes; 8. Integrar ao invés de segregar; 9. Utilize soluções pequenas e graduais; 10. Utilize e valorize a diversidade; 11. Utilize bordas e valorize elementos marginais; e 12. Utilize e responda criativamente às mudanças.
Fechando o referencial teórico, foi analisado o conceito de Tiny House, surgido nos Estados Unidos no final da década de 1990. O movimento vem se apresentando como uma nova forma de viver em pequenos espaços, de acordo com as necessidades e oportunidades, passíveis de se tornar móveis — sob rodas — e adaptarem-se aos diversos tipos de personalização e estilo de cada usuário. Não há uma definição muito clara sobre o que exatamente constitui uma Tiny House, mas sim uma compreensão do movimento que entende que uma Tiny House se trata de uma estrutura residencial com área inferior a 37m².
No contexto de questões ambientais, instabilidade financeira, alta hipoteca, por exemplo, cada vez mais pessoas têm que escolher uma casa mais acessível economicamente, muitas vezes de dimensões minúsculas, com área variando entre 37 a 93m², e ainda, em alguns casos, com até 7,4m², favorecendo nesse foco, o estudo do "conforto psicológico", envolvendo o sentimento das pessoas, no aspecto do "conforto fisiológico" que deve ser priorizado nestas situações (24). O movimento Tiny House descreve, deste modo, a tendência das pessoas a mudarem de casas grandes para casas menores e minimalistas; é um movimento social, bem como um movimento ambiental. Apresenta, em sua maioria, casas com dimensões menores que 121,92m², em que são construídas por várias razões, incluindo: acessibilidade, eficiência energética, minimalismo, sustentabilidade, portabilidade e flexibilidade (25).
Segundo Inka Anggraeni e Herlily Herlily (26), esse movimento apresenta seis princípios fundamentais conhecidos por design subtrativo, dentre eles: uso de espaço vertical, como a parte inferior de escadas, mobiliários, equipamentos, maximizando o uso deste espaço, que pode ser utilizado como armazenamento para uma melhor performance; tudo encaixado em um lugar, ou seja, tudo tem seu local específico de armazenamento, principalmente quando os itens são importantes e essenciais; multifunções, em que itens de dupla tarefa são otimizados para ter mais de uma função, assim como ocorre com o uso do espaço; fácil acesso, que oportuniza numa busca de forma fácil por determinado item fundamental, baseando-se na frequência com que os itens são usados; embutidos com propósito, uma vez que reduzem o uso do espaço enquanto ainda fornecem instalações importantes como mesas, sofás, cadeiras, camas ou ainda artigos de hobby, como equipamentos de pesca, guitarra, bicicletas etc; menos é mais, princípio que visa reduzir e organizar itens dentro da casa como uma ferramenta para dar apoio diário, ao invés de criar maior relação de dependência na vida.
Estudos de referência e preliminares
Complementando os estudos teóricos-conceituais, foram produzidos estudos de referência direta (na Comunidade das Formigas, situada em Nísia Floresta RN); e estudos de referência indireta (Escola Sustentável n. 294 em Jaureguiberry, Uruguai e a Residência de Ricardo e Leticia, Bioconstrução — Uma Vivência Sustentável, situada em Guaraciaba SC).
A Comunidade das Formigas, área de intervenção, fica localizada a 43km do centro da cidade de Natal RN, a Comunidade das Formigas está situada no município de Nísia Floresta, bem próximo a lagoa de Alcaçuz, um local bastante frequentado por moradores locais e turistas; possui construções em superadobe, telhados jardim, casa de taipa e outros elementos relevantes que embasaram o projeto elaborado. A propriedade foi adquirida em 2014 e passou por grandes transformações nesses últimos anos.
Para resgatar o solo empobrecido pelos processos de desertificação, desmatamento e também por questões climáticas de seca, fora utilizada a técnica dos Sistemas Agroflorestais — SAF, através do manejo do solo e do plantio da policultura, separado por setores e por vegetações de curto, médio e longo prazo, onde é preciso cuidados, irrigação e através das podas, que servem de adubo, e vegetações menores que crescem mais rápido e são utilizadas como material de serviço para voltar a matéria orgânica, e assim, como os ciclos dos resíduos de águas cinzas e escuras, os cortes e resíduos das SAFs voltam para as SAFs como adubo, ciclando a energia e a mantendo na propriedade.
O terreno possui uma inclinação, verificada através do perfil de elevação do terreno, onde o gráfico da imagem representa o caminho entre os pontos A e B e seus níveis topográficos.
O terreno conta com uma entrada principal, próximo ao tanque/reservatório, que atualmente é um viveiro para tilápias, armazenamento das águas pluviais e distribuição para o restante da comunidade. Existe uma outra entrada pela fachada principal, que é utilizada para carros maiores. Bem próxima a essa entrada começa a área de intervenção e implantação do projeto. De forma a aproveitar a topografia do terreno e a facilitar a coleta e distribuição das águas da chuva é que se escolheu esse espaço dentro da Comunidade das Formigas para a implantação da proposta e melhor estudo para a inserção dos jardins permaculturais, entre as três unidades da Tiny Eco House.
A Comunidade das Formigas é um lugar bastante ventilado durante todo o dia, mesmo em dias mais quentes. Os ventos predominantes vêm do Nascente, geralmente ventos marais, ventos que sopram do mar em direção a terra. A experiência na comunidade em relação aos condicionantes climáticos é vivida intensamente devido à conexão e a necessidade de entender as forças atuantes na natureza, dessa maneira o trabalho desempenhado e o manejo das SAFs estão intimamente ligados às condições do clima. Analisando os dados em relação aos ventos é possível estudar maneiras de melhor utilizar esse recurso para o resfriamento dos ambientes internos, a renovação do ar, garantindo a ventilação cruzada e tornando os ambientes mais confortáveis, arejados, aquecidos e em equilíbrio térmico.
Os estudos preliminares foram parte fundamental e serviram para melhor posicionar a casa quanto à coleta das águas da chuva, escoamento e captação das águas, direcionamento e reuso dos resíduos gerados pela edificação. Foram através dessas observações, que melhor situamos a casa para receber o sol da manhã, e assim o posicionamento dos ambientes, o aumento da parte do telhado na fachada Oeste, mais precisamente para a face Sudeste, de onde vem os ventos mais fortes, especialmente em dias de chuva.
Proposta
O conceito do trabalho foi uma construção gradativa. Ao passo que foram estudadas as técnicas da bioconstrução, permacultura, suas teorias e filosofias, a aproximação com a terra, os formatos de jardins permaculturais em formatos de mandalas, os estudos se ramificaram até alcançar a “geometria sagrada”, peça fundamental para conectar a natureza, as técnicas e conhecimentos estudos e servir de elemento conceitual para o design e organização da implantação, sendo referência na fachada principal de cada unidade de chalé, com o óculo em formato da Flor da Vida (27).
É um símbolo bastante antigo, com suas primeiras representações encontradas no Templo de Osíris, no Egito. Este padrão geométrico se rebate na implantação e na proposta em elementos de vitrais, com finalidade de trazer conforto ambiental, associado às tecnologias de bioconstrução. Esse padrão geométrico é o mesmo proposto nos sólidos platônicos. Os sólidos ou poliedros de Platão foram relacionados à criação do universo.
As cinco principais formas geométricas apresentam o mesmo número de lados em todas as faces, e em todos os vértices têm o mesmo número de arestas. Segundo Platão, Deus criou o mundo baseado nos quatro elementos da natureza, os quais estão associados aos quatro sólidos. O tetraedro simboliza o fogo, o cubo representa a terra, o octaedro tem relação com o ar e o icosaedro com a água.
A Tiny Eco House conta com os estudos citados, de forma a analisar as condicionantes climáticas e principais características da localidade, como a quantidade dos níveis pluviométricos. Esses estudos foram também feitos in loco, sendo uma experiência de enorme contribuição para o melhor entendimento das condicionantes climáticas que atuarão na edificação, e a busca pela solução ecológica mais adequada.
O programa de necessidades foi planejado de acordo com as necessidades de uma pessoa, no máximo duas por chalé, já que a proposta de implantação para a ecovila são para moradias, estadia temporária de poucos dias ou por temporada. Apesar de não ser projetado para moradia definitiva, e por não possuir estudos específicos sobre as condicionantes urbanísticas e legislativas, por se tratar de uma construção em uma área rural (e, portanto, não dispor destes dispositivos regulatórios), os recuos foram obedecidos, os tamanhos dos ambientes mínimos também, assim como foram atendidos e em última análise, a menor intervenção do recobrimento do solo, marcando os caminhos, criando a circulação ao redor dos chalés e dos jardins permaculturais, o mais natural possível.
Os ambientes desenvolvidos no programa de necessidades para cada Tiny Eco House que se fazem presente no projeto são os seguintes: sala de estar; cozinha americana; escritório e banheiro; dormitório e varanda no pavimento superior. E para a parte externa têm-se: três jardins permaculturais circulares; três unidades de horta para cada chalé; horta para o cultivo e manutenção por parte de todos.
No que se refere às tecnologias empregadas na Tiny Eco House, pode-se citar, sinteticamente, as seguintes: estratégias de tratamento das águas cinzas e negras; adoção de biodigestor (28) uso da bacia de evapotranspiração — BET e ciclo de bananeiras; e finalmente a proposição de energia solar — através da aplicação de painéis fotovoltaicos.
Conclusões
O trabalho apresenta técnicas e conhecimentos que tornam possível a construção de casas e novos estilos de moradia com novos materiais e técnicas, que vão desde os materiais utilizados, até o armazenamento e reutilização de resíduos e energia sem que haja vínculos com concessionárias, geradoras de grandes impactos ambientais para sua produção e distribuição.
Com as técnicas apresentadas neste trabalho e somadas as habilidades específicas, se torna possível a elaboração de projetos autossuficientes e ecológicos, garantindo moradia e autonomia por parte dos usuários em suas próprias residências, dando espaço para mudanças não só na forma de morar, mas na forma de enxergar e interagir com o meio ambiente.
Se faz necessário desconstruções no ser, quanto indivíduo, e a adoção de uma nova óptica, além da preocupação em como o mundo continua se desenvolvendo e esgotando os seus recursos naturais, que são limitados. Essa busca também se dá por todos nós, para quem busca alternativas, e se depara com a bioconstrução por motivos de “baixo-custo”, como também por parte dos profissionais, buscando sempre novas melhorias, materiais, técnicas e aplicações inovadoras, naturais e sustentáveis.
Por todos os motivos citados é que o este material se desenvolveu, com o objetivo de elaborar um projeto sustentável e autônomo, utilizando as EarthShips e a integração da permacultura aos lares, de forma à melhorar a experiência por parte dos usuários, aproximando-os de sua essência, trazendo mais contato com a natureza, entendendo e interagindo de maneira a retirar tudo aquilo que necessita, mas sem causar danos, cuidando e cultivando a terra, para que essas ideias sejam disseminadas como um vírus do bem e que seja possível a melhoria desde nossas casas a chegar no nosso bairro, cidades e em pouco tempo, todo o planeta.
notas
NE — Este trabalho foi originalmente apresentado na 19ª Semana Acadêmica de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. BORBA, Adriana Carla de Azevedo; FONSECA, Elton Judson de Queiroz. Tiny Eco House: métodos e elementos alternativos aplicados a construção e integração com a natureza. Anais da 19ª Semana Acadêmica de Arquitetura e Urbanismo. Habitat sustentável: uma cidade para todos, Santiago, URI, 7 a 11 jun. 2021, p. 53-64.
1
Moradias sustentáveis. Economia e durabilidade. Série Cadernos de Consumo Sustentável. Brasília, Ministério do Meio Ambiente/Basf, 2012 <https://bit.ly/3vlnvth>.
2
BRUNDTLAND, Gro Harlem. Our common future: The World Commission on Environment and Development. Oxford, Oxford University, 1987.
3
PACHECO-TORGAL, F.; JALALI, Said. A sustentabilidade dos materiais de construção. Braga, TecMinho, 2010, p. 18.
4
KWOK, Alison; GRONDZIK, Walter. Manual de arquitetura ecológica. Porto Alegre, Bookman, 2013.
5
A construção civil e o meio ambiente; Meio ambiente, um grande problema. Escola Politécnica de Engenharia da Universidade de São Paulo <https://bit.ly/3y585ei>.
6
JOHN, Vanderley Moacyr; AGOPYAN, Vahan. Reciclagem de resíduos da construção. Seminário Nacional sobre Reciclagem de Resíduos Sólidos Domiciliares, São Paulo, 2000.
7
AZEVEDO, Gardênia Oliveira David de; KIPERSTOK, Asher; MORAES, Luiz Roberto Santos. Resíduos da construção civil em salvador: os caminhos para uma gestão sustentável. Engenharia Sanitária ambiental, vol.11, n. 1, jan./mar. 2006, p. 65-72 <https://bit.ly/3xU0QGh>.
8
PROMPT, Cecília. Curso de bioconstrução. Brasília, Ministério do Meio Ambiente, 2008.
9
Idem, ibidem.
10
IPOEMA INSTITUTO DE PERMACULTURA. Sua casa sustentável. Brasília, Ipoema Instituto de Permacultura, 2017.
11
Idem, ibidem.
12
REYNOLDS, Michael. Earthship: How to Build Your Own. Volume 1. New Mexico, Solar Survival Architecture, 1990.
13
PROMPT, Cecília. Op. cit., p. 10.
14
HOLMGREN, David. Permacultura: princípios y senderos más allá de la sustentabilidad. Hepburn, Holmgren Services, 2004, p. 13.
15
MOLLISON, Bill. Permaculture: a designers manual. 2ª edição. Sisters Creek, Tagari Publications, 2002, p. 13.
16
MOLLISON, Bill. Introdução a permacultura: projeto novas fronteiras da cooperação para o desenvolvimento sustentável. Brasília, Ministério da Agricultura e do Abastecimento/Secretaria de Desenvolvimento Rural/Programa Nacional de Crédito Fundiário,1998.
17
MOLISSON, Bill; HOLMGREN, David. Permaculture One. Londres, Corgi, 1978. Apud Os Fundamentos da Permacultura. Ecossistemas Design Ecológico <https://bit.ly/3xWHcsY>.
18
HOLMGREN, David. Permacultura: princípios y senderos más allá de la sustentabilidade (op. cit.), p. 3.
19
Permacultura, o que é e como ela pode salvar o planeta? Instituto Pindorama <https://bit.ly/3khwZiL>.
20
MOLISSON, Bill; HOLMGREN, David. Op. cit.
21
HOLMGREN, David. Os fundamentos da permacultura. In Ecossistemas Design Ecológico (op. cit.), p. 8.
22
DIAS, Nilson. Permacultura para organizações e casas ecológicas. Nova Friburgo, Instituto Pindorama, s.d. <https://bit.ly/3kmF6Lb>.
23
HOLMGREN, David. Permacultura: princípios y senderos más allá de la sustentabilidade (op. cit.).
24
ZHANG, Yue. Study on the Elements for the Psychological Comfort of the Tiny House’s Living Room in Japan by Layers and Window Area. IOP Conference Series: Earth and Environmental Science, v. 218, n. 1, 23 fev. 2019, p. 012043 <https://bit.ly/3F8e57X>.
25
MAY, V.V. et al. Designing and building a tiny house to develop connections across disciplines and concepts cooperative and experiential learning work-in-progress. ASEE Annual Conference & Exposition, Washington D.C. jun. 2019 <https://bit.ly/3OGb8j6>.
26
ANGGRAENI, Inka; HERLILY, Herlily. Investigation “Tiny House” in urban kampung : sustainable living or responding to scarcity? IOP Conference Series: Earth and Environmental Science, v. 452, n. 1, p. 012007 <https://bit.ly/3xUeGbH>.
27
A Geometria Sagrada é considerada o modelo da geometria natural no mundo e a base de todas as formas. É uma ciência antiga que explora e explica os padrões de energia que criam e unificam todas as coisas e revela a maneira precisa pela qual a energia do universo se organiza.
28
12 passos para construir um biodigestor. Diaconia <https://bit.ly/39mrA85>.
sobre os autores
Elton Judson de Queiroz Fonseca é arquiteto e urbanista (Unifacex, 2020).
Adriana Carla de Azevedo Borba é arquiteta e urbanista (2000), mestre (2008) e doutora (2014) em Arquitetura e Urbanismo pela UFRN. Especialista em Design Estratégico (Farn, 2005) e docente no DAU UFPE. Publicou Botânica para designers e arquitetos. Termos técnicos para especificação de projetos paisagísticos (EdUnP, 2013).
preâmbulo
O presente artigo faz parte de Preâmbulo, chamada aberta proposta pelo IABsp e portal Vitruvius como ação para alavancar a discussão em torno da 13ª edição da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, prevista para 2022. As colaborações para as revistas Arquitextos, Entrevista, Minha Cidade, Arquiteturismo, Resenhas Online e para a seção Rabiscos devem abordar o tema geral da bienal – a “Reconstrução” – e seus cinco eixos temáticos: democracia, corpos, memória, informação e ecologia. O conjunto de colaborações formará a Biblioteca Preâmbulo, a ser disponibilizada no portal Vitruvius. A equipe responsável pelo Preâmbulo é formada por Sabrina Fontenelle, Mariana Wilderom, Danilo Hideki e Karina Silva (IABsp); Abilio Guerra, Jennifer Cabral e Rafael Migliatti (portal Vitruvius).